São Paulo, domingo, 04 de outubro de 2009

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Piratas na periferia do mercado

Entretenimento investe pouco em produção e venda no país; pirataria é a causa, dizem uns, ou o efeito, para outros

ANA PAULA SOUSA
DA REPORTAGEM LOCAL

Os brasileiros estão entre os campeões mundiais de pirataria porque CDs e DVDs são caros ou CDs e DVDs são caros porque o mercado formal é pequeno? Mais de 70% dos fãs de Play- Station compram jogos ilegais porque não há fabricantes no Brasil ou as empresas não fabricam aqui porque foram afugentadas pela pirataria?
No país em que 68% da população admite ter comprado produtos piratas, a "equação tostines" ajuda a resolver a conta em que se cruzam produtos piratas, contrabando e downloads ilegais.
"A distribuição de bens protegidos por direitos autorais é tão ilícita quanto alguém invadir sua casa ou roubar seu carro", defende o economista Gilson Schwartz, estudioso das mídias digitais.
"O descompasso entre legislação autoral e realidade tecnológica contribui para a percepção de que o direito de autor pode ser violado", pondera Ronaldo Lemos, da Fundação Getulio Vargas (FGV-RJ).
"A internet mudou os hábitos do consumidor. A indústria tem de mudar a maneira de distribuir conteúdo", admite Rodrigo Drysdale, da Warner Home Entertainment.
Legalmente, o compartilhamento de arquivos via internet não é, no Brasil, um ilícito penal. "A não ser que você venda esses arquivos, não é crime", define o promotor Alfonso Presti, coordenador do Plano de Atuação Integrada contra a Pirataria do Ministério Público estadual. Preocupam o órgão, sobretudo, as falsificações de brinquedos, que podem oferecer riscos à criança, e os desdobramentos da pirataria, "que pode ter ligação com outros crimes, como lavagem de dinheiro, sonegação, concorrência desleal e tendência à corrupção em diversos escalões".
Entre "filósofos do liberou geral" e "defensores intransigentes da tradição e da propriedade", as indústrias da música e do audiovisual tentam se equilibrar. No caso da indústria fonográfica, parece consenso que a solução não é a repressão ao download e aos CDs piratas.
"O consumidor tem que ser atraído", diz o inglês Adrian Harley, tirado da indústria fonográfica pela Nokia para cuidar de música no Brasil. "Qualidade de áudio, capa, ausência de vírus. Não adianta vender um arquivo, se o arquivo você baixa de graça. Tenho que vender um serviço."
No caso do cinema, as respostas ainda não são tão claras. "Nosso preço no varejo é 40% menor do que há três anos", diz Wilson Feitosa, da Europa Filmes, referindo-se aos DVDs. Com pirataria e internet, o mercado de locação teve queda no faturamento da ordem de 47% de 2006 para 2008.
Mas, na Warner, por exemplo, a compensação veio em forma de séries de TV, videogames e, agora, downloads. "[Cerca de] 20% dos nossos DVDs, no Brasil, são vendidos na internet. É o mais alto índice do mundo", diz Drysdale.
No caso dos jogos, a situação é ainda mais caótica. Além dos piratas, existe a "importação cinza", com produtos originais que entram no país de forma ilegal. "Só 20% do mercado de games é legal. Não é culpa só da pirataria. As empresas não se interessaram em ter uma representação local, em investir no país", admite Drysdale.
"Muitas negociações ficam pelo meio do caminho por causa da ilegalidade do mercado", declara Márcio Gonçalves, consultor antipirataria, que cita como exemplo o iTunes. Para Drysdale, a vastidão da pirataria no Brasil está ligada a questões sociais e econômicas, mas também a um tique cultural: "Ver o filme antes, e sem pagar, é, para muita gente, uma maneira de levar vantagem, de fazer valer a Lei de Gerson".


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