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Televisão - Canais abertos
IVANA BENTES
ESPECIAL PARA A FOLHA
Espero que em 2006 fique cada
vez mais evidente que a televisão brasileira é uma concessão do Estado e da sociedade
brasileira, e não o contrário, o Estado brasileiro e a sociedade reféns da
televisão. Sendo concessões públicas, as TVs em 2006, além de usarem
a concessão para ganhar dinheiro ou
como máquina político-eleitoral,
poderiam quadruplicar sua contrapartida pública, social, cultural, experimental, educativa, para além do
mercado, do lucro e da chantagem
política.
Como a TV é importante e influente demais para ficar na mão
apenas dos executivos, do marketing e dos altos índices de audiência,
espero que em 2006 seja aberta a caixa-preta da TV para os conselhos de
ética, à produção independente, à
produção regional e exibam na TV
aberta o cinema, à videoarte e aos
curtas-metragens brasileiros.
Espero que o Brasil não perca a
oportunidade histórica, com a implantação da TV digital, de democratizar o mais poderoso meio de
comunicação do país. Dependendo
do que for decidido agora, no início
de 2006 será possível aumentar e disponibilizar novos canais (multicanais) para novos atores, movimentos sociais, ONGs, favelas, para o cinema brasileiro, para os coletivos de
arte, as universidades etc. ou manter
as emissoras de TV sob o controle
dos mesmos, de uma minoria.
Democracia interativa
Agora, implantar o sistema de alta
definição (HDTV) em 2006 só para
transmitir a Copa do Mundo da Alemanha e faturar milhões em anúncios é um negócio que só as emissoras de TV e o ministro das Comunicações, Hélio Costa, defendem. Nenhuma linha a mais de definição na
tela é necessária para ver um jogo de
futebol, e interatividade para clicar e
comprar produtos na tela da TV não
tem nada a ver como democracia
participativa!
Espero que seja revista a Lei Geral
de Comunicação de Massa e que televisão, cinema, vídeo, internet e toda produção audiovisual possam ser
finalmente reguladas e regulamentadas por um só órgão, a Ancinav
(Agência Nacional de Cinema e Audiovisual). Agência que foi abortada
por questões políticas, lobby e pressão das emissoras de televisão.
Espero que, em 2006, todo telespectador brasileiro, associação, grupo, rede, organização tenham direito de resposta na TV, podendo ocupar o tempo necessário, na TV aberta ou a cabo, sempre que forem lesados em seus direitos de cidadão.
Esteticamente, espero que os núcleos de experimentação de novas
linguagens cresçam e apareçam, que
a interatividade inteligente e os novos formatos, como os "reality
shows" e games, não se esgotem na
sua versão comercial, que se invista
em documentários que produzam
conhecimento novo, que investiguem a realidade, e não apenas ilustrem o que já sabemos com "faits-divers" e imagens sensacionalistas.
Novo nacionalismo
Que os criadores da TV descubram a televisão segundo Jean-Luc
Godard, Peter Greenaway, The Kitchen [centro de vídeo, música, performance, dança, filme e literatura
em Nova York], descubram o documentário experimental e uma nova
iconografia para expressar o Brasil
que não seja só o nacional-popular,
o nacionalismo engessado, o neopopulismo, mas as novas imagens e
forças, transnacionais, que nos habitam e que a TV ainda não conseguiu
mapear.
Que as imagens das favelas nos telejornais não sirvam apenas para
produzir o medo, o preconceito, os
discursos de repressão e o estado de
exceção, imagens e reportagens que
legitimam o assassinato diário de favelados pela polícia e que produzem
um novo conservadorismo que pede
a remoção das favelas e a expulsão
dos pobres de nosso campo visual.
Em 2006, espero que a televisão
não faça campanha eleitoral nos seu
programas de entretenimento, nos
"talk shows", nos telejornais e que
não eleja nem derrube nenhum candidato a presidente da República. É
pedir demais?
Ivana Bentes é professora da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio
de Janeiro e autora de "Joaquim Pedro de
Andrade" (ed. Relume-Dumará).
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