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Ponto de Fuga
Longos olhos ovais
Técnico perfeito, Mori copiou admiravel-
mente um Uccello, a "Batalha de San Romano"; ela pertence ao Masp, mas, pena, é pouco exposta ao público
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JORGE COLI
COLUNISTA DA FOLHA
Há, neste momento, uma
exposição obrigatória.
O título é: "Um Círculo
de Ligações - Foujita no Brasil,
Kaminagai e o Jovem Mori".
Está no Centro Cultural do
Banco do Brasil em SP, foi pensada e organizada por Aracy
Amaral e Paulo Portella Filho.
Tantas mostras de arte reúnem obras mais ou menos heteróclitas e atraem o público
graças a algum nome mais conhecido. São comandadas por
concepções superficiais, submetidas à tirania do marketing.
Esta, ao contrário, é exemplar. Resultado de pesquisa séria e inteligente, revela episódios esquecidos e obras muito
belas. Grande é o prazer de estar naquelas salas harmoniosas, descobrindo telas sedutoras e personalidades artísticas
excepcionais.
Tudo parte dos poucos meses que Foujita passou no Brasil, entre 1931 e 1932. Nesse
momento, o pintor tinha imensa celebridade.
Formado no Japão, onde
nasceu, foi a Paris, misturou-se
à vanguarda cosmopolita de
Montparnasse, ao lado de Modigliani, de Soutine. Sua arte
mostra um aspecto característico, liso, precioso, de porcelana. Nela serpenteia a linha flexível, elegante. É habitada pela
harmonia fria de cores pálidas.
Há algo de fantasmal em suas
figuras melancólicas, em suas
crianças, em seus gatos.
Foujita foi vítima de um
enorme sucesso mundano e da
sedução imediata que suas
obras provocam, coisas que as
poses intelectuais não perdoam. Hoje, está mais esquecido do que deveria. Mário de
Andrade, em seu radicalismo
nacionalista, viu na arte que
Foujita expunha por aqui um
abandono das tradições japonesas e o culpava de traição à
sua "raça".
A mostra do CCBB reúne
obras que ele fez no Brasil.
Há um conjunto restrito,
mas significativo, de maravilhosos desenhos. A tela "As
Três Gerações" tem um caráter
inquietante, próximo da nova
objetividade, movimento criado pela vanguarda alemã nos
anos de 1920.
Envelopes
Kaminagai veio ao Brasil
com carta de recomendação escrita por Foujita. Ficou 14 anos
pintando paisagens fortes. Fabricou molduras de beleza requintada, que a mostra pôs em
evidência.
Jorge Mori é um paulistano
de origem japonesa. Kaminagai
recomendou-o numa carta para Foujita quando Mori foi a
Paris em 1952 para uma longa
estada de 26 anos.
Bossa
Os casos de crianças-prodígio na música são freqüentes,
mas raros na pintura. O auto-retrato de Jorge Mori que data
de 1944 deixa qualquer um estatelado. Difícil se convencer
de que aquele menino com jeito
altivo, de 11 anos, tenha produzido uma pintura tão fenomenal. Há nela sinceridade, energia, domínio maduro e sem hesitação do ofício. A "Ponte Velha sobre o Rio Pinheiros", a
"Alfaiataria", ambas de 1945,
deveriam freqüentar as páginas
das histórias da arte no Brasil.
Técnico perfeito, Mori copiou
admiravelmente um Uccello, a
"Batalha de San Romano". Ela
pertence ao Masp, mas, pena, é
pouco exposta ao público.
Nota triste
O professor Luiz Dantas, da
Unicamp, morreu no domingo
passado. Teria gostado muito
dessa mostra consagrada a
Foujita, Kaminagai e Mori.
Com sua cultura fina e aristocrática, conhecia a arte japonesa em profundidade. Colaborou
várias vezes com a Casa Brasil-Japão.
Luiz Dantas estudou e preparou os manuscritos de um livro
até então inédito de Aluísio
Azevedo, "O Japão", que o
grande escritor redigiu quando
era cônsul do Brasil naquele
país. Publicado por Roswitha
Kempf, esgotado há muito, é
obra expressiva que pede urgente reedição.
jorgecoli@uol.com.br
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