São Paulo, domingo, 18 de maio de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

8. Imagem negativa

Na primeira semana, recrutas saíam do quartel quando uma jovem no carro gritou: "Seus vermes! Vermes!".
Regida pelo lema "servir e proteger", a PM tem relação tensa com a sociedade. Há latente rancor por parte dos policiais, que julgam não ter o reconhecimento daqueles por quem se arriscam. "A população é mal-educada. Vocês colaborarão para a rejeição cair. É um câncer, que não mudaremos. A sociedade descasca a PM. Wagner Montes [apresentador de programa na TV Record do Rio] descasca bandido. Bandido dá tiro pra caramba. Mas quem matou? A PM! Só Wagner Montes defende a PM", lamenta um sargento.
Um aspirante critica. "O playboy é parado e a primeira coisa que faz é: "Quanto é o café [propina]?" Dá R$ 10 e, quando vai embora, xinga o PM: "Safado, corrupto!" E ele? A sociedade tem a polícia que merece? Tem. A mídia só dá porrada, mas esta é uma boa casa."
Há inquietação com a imagem negativa, e o inconformismo reforça o corporativismo.
"O código 800 [auxílio a policial, prioridade] é o mais importante. Tem a velhinha assaltada e o 800; esquece a velha e socorre o PM. Primeiro o colega. Ninguém gosta de vocês, só seu cachorro. A cidade vai odiar vocês: o porteiro dá café, a mulher dá lanche, mas todo mundo te odeia, só dá porque está de farda." Outro aspirante resume. "Hoje, tudo o que o PM faz incorre em erro, mesmo quando não é."
Um sargento ataca. "A sociedade quer paz social? Faz blitz, pega o filho do juiz com droga... Entra na favela, mata 15 bandidos e uma velhinha. Aí fazem passeata pela velha."
Um instrutor diz que o PM que a sociedade quer não fuma, não bebe e não pega dinheiro. "Esse PM de cordão de ouro, pochete [com arma], acabou, ficou no tempo. Na última turma, morreu um aluno, vindo para cá, de pochete, com uma saraivada de tiros. Não quero ninguém morto na minha companhia. É horrível." Em fevereiro, um aspirante foi assassinado ao sair do quartel.
Ao assumir o comando do Centro de Formação, o coronel Ivan Muniz tinha como meta recuperar a imagem da corporação -"mudar o rosto da PM", em suas palavras.
"Muitos querem pisar este solo sagrado. Alguns terão a honra e a glória de ser PMs, heróis sociais, na luta, enquanto outros se omitem. Se não houvesse sacrifício, não haveria heroísmo, heróis sociais. Não tenho dúvida de que aqui há heróis sociais, que os senhores farão diferença e darão um novo rosto à PM", disse.
Sereno e cordial, ia diariamente ao rancho. "Boa tarde! Está boa a comida?", perguntava. Em 30 de janeiro passado, no auge de crise da PM no Rio, o coronel Muniz entregou o cargo, com mais de 40 comandantes da corporação, em protesto contra os salários e a exoneração do comandante-geral Ubiratan Ângelo.


Texto Anterior: 7. Aula de ética
Próximo Texto: 9. Favela X zona sul
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.