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LIVROS
A subversão do conformismo
CARLOS ADRIANO
especial para a Folha
Após meia-revolução na poesia e
meia-revolução na prosa (e antes
de fazer o mesmo no cinema), o
poeta, ensaísta e tradutor Décio
Pignatari lança as armas para um
embate em bases ideológicas com
seu novo livro, "Cultura Pós-Nacionalista".
Com poemas coligidos em
"Poesia pois É Poesia", contos e
romances contidos em "O Rosto
da Memória" e "Panteros", o
autor reuniu nesta antologia 15
textos "sobre um sonhado Brasil
internacionalista", publicados
entre 1976 e 1998 em congressos,
revistas e jornais (no Mais! e no
extinto "Folhetim" da Folha).
Com uma leitura que enfoca parâmetros de formação da identidade e situação no mundo sob "o
processo da industrialização brasileira errático e predatório", a
obra pode arrepiar os compartimentados departamentos das
ciências sociais.
A questão (querela?) do "nacional" (às vezes hifenizado ao aposto "popular") esteve muito em
voga em rodas intelectuais nos
anos 50 e 60, numa época em que
expressões culturais de vigor viviam momentos de agitação e debate.
"Habitué" de polêmicas de
ponta, Pignatari, introdutor do
pensamento semiótico no país (e
de outras formas avessas à simplória lógica linear-discursiva), leva
vantagem ao voltar ao tema surrado (mas pronto para viagem no
mercado neoliberal), graças à verve de suas idéias e à sofisticação de
seu repertório.
O autor aciona as munições metalinguísticas da arte e da história
para subverter os sintagmas estagnados da reflexão conformista
globalizada. Busca a reforma do
formato agrário da mentalidade
nacional que grassa na re/produção cultural.
Pedagogia de poeta (e não doutrina de acadêmicos ou panfletários), o pensar relaciona os signos
que formam e condicionam a realidade e moldam uma visão de
mundo. Abre os canais da infra-estrutura e traz os desvios da
superestrutura. Interessa a "passagem da idéia de "nacional' para
a idéia de "brasileiro', que corresponde à transferência da idéia de
"nação' para a idéia de "povo'".
A obra marca posição, na abordagem em diagramas diacrônicos
de estruturas decisivas. Na amostragem de pontos de ruptura e
substância ("o que chamamos de
"Arte' não é senão um capítulo de
nostalgia e um preconceito cultural"), o autor releva a corrosão
necessária que o "signo novo estrutural" provoca nos sistemas
caquéticos.
Neste país sem secessões, com
apenas as sucessões de castas e arrochos de praxe ("A vida vale pelos seus extremos, mas a humanidade só caminha pelos meios",
Valéry via Pignatari), espera-se
que, apesar das penas, ainda possa
resistir a medula tesa na Geléia
Geral Brasileira.
Carlos Adriano é diretor de cinema, realizador
dos filmes "A Voz e o Vazio: A Vez de Vassourinha" e "Remanescências"; com Bernardo Vorobow, organizou o livro "Julio Bressane: CinePoética".
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