|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Ponto de Fuga
Boas resoluções a todos!
Champfleury foi pioneiro nos estudos da cultura popular e crítico de primeira linha; foi o historiador da arte que redescobriu artistas maiores do passado, como os irmãos Le Nain
JORGE COLI
COLUNISTA DA FOLHA
Ele é uma espécie de Deus
entre seus amigos". A
dor-de-cotovelo devia ser
enorme, nesta frase de um contemporâneo, ainda mais porque os amigos se chamavam
Baudelaire, Balzac, Delacroix,
Nadar, Whistler, Richard Wagner, Manet, Rodin. O "Deus"
desses deuses foi bem esquecido, hoje conhecido apenas por
alguns xeretas. Ao longo do século 19, era um intelectual e
pensador influente. Chamava-se Champfleury.
Escreveu romances, mas, sobretudo, atuou, pioneiro, nos
estudos da cultura popular -as
xilogravuras, as canções urbanas e rurais, a caricatura, a pantomima, o circo, a faiança rústica e a porcelana sofisticada. Foi
crítico de primeira linha; foi
historiador da arte que redescobriu artistas maiores do passado, como os irmãos Le Nain
[pintores franceses do séc. 17].
Convicções
Em 1861, Champfleury publicava uma obra intitulada
"Grandes Figuras de Ontem e
de Hoje - Balzac, Gérard de
Nerval, Wagner, Courbet". São
ensaios vivos e agudos sobre
cada um e ainda se mostram
testemunhos de sua convivência com esses grandes criadores. O livro, esgotado há muito,
está, integral, no site Google
Pesquisa de Livros [http://
books.google.com.br; buscar
"Grandes figures d'hier et d'aujourd'hui"]. À guisa de prefácio,
Champfleury insere vários
conselhos para si mesmo, redigidos muitos anos antes, quando era jovem e começava sua
carreira literária nos jornais.
São frases sábias, levemente
amargas, orgulhosas e misantrópicas. Não envelheceram sequer em uma vírgula. Numerosas demais para serem transcritas todas aqui, vão, pelo menos, algumas.
Frases
1) Nunca faça concessão a
ninguém. 2) Pense o que você
escreve e escreva o que você
pensa. 3) Se você quer enriquecer, jogue fora sua pena. 4) Se
você teme ferir as opiniões da
sociedade, jogue fora sua pena.
5) Se você quer agradar a toda
gente, jogue fora sua pena.
6) Se você quer, aos 30 anos
de idade, chegar à honra, à fortuna, à tranqüilidade, jogue fora sua pena. 7) Se o amor ao jogo, ao vinho, às mulheres é, em
você, mais forte do que a arte,
jogue fora sua pena. 8) Não se
submeta às leis da sociedade e
não tema viver sozinho, com
seu pensamento diante de si,
com seu pensamento como
companheiro, com seu pensamento como amigo, com seu
pensamento como namorada.
9) Obrigue-se a ser pobre. Se
você é rico, gaste logo seu dinheiro para pedir o sustento às
letras. 10) Com 20 anos, todos
somos ricos; o dinheiro virá
mais tarde.
11) Nunca escreva uma única
linha por complacência com
quem quer que seja; de complacência em complacência, você
se tornará apenas um empregado doméstico. 12) Não espere
uma popularidade súbita; só os
medíocres conseguem o sucesso na primeira tentativa. 13)
Pense muito no futuro, pouco
no passado, e esqueça o presente. 14) Não se gaste com polêmicas frívolas. As polêmicas
não fazem bons volumes. 15)
Negam sua obra; sua obra responde por você. 16) Você foi negado, logo, você existe. 17) De 18
a 25 anos, permito-lhe todas as
paixões; para pintar o amor é
preciso ter amado. Você ainda
não é homem e não sabe o que
vai se tornar; mas tome cuidado
para que as paixões não grudem em você por toda a vida.
18) Se precisar de um amigo
dedicado, sempre alegre, sempre disposto a acompanhar-lhe
em longas caminhadas, pegue
um cachorro. 19) Você deve julgar tudo por você mesmo, por
seus olhos e por seus ouvidos,
nunca decida nada pelos olhos
de outro ou pelos ouvidos de
seu vizinho.
jorgecoli@uol.com.br
Texto Anterior: Os Dez + Próximo Texto: Biblioteca Básica: Correspondência Índice
|