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D. Paulo diz que
não quis saber
da luta armada
da Redação
D. Paulo Evaristo Arns, cardeal-arcebispo de São Paulo de
1973 a 1998, afirmou à Folha que
nunca quis saber se os frades dominicanos participaram ou não da
luta armada ao lado da ALN.
Ele foi o principal membro da
igreja que defendeu, a partir do final dos anos 60, os direitos humanos e criticou a tortura no regime
militar. Foi também um dos organizadores do lançamento, em 85,
do projeto "Brasil, Nunca Mais",
dossiê sobre os mortos e desaparecidos políticos durante o período.
Em novembro de 69, quando era
bispo auxiliar, d. Paulo foi designado para visitar os dominicanos
no presídio Tiradentes e constatou
que estava havendo tortura.
"Para entrar lá, passei pelas armas dos militares e pela supervisão dos carcereiros. Entrei no presídio tendo ao meu lado direito
um espião e ao meu lado esquerdo
outro espião. Eles iriam ouvir tudo
que eu falasse com os frades",
contou d. Paulo à Folha.
Como não poderia falar com os
presos políticos sobre maus-tratos, perguntou a eles o que mais
necessitavam no presídio. "Eles
me responderam que precisavam
de remédio. Então, logo entendi:
quer dizer que estão machucados". D. Paulo deduziu que estavam sendo torturados.
Os dominicanos, entre eles os
frades Tito, Fernando, Ivo e Betto,
participavam da ALN, a maior organização de luta armada no regime militar brasileiro, envolvimento que a igreja não autorizava. D.
Paulo, no entanto, diz que não se
interessou em saber que tipo de
participação tinham os padres.
"Só queria saber se estavam
sendo bem tratados. Sobre o (frei)
Betto, nunca soube o que ele fez.
Até hoje não sei", disse d. Paulo.
"Mea culpa"
O ex-cardeal-arcebispo de São
Paulo disse que começou a se interessar pela luta dos direitos humanos após tomar conhecimento das
prisões e torturas de Ribeirão Preto, quando foram detidos guerrilheiros da FALN (Forças Armadas
de Libertação Nacional) e madre
Maurina Borges da Silveira.
"O arcebispo de Ribeirão à época, d. Felício da Cunha, tinha sido
meu professor. Ele me contou sobre os abusos policiais na cidade." D. Felício excomungou dois
delegados que estariam envolvidos na tortura em Ribeirão Preto.
"Os policiais fizeram maldades
com os prisioneiros, inclusive
contra a madre Maurina", disse.
Depois disso, em 72, numa Assembléia Ordinária da CNBB
(Conferência Nacional dos Bispos
do Brasil), d. Paulo e outros bispos
aprovaram um documento que e
criticava a existência da tortura no
Brasil. "Foi o primeiro documento da igreja contra a tortura", afirma o historiador Kenneth Serbin.
A luta de d. Paulo contra a tortura lhe rendeu vários problemas.
Em agosto de 82, por exemplo,
uma edição do jornal "O São Paulo", da arquidiocese da cidade, foi
falsificada e distribuída nas igrejas
da capital com um "mea culpa"
do cardeal-arcebispo.
O texto apócrifo trazia uma condenação de d. Paulo ao marxismo
e à teologia da libertação.
Dias depois, foi rodada uma edição de "O São Paulo" desmentindo o jornal falsificado.
No último dia 17, ele celebrou
sua missa de despedida como cardeal-arcebispo de São Paulo. Assumiu em seu lugar d. Cláudio
Hummes.
(LE)
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