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ESTRANHOS NO PARAÍSO
AUTOR DE "ALIENS - POR QUE ELES ESTÃO AQUI?", ESCRITOR INGLÊS
DIZ QUE MITO E REAL SE CONFUNDEM NA
FICÇÃO CIENTÍFICA E AFIRMA QUE "MATRIX"
É A QUINTESSÊNCIA DO GÊNERO
DA REDAÇÃO
Em defesa da literatura de ficção científica, por vezes considerada um gênero menor, o
escritor e jornalista inglês
Bryan Appleyard pesquisou o imaginário por trás das obras, realizando um estudo psicológico sobre o
que faz as pessoas acreditarem em
extraterrestres.
Autor do recém-lançado "Aliens
-Why They Are Here?" [Aliens - Por
Que Eles Estão Aqui?, Scribner, 336
págs., 15,99 libras - R$ 75], em que
analisa os contatos com extraterrestres sob o ponto de vista da experiência psicológica, Appleyard critica a utilização de tipos humanos nos
aliens da série "Guerra nas Estrelas"
e diz que ficção e realidade se alimentam uma da outra.
Em entrevista à Folha, ele fala sobre o gênero ficção científica, os contatos humanos com extraterrestres,
e diz não acreditar em aliens.
Folha - O sr. acredita em aliens?
Bryan Appleyard - Não. Não acredito, no sentido de achar que aliens estiveram na Terra. Tenho 90% de certeza que não são realmente extraterrestres o que as pessoas vêem. Acredito, entretanto, que as pessoas estão
tendo as experiências que relatam.
Não tenho nenhuma dúvida de que
a maioria delas está dizendo a verdade. Eu mesmo fui hipnotizado, como parte do processo de pesquisa
deste livro, e vi um disco voador. Estava completamente convencido de
que era real durante a hipnose.
Essa experiência me fez compreender o quanto incerto o estado
da mente é. As pessoas podem ver
coisas que para elas são absolutamente reais. Isso é muito importante
para entender a forma como compreendemos e vemos o mundo.
Folha - Por que o sr. decidiu pesquisar a presença de aliens no mundo?
Appleyard - Minha idéia inicial era
escrever um livro sobre a relação entre cinema e ficção científica, mas, ao
perceber que não podíamos separar
a ficção da realidade, o projeto mudou: escrever uma história cultural,
uma filosofia psicológica e social de
como e por que as pessoas vêem
aliens.
Pesquisei ficção, documentos e relatos de pessoas que diziam ter visto
aliens etc. Então vi que o livro se
preocupava acima de tudo com a
forma como vemos e interpretamos
a realidade.
Folha - O que o sr. descobriu de mais
interessante nessa pesquisa?
Appleyard - Descobri que é muito
comum as pessoas dizerem que viram coisas não identificadas no céu,
como discos voadores. É um fenômeno muito comum e pelo qual as
pessoas se apaixonam, defendendo
seus pontos de vista; as pessoas que
acreditam em aliens crêem da mesma forma que as pessoas que acreditam em uma religião.
Pessoas
acreditam em aliens da
mesma forma
que em
uma religião
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Folha - Como se separa a realidade
do mito, na ficção científica?
Appleyard - Não é possível separar
a ficção da realidade porque muitas
das ficções tiram suas idéias da experiência das pessoas, e muitas experiências das pessoas são alimentadas
pela ficção.
Um filme como "Contatos Imediatos de Terceiro Grau" [de Steven
Spielberg, 1977] é um retrato do que
as pessoas diziam sobre os aliens e
sobre a abdução por extraterrestres.
Muito do filme foi tirado de evidências reais vindas de pessoas reais.
Ele, por sua vez, acaba influenciando
mais pessoas a terem "contatos"
com alienígenas. É um processo de
mão dupla, uma retroalimentação.
Se uma pessoa diz que foi abduzida, por mais que eu não acredite que
isso tenha realmente acontecido,
acredito que algo aconteceu. Acho
que as pessoas têm episódios estranhos em suas vidas, perda de tempo,
de memória etc.
Folha - O que o sr. acha da série
"Guerra nas Estrelas"?
Appleyard - Eu gostei dos três primeiros filmes, mas nunca os vi como
ficção científica. Para mim é uma
"ópera espacial". É uma aventura no
espaço. Assim como "Jornada nas
Estrelas", eles projetam tipos humanos nos alienígenas.
Folha - O sr. acha que "Guerra nas
Estrelas" também pode alimentar o
imaginário de fantasia da sociedade?
Appleyard - Só se forem pessoas
muito presas ao lado da diversão, do
entretenimento. Acredito que há
duas formas de entrar em contato
com aliens. Uma é quando eles realmente pousam na Terra. A outra,
menos falada, é a criação de aliens
pelos humanos. A criação de máquinas inteligentes é como uma criação
de aliens -uma forma de inteligência exterior.
Folha - É uma idéia mais ligada a
"Matrix" que a "Guerra nas Estrelas",
então?
Appleyard - "Matrix" é uma ficção
científica genuína, ao menos o primeiro filme. "Guerra nas Estrelas",
não, já que não questiona nem analisa as implicações da tecnologia, do
desenvolvimento. Não há nada disso
em "Guerra nas Estrelas", que é um
filme de caubóis feito no espaço.
Acho que os dois melhores exemplos de filmes de ficção científica são
"Blade Runner" e o original russo
"Solaris" [Andrei Tarkóvski, 1972].
O primeiro questiona nossa relação
com o desenvolvimento tecnológico, o outro é sobre o encontro com
um alienígena tão estranho que não
podia ser compreendido. Acho que,
se um dia encontrássemos alienígenas, seria assim. E não humanos
com rostos engraçados.
Folha - Qual a sua relação com a ficção científica?
Appleyard - Escrevi muitos livros
criticando a ciência. Acho que alguns cientistas, como Richard Dawkings e Stephen Hawkings, na maioria das vezes, não sabem do que estão falando. Acho-os muito dúbios.
Notei há algum tempo que a ficção
científica não era levada a sério nos
estudos literários, mas as obras de
H.G. Wells, que considero o melhor
escritor de ficção científica, são ótima literatura.
Folha - Que livros o sr. apontaria como os mais marcantes do gênero?
Appleyard - Todos os de H.G.
Wells. "A Máquina do Tempo", "A
Guerra dos Mundos", "A Ilha do Dr.
Moreau" -que se tornaram péssimos filmes-, são livros maravilhosos, muito bem escritos. Gosto muito de Olaf Stapledon, de Stanislaw
Lem, que escreveu o excelente, mas
pouco conhecido, "Fiasco". Júlio
Verne também foi um escritor de
importância.
O argentino Borges também foi,
um pouco, escritor de ficção científica. Ele se baseou na literatura inglesa
de aventura, mas adicionava toques
pessoais, criando histórias de ficção
científica.
(DANIEL BUARQUE)
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