São Paulo, domingo, 18 de março de 2007

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Ponto de fuga

Around town

Ao contrário de Turner ou Monet e dos grandes paisagistas venezianos do século 18, Sargent recusa a "veduta", a vista que situa um belo monumento refletindo-se nas águas

JORGE COLI
COLUNISTA DA FOLHA

John Singer Sargent foi um pintor americano. Nasceu em 1856, morreu em 1925.
Como alguns outros artistas dos EUA, como Whistler, como Benjamin West (este muito antes, no século 18), passou a maior parte do tempo de sua vida na Europa.
Seguiu a regra de seus ilustres colegas e guardou laços com a pátria. Laços de mercado, sobretudo. Teve grandes colecionadores e encomendas importantes nos EUA. Era europeu de espírito, banhado por um clima "fin-de-siècle". Proust transformou em personagens de sua saga mundana "Em Busca do Tempo Perdido" dois de seus amigos íntimos, Montesquiou e Helleu. O mundo de Sargent é muito proustiano. Amou Veneza, onde passava longas temporadas todos os anos.
A Adelson Galleries, em Nova York, bem perto do Metropolitan Museum, organizou uma exposição, "Sargent"s Venice".
Sessenta obras, alguns óleos, muitas aquarelas, vindas de coleções particulares.
Ao contrário de seus vários predecessores, Turner ou Monet, por exemplo, que também pintaram Veneza; ao contrário dos grandes paisagistas venezianos do século 18, como Canaletto ou Guardi, Sargent recusa a "veduta", a vista que situa um belo monumento refletindo-se nas águas.
Esta era a regra: toma-se o Palácio dos Doges, a igreja da Salute ou a de San Giorgio Maggiore no meio das brumas, das luzes rebatidas pelo mar, dos crepúsculos incendiados.
Sargent fez outra coisa. Tinha uma gôndola em que instalou um pequeno ateliê. Captava seus motivos muito de perto, compunha pela visão fragmentada. A seqüência das obras exposta é cinematográfica: são close-ups num fio condutor que, sem contradição, sugere ao mesmo tempo a montagem e o "travelling".

Mudou o Natal?
O novo MoMA. Nostalgia do antigo. Era apertado, talvez. O atual resulta de milhões e milhões de dólares empregados numa reforma. Os espaços de exposição foram ampliados, mas continuam bem insuficientes para o imenso acervo.
O modo de expor as obras, ao invés de melhorar, piorou. Os quadros se sucedem contra um fundo branco uniforme, um ao lado do outro, uns indiferentes aos outros. Tudo, das obras mais belas às menos convencionais, é tratado com o mesmo respeito frio que as assassina.
A impressão de harmonia, que cortava o fôlego quando se entrava na sala dos Matisses, desapareceu. Justamente a "Dança", de Matisse, foi pendurada num patamar de escada.
A grande "Ninféia", de Monet, a "Noite Estrelada", de Van Gogh, as "Demoiselles d'Avignon", de Picasso, têm que fazer esforço para escapar da neutralidade museográfica e se impor ao olhar: um cúmulo.

Embaciado
Em 1977, Jeff Wall, canadense, sai do Museu do Prado, em Madri, perguntando-se por que as fotografias modernas não mostram o mesmo poder avassalador das pinturas antigas.
Tem um insight ao descobrir uma publicidade de grande formato, em transparência, iluminada por trás. Encontra sua forma. Hoje, o MoMA, em Nova York, consagra a ele uma retrospectiva de suas fotos em formato panorâmico, que se referem, de um modo ou de outro, à história da pintura e também ao cinema.

Arquétipo
A New York Studio School of Drawing, Painting and Sculpture apresenta uma exposição de Merlin James, pintor escocês que retoma paisagens de Poussin, Courbet ou Delacroix.
Elas ressurgem em pequenas telas cobertas por matéria espessa, meio empoeirada, com um ar envelhecido de lembranças vagas, mas densamente marcadas pelo tempo.

jorgecoli@uol.com.br


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