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Ponto de Fuga
Revezes e vibrações
"É como se a solução para "como viver junto" fosse "viver sem': sem os "vilões", sem os tiranos. Sem todo mundo que não é "legal", do ponto de vista da curadoria", escreve um leitor
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JORGE COLI
COLUNISTA DA FOLHA
Há duas semanas, esta
coluna publicou comentários sobre a Bienal de São Paulo. Eles provocaram reações em leitores que,
muitos, tocaram em questões
cruciais. Todos foram críticos,
mostrando-se insatisfeitos
com a mostra atual. A impressão de autoritarismo foi reiterada na maioria. Um deles assinala o paternalismo ingênuo.
"A questão é que esta bienal,
que se propõe democrática e
plural (já que se sustenta no
conceito de convivência dos diferentes), me pareceu excludente, maniqueísta, parcial. É
como se a solução para "como
viver junto" fosse "viver sem':
sem os "vilões", sem os tiranos.
Sem todo mundo que não é "legal", do ponto de vista da curadoria. Achei uma bienal com
discurso ingênuo, romântico,
infantil. Parece falar com o público como um pai fala com
uma criança de três anos."
O pressuposto dessa passagem é a exclusão: uma bienal
não pode expor tudo; ela é obrigada a escolher. Os procedimentos de exclusão são sempre
os mais sensíveis. A mostra
atual quer condenar a exclusão,
mas, por princípio, ela própria
é obrigada a excluir. Conforta-se então num discurso monofônico e radicaliza os processos
de eliminação, transformando-o em arma tutorial "do bem".
A mão única se afirmou pela
eliminação das representações
nacionais, que, de um jeito ou
de outro, impunham ruídos
perturbadores e indesejáveis.
Isso também foi sentido nas
mensagens. Uma leitora assinala que os precedentes curadores eram "obrigados a aceitar envios "nacionais", (o que)
impelia a "viver junto" e causava
a rica bagunça das "analogias de
linguagens'". Outro formula,
lapidar: "A pretexto de "conscientizar as massas", a curadoria dá um golpe de Estado nas
representações nacionais. Nessa, perdem os artistas, o público; enfim, a arte".
Supremo
Os argumentos citados acima
conduzem à responsabilidade
dos organizadores e, mais ainda, a fenômenos gerais que permitem uma tal situação.
Dois leitores se complementam em suas interrogações e
diagnósticos. O primeiro: "Me
pergunto por que o curador ganhou tanta força. Será que a mídia precisa personalizar para
dar destaque na coluna social?
Será que, nesse mundo "pós-",
as obras acabaram se tornando
apenas ilustrações do discurso
do curador? De onde veio isso?
O efeito é homogeneizar tudo e,
pior, dar uma sensação de déjà
vu. (...) Para o burocrata, o curador é a garantia de qualidade. É
ele que assegura o respaldo da
mídia". O segundo: "Nem sei
para quê existe bienal (...) ou todos os eventos de SP marcados
pelo gigantismo, pelo marketing e que vêm colados ao marketing social, pelo autoritarismo das idéias prontas e pela
pouca reflexão".
O fortalecimento da curadoria, suas relações com os mecanismos da produção cultural
evidenciaram-se de fato nesta
última bienal. De modo agudo,
ela reitera o que vem ocorrendo
em tantas e diversas exposições: a arte fica diminuída, neutralizada, abafada, amordaçada
por concepções que se servem
dela apenas como pretexto.
Morno
Supõe-se que uma bienal deva ser efervescente, criar conflitos, estimular a invenção.
Hoje, ao contrário, ela se tornou sisuda, oficial, bem comportada. É, paradoxalmente,
acadêmica, já que há um academismo das vanguardas e das
idéias críticas. Como escreve,
poeticamente, uma última leitora: "Me pergunto onde foi parar a arte, onde estariam os revezes e vibrações da alma que
ela consegue provocar...".
jorgecoli@uol.com.br
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