São Paulo, domingo, 01 de março de 2009

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Ponto de fuga

Do que são feitos os quadrados


Quem não viu corra, porque termina no próximo dia 8; trata-se da exposição "Anni e Josef Albers", na Pinacoteca do Estado, em São Paulo


JORGE COLI
COLUNISTA DA FOLHA

Quem não viu corra, porque termina no próximo dia 8. Trata-se da exposição "Anni e Josef Albers", na Pinacoteca do Estado, em São Paulo. Josef Albers, mestre maior da abstração geométrica, centrou-se na forma e na cor, livrando-se da matéria. Suas obras mais conhecidas são as insistentes "Homenagens ao Quadrado", criadas a partir de 1949. O esquema se repete: quatro quadrados, um dentro do outro, mais próximos entre si na parte inferior. Um conjunto dessas "Homenagens" pode ser visto no Instituto Tomie Ohtake: o último dia de apresentação é hoje!
Na Pinacoteca, o tema são as relações que os Albers mantiveram com a América Latina, sobretudo o México, país pelo qual se apaixonaram. Buscaram ali afinidades artísticas na cultura popular e pré-colombiana. É um período que precede o extremo minimalismo de sua maturidade. Mas há sempre o desejo de alcançar o imaterial, fazendo pensar no maravilhoso vestido que Monteiro Lobato inventou em "Reinações de Narizinho", talhado em tecido algum e feito apenas de cor.
De maneira clássica, atribui-se ao colorido um papel sensível e sensual, opondo-o ao desenho, de natureza intelectiva, mais significante e vizinho da escrita. Na prática platônica de Albers, ao contrário, todo matiz perde espessura e eleva-se a um domínio onde se junta, em mesmo nível, à pureza sem matéria das formas ideais.

Penélope
A mostra Albers, na Pinacoteca, releva a criação de Anni, mulher do mestre. Sua celebridade foi sempre menor que a do marido, mas não sua arte. Tecelã de formação, Anni Albers enfrenta a regularidade aproximativa das malhas, muitas inspiradas na tapeçaria peruana. Ama os temas de pequeno formato, que se multiplicam em tramas.

Jardim
Margaret Mee era inglesa. Foi formada no Camberwell College, em tempos da alta disciplina pedagógica, minuciosa e exigente, derivada de seus fundadores. Entre eles, Burne-Jones, Walter Crane e o lorde Leighton, que punham no mesmo patamar a arte da pintura e a da ilustração, insistindo na sutileza da linha, na beleza meditada das texturas e superfícies.
Margaret Mee veio para o Brasil em 1952. Apaixonou-se pelas flores exóticas, que reproduzia com amor. Tornou-se a "Dama das Bromélias": foi assim que a escola de samba Beija-Flor a batizou num samba-enredo [em 1994]. A Pinacoteca do Estado consagra a ela uma exposição em homenagem ao centenário de seu nascimento.

A grande artista
As plantas de Margaret comovem. Pela personalidade discreta da artista, por seu amor às flores e sua fidelidade a elas. Também pela imensa beleza das obras, fruto de uma intenção que não se dirigia à assim chamada "criação artística", mas ao serviço humilde de figurar em desenhos, aquarelas, guaches, vegetais da mata atlântica ou da floresta amazônica.
Não usava fotografias como modelo. Fazia verdadeiros retratos ao vivo de cada espécie, embrenhando-se no fundo das selvas para encontrá-las. A prodigiosa qualidade dessas obras, ultrapassando de longe seu sentido primeiro, o de ilustrar, oferece uma verdade maior do que a de qualquer fotografia. A relação íntima estabelecida entre o olhar que detalha, que nada deixa escapar, e a mão que restitui a minudência observada são insubstituíveis.
A arte de Margaret Mee vence a fotografia não no terreno de uma expressa intenção artística, mas no do realismo mais profundo e fiel, que transporta sua flora para além do efêmero.

jorgecoli@uol.com.br


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