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O tríptico religioso de Haroldo de Campos
Sai em livro tradução de trechos da Bíblia feita pelo crítico e poeta concretista, morto em 2003
DANIEL BUARQUE
DA REDAÇÃO
Uma nova tradução para
três importantes trechos
da Bíblia. O trabalho, realizado pelo poeta, tradutor e
crítico Haroldo de Campos (1929-2003) e deixado pronto pouco antes
de sua morte, foi "organizado" pelo
tradutor e professor de língua e literatura gregas na Universidade Estadual de Campinas Trajano Vieira.
Amigo pessoal de Campos, Vieira
teve acesso a todos os manuscritos e
trabalhos inéditos deixados por ele.
"Éden - Um Tríptico Bíblico" (ed.
Perspectiva, tel. 0/xx/11/3885-8388,
184 págs., preço não definido) é a
reunião de "A Astúcia da Serpente"
-episódio do Gênese que culmina
com a expulsão do paraíso-, "Babel" -sobre a torre homônima- e
"O Cântico dos Cânticos", além de
ensaios introdutórios a cada um deles e cópias de esboços manuscritos
da tradução do último. O primeiro
texto e trechos do último foram publicados anteriormente no Mais!
(em 07/5/95 e 10/4/1994, respectivamente), que traz agora mais uma
parte inédita da poesia bíblica (leia
ao lado). O outro foi publicado em
1998 na revista "Série Linguagem".
Em entrevista ao Mais!, Vieira diz
que a nova tradução traz uma visão
poética concreta sobre textos anteriormente iluminados sob o ponto
de vista religioso ou filosófico. Para
ele, Campos deixou um vasto material inédito e de altíssima qualidade,
que deverá ser analisado para futura
publicação.
Folha - Como foi o trabalho de organização do livro?
Trajano Vieira - Ele foi deixado já
completo por Haroldo, inclusive
com prefácio, com indicações de como deveria ser editado e organizado.
Folha - Qual sua importância para o
conjunto da obra do autor?
Vieira - Ele dá continuidade a dois
outros projetos sobre a mesma temática anteriormente publicados
por Haroldo ["Bere'shith" e "Qohelet" (ambos pela ed. Perspectiva)]. É
uma obra que enriquece uma produção específica de Haroldo na área
de estudos bíblicos e tradução. É um
acréscimo à obra que é um mosaico
de temas e línguas, de uma complexidade única no nosso panorama.
Folha - Qual a importância da obra
para o estudo do ofício tradutório?
Vieira - Haroldo sempre foi um ensaísta e pesquisador extremamente
rigoroso. Sempre que ele se envolvia
num projeto dessa magnitude -foi
assim com Homero também- ele
se cercava de uma bibliografia crítica
extremamente atualizada e dialogava com essa bibliografia sempre do
ponto de vista do poeta e tradutor.
Esse debate da parte ensaística é
muito importante. É uma característica de seu trabalho literário e reflexivo sempre estabelecer um diálogo
com aqueles autores que trataram os
diversos temas da atualidade. É notável a capacidade que tinha de, enquanto poeta, estabelecer esse diálogo com especialistas e iluminar do
ponto de vista poético uma certa
perspectiva nova. Ele não incorpora
essa bibliografia crítica de forma
passiva. É sempre um diálogo que
debate essas questões teóricas do ângulo poético.
Folha - Por que o sr. incluiu manuscritos nesta edição?
Vieira - A idéia é possibilitar ao leitor um contato com esse processo
criativo do próprio Haroldo. Ali já
há toda uma estratégia que envolve
possibilidades de tradução de certos
trechos, há hesitações naturais que
revelam o próprio processo criativo
de Haroldo. É formidável a publicação desse material que possibilita
uma reflexão sobre essa complexa
atividade criativa do autor.
Folha - Que mais havia no material
que Haroldo deixou inédito?
Vieira - É um material muito diversificado, que contém traduções em
diversas línguas, ensaios sobre literatura francesa e brasileira, traduções de poesias do grego moderno e
antigo, poemas egípcios que ele vinha traduzindo um pouco antes de
morrer, muita poesia italiana que ele
não chegou a publicar.
Trata-se de um material muito diversificado.
Folha - Há alguma previsão de publicação desse material?
Vieira - Há o interesse da família na
publicação, mas aos poucos. Como
eles apresentam um grau de dificuldade para a edição, o organizador terá muito trabalho para organizar essa parte da obra.
Toda a obra de Haroldo de Campos é de altíssima qualidade. Uma
das obras que deverão ser publicadas proximamente é um livro volumoso de poemas e traduções que ele
deixou razoavelmente organizado
para publicação.
Folha - Que projetos Haroldo de
Campos tinha antes de morrer?
Vieira - No campo da tradução,
sempre manifestou interesse em traduzir "A Odisséia", de Homero, tendo já traduzido "A Ilíada" (ed. Arx).
Na ensaística, desejava elaborar uma
antologia poética com pedras de toque da poesia brasileira até o período simbolista. Era um projeto que
ele ainda chegou a iniciar pouco antes de morrer, fazendo uma seleção
rigorosa de obras da poesia brasileira. Além disso, ele também escrevia
um trabalho sobre Victor Hugo.
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