São Paulo, Domingo, 07 de Novembro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

BRASIL 500 D.C.

Luiz Costa Lima passa a escrever na Folha

Alexandre Campbell/Folha Imagem
O crítico literário Luiz Costa Lima, em seu apartamento, no Rio



Artigos do crítico literário serão publicados mensalmente no Mais!

ADRIANO SCHWARTZ
Editor-adjunto do Mais!

Tratar de autores novos ou menos conhecidos e de obras lançadas recentemente no mercado editorial brasileiro é o principal propósito do crítico literário e professor Luiz Costa Lima nos artigos mensais que fará para a seção "Brasil 500 d.C." (depois de Cabral), da Folha.
Costa Lima, que estréia hoje no Mais! (leia o texto abaixo), vem se juntar, nesse espaço, aos filósofos Bento Prado Jr. e Marilena Chaui, aos historiadores Evaldo Cabral de Melo e José Murilo de Carvalho, ao geógrafo Milton Santos, ao antropólogo Hermano Vianna e ao psicanalista Jurandir Freire Costa.
Um dos mais importantes teóricos da literatura do país, com obras publicadas inclusive no exterior, em locais como Estados Unidos e Alemanha, e um dos principais analistas da literatura brasileira recente, com textos sobre Machado de Assis, Euclides da Cunha, Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto, entre outros, Luiz Costa Lima é professor titular de literatura comparada na Universidade do Estado do Rio de Janeiro e professor titular da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) no programa de história social da cultura.
Sobre sua obra, acaba de ser lançado pela Editora Record o livro "Máscaras da Mímesis" (organização de Hans Ulrich Gumbrecht e João Cezar de Castro Rocha), que traz 21 ensaios de autores como, por exemplo, Benedito Nunes, Flora Süssekind, Wolfgang Iser e Barbara Cassin.
No início do ano que vem, provavelmente em março, Costa Lima, que concedeu a entrevista a seguir por telefone, deverá publicar o livro "Mímesis - Desafio ao Pensamento", pela Civilização Brasileira. Trata-se de, como o próprio nome indica, uma nova análise daquilo que o autor considera como sua "obsessão pessoal", a idéia de mímesis.

Folha - Como o sr. analisa o momento atual da literatura brasileira?
Luiz Costa Lima -
A impressão que eu tenho é que o momento maior da literatura brasileira hoje é na poesia, pelo surgimento de vários e vários poetas que se destacam em relação aos prosadores. Estes, com poucas exceções, parecem-me atraídos -o que provoca uma facilitação do texto- pelo mercado. O fato de que a poesia, a priori, venda pouco a torna menos suscetível de ser afetada pela simplificação exigida pelo mercado.

Folha - Essa simplificação é um fenômeno mundial?
Costa Lima -
Posso supor que é um fenômeno mundial. O fato é que, em um mercado muito mais complexo, como o europeu ou o norte-americano, há lugar tanto para o best seller, um texto facilitado, quanto para um texto mais exigente.
No caso europeu, os nomes recentes que me vêm à cabeça seriam Thomas Bernhard, que morreu jovem, ou Ingeborg Bachmann, uma companheira de geração do Bernhard, que morreu jovem também. No caso americano, há vários, o último Norman Mailer, Philip Roth e outros. No caso francês, o último grande nome, que continua atuando, é Claude Simon, muito superior a todo o chamado "nouveau roman". Há ainda o sul-africano J. M. Coetzee, que é bastante bom como romancista e, também, como ensaísta.

Folha - E no Brasil? O romance "As Iniciais", sobre o qual o sr. escreve em seu primeiro texto para a série "Brasil 500 d.C." é uma exceção?
Costa Lima -
Um livro como esse é uma exceção, e não me refiro apenas ao último livro de Bernardo Carvalho. Há ainda um autor menos conhecido, que acho muito bom, Jair Ferreira dos Santos, cujo livro de contos "A Inexistente Arte da Decepção", de 1996, passou completamente despercebido, embora o considere um grande livro, além de escritores como Rubens Figueiredo ou Patrícia Mello.

Folha - E a crítica brasileira?
Costa Lima -
A reflexão crítica atravessa também um momento de baixa. Há uma geração -que pode ser chamada de "pós-Antonio Candido"- que conta com uma série de críticos firmados ainda produzindo bem.
A geração mais nova, os "netos de Antonio Candido", me parece mais fraca, ou, pelo menos, sem o mesmo grau de afirmação que tiveram críticos como Alfredo Bosi, Roberto Schwarz, João Alexandre Barbosa, Davi Arrigucci.
Há, entretanto, uma coisa nova no ambiente brasileiro, que é o aparecimento, em São Paulo, de uma área de germanística -que nunca foi forte entre nós-, constituída por jovens germanistas -Márcio Seligmann-Silva e Márcio Suzuki-, que reponta. Ao passo que os companheiros de geração deles não me parecem ter maior destaque, esses críticos não encontram correspondência com a geração anterior, do ponto de vista específico da germanística.

Folha - O sr. vê alguma tarefa específica para a crítica hoje em dia?
Costa Lima -
Eu acredito que um crítico tem uma dupla função. A primeira foi muito pouco exercida entre nós. É o crítico que pensa sua própria atividade, uma função teórica do crítico. Essa função deveria ter sido exercida fundamentalmente pela universidade. Raramente entretanto isso se deu, sobretudo por aqui. Nós temos uma enorme carência de reflexão teórica sobre literatura exercida pelos críticos, uma enorme carência teórica. Isso não é, portanto, um problema de agora, mas da tradição brasileira. Teria cabido à universidade o cumprimento dessa tarefa, mas ela raramente o exerceu.
A segunda tarefa -uma tarefa pragmática- se cumpre tendo em conta dois parâmetros negativos. De um lado o mercado, interessado num livro fluente, de gestão rápida, e, de outro, a universidade, que se burocratizou, ou vem se burocratizando -e isso não só no Brasil. Tendo em conta esses dois parâmetro, impõe-se essa tarefa de exercício efetivo em relação ou a autores jovens ou a edições recentes etc.
Acho importante, dentro desse aspecto pragmático, chamar a atenção ainda para outra coisa. Assiste-se hoje em dia a um rompimento entre o que se poderia chamar de as fronteiras discursivas das áreas. Até 30, 40 anos atrás, quem fazia filosofia fazia filosofia, quem fazia economia fazia economia etc. Hoje em dia, sente-se a necessidade de uma inter-relação muito mais aguda no interior dessas áreas. Não se trata de advogar a volta do enciclopedismo, não é isso, mas sim de levar em conta um sistema de retroalimentação que essas áreas, ainda que distintas, mantêm entre si. Isso, diria, é uma função da crítica em seu aspecto pragmático, ainda que em seu aspecto teórico ela necessariamente precise levar em conta esses elementos.

Folha - Em seus artigos na Folha o sr. privilegiará essa função pragmática?
Costa Lima -
Sim.

Folha - O sr. está trabalhando em algum livro agora? Lançará algo em breve?
Costa Lima -
Estou com um livro pronto e devo lançá-lo em março do ano que vem. Ele chama-se "Mímesis - Desafio ao Pensamento". Espero que seja a palavra mais radical, no sentido etimológico, que seja onde mais longe eu tenha podido até agora ir na análise do fenômeno da mímesis, que é a minha obsessão.


Texto Anterior: Joyce Pascowitch
Próximo Texto: A ficção mistificante
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.