São Paulo, domingo, 02 de agosto de 2009

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Um homem fora do lugar

JOSÉ MURILO DE CARVALHO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Mais do que ideias, há homens fora do lugar. Euclydes da Cunha foi, entre nós, o maior deles. Era um deslocado em tudo. No Exército, avesso que era à disciplina e à guerra. Na engenharia, que emperrava sua criatividade poética. No mundo rural, cuja monotonia o aborrecia. No ambiente falso e agitado das cidades, onde sonhava com a natureza, o sertão, a tebaida caipira, o deserto amazônico. No Brasil, onde se via como um grego perdido em Bizâncio. No mundo capitalista, cujo utilitarismo repugnava à sua "virtude ferocíssima de monge". Na política, cujas práticas chocavam o seu idealismo quixotesco.
Um deslocado, afinal, na vida familiar, causa de seu trágico deslocamento da vida. Talvez só desse desajuste pudesse jorrar a obra cuja grandeza estava também no deslocamento, no rude e agressivo distanciamento do mundo intelectual em que vivia.


JOSÉ MURILO DE CARVALHO é historiador, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e membro da Academia Brasileira de Letras.


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