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UMA NOVA ERA
O lança-chamas
EUA PODEM LANÇAR MÃO DE PODERIO MILITAR PARA REFREAR QUEDA,
DIZ GLÁUCIO SOARES, ENQUANTO DOMINAÇÃO ECONÔMICA
MIGRARÁ PARA A ÁSIA EM 2050,
DIZ JOÃO PAULO DOS REIS VELLOSO;
JÁ PARA MARCO VILLA, BRASIL SERÁ HEGEMÔNICO NO ATLÂNTICO SUL
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Uso do poderio militar pode ser a contrapartida da crise econômica e financeira
Everett Kennedy Brown - 16.set.08/Efe
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Menino brinca diante de unidade do Lehman Brothers em Tóquio, na terça, dia seguinte ao anúncio da concordata do banco
GLÁUCIO SOARES
ESPECIAL PARA A FOLHA
As notícias sobre o
declínio e até o colapso dos EUA provocam alguns pensamentos. Não é a
primeira vez que se coloca o
fim da hegemonia americana
em pauta. Parte importante do
problema deriva de tomarmos
o fim da Segunda Guerra como
ponto de partida.
Foi o ponto mais alto, quando os EUA chegaram a ser responsáveis por mais de metade
da produção industrial mundial. Esse ponto de partida foi
"naturalizado" e se tornou uma
referência habitual.
Porém, foi um momento artificial, no qual os principais
concorrentes dos EUA -Alemanha, França, Reino Unido,
Japão e a então União Soviética- sofreram pesada destruição física. Parte da saliência
americana derivou da ausência
de competidores.
Como esperado, houve um
crescimento das economias
desses países, mais acelerado
em uns casos, menos em outros, que reduziu a preponderância dos EUA.
Seu declínio relativo provocou um choque de idéias. Uma
das variantes estava associada,
ironicamente, ao custo da
guerra e da própria hegemonia.
Em 1987, o assunto voltou à
ribalta. O historiador Paul
Kennedy publicou "Ascensão e
Queda das Grandes Potências"
(ed. Campus), que provocou
celeuma.
Nele, defendia a tese da "overextension": países "hegemônicos" tenderiam a ampliar territórios e áreas de influência, assumindo compromissos, sobretudo militares, que terminariam conspirando contra sua
própria hegemonia, sobretudo
econômica.
Esticando o argumento, alguns adeptos de Kennedy postularam que os EUA não deveriam ter participado tão intensamente da Guerra Fria, deixando que o expansionismo da
União Soviética a levasse à autodestruição. Claro, a direita
americana definiu Kennedy
como "liberal" -que, no linguajar político americano, significa esquerdista.
Dois anos depois, Francis
Fukuyama publicou o artigo "O
Fim da História" (1989), que
representava a resposta do ufanismo americano, em tom nada moderado, após o colapso
político da União Soviética.
Fukuyama, é bom lembrar,
era um alto funcionário do Departamento de Estado e tinha
sido analista da conservadora
Rand Corporation.
Muitos milagres
Desde o pós-guerra, muito
tem sido escrito e dito sobre esse ou aquele "milagre". Um dos
primeiros foi o "milagre alemão". A Alemanha teve duas
excelentes décadas, chegando a
crescer mais de 10% em alguns
anos. Mas o milagre acabou há
muito tempo, e o crescimento
econômico alemão anda próximo aos 2% anuais.
Enquanto o milagre alemão
esmaecia, surgia o japonês. Em
1965, o PIB nominal do Japão
era de US$ 91 bilhões. O Japão
cresceu tão rapidamente que,
15 anos mais tarde, ultrapassou
US$ 1 trilhão.
Passamos a falar em "milagre
japonês", e o Japão passou a ser
visto como o país competidor
dos EUA e talvez a potência hegemônica do futuro. O perigo,
agora, eram os Toyotas, os
Hondas, a Sony etc.
Livros foram escritos, inclusive sobre a melhor administração das empresas japonesas,
e políticas foram alteradas.
O então presidente Bill Clinton, em discurso e ação, reorientou a economia americana,
abandonando o "rust belt", industrial, e apoiando a política
do Vale do Silício, de serviços
muito qualificados. Industrialmente, não dava para competir
com os japoneses. Deu certo, e
os EUA voltaram a crescer.
E o Japão? Os anos 90 foram
chamados de "a década perdida"; a partir dela, a economia
parou de crescer rapidamente,
chegando a estagnar. Mais um
milagre chegava ao fim.
Os milagres da vez são o chinês e o indiano. As expectativas
são semelhantes: vão durar e
comprometer a liderança econômica americana. Os dados
sobre outros milagres são mais
pessimistas.
O terceiro milênio confirmou um novo panorama, com
um número maior de atores
economicamente significantes.
Contradição viva
A esquerda afirma que o imperialismo americano vive do
complexo militar; ironicamente, a economia americana sobe
e desce com as políticas de seus
presidentes, mas na direção
oposta à prevista pela esquerda, recuperando a credibilidade
da tese de Paul Kennedy.
Clinton reduziu os gastos militares, o que lhe permitiu equilibrar o orçamento e reduzir o
déficit fiscal. Em seus dois
mandatos houve prosperidade,
com as associadas reduções no
desemprego, na violência e na
criminalidade.
Porém essas políticas -e
suas conseqüências benéficas-
foram substituídas por políticas econômicas e sociais regressivas e um retorno ao militarismo. As guerras no Afeganistão e no Iraque e os cortes de
impostos dos mais ricos devastaram a economia americana.
Se os ataques do 11 de Setembro justificaram a primeira, a
segunda permanece sem nenhuma justificativa, a despeito
de incalculável custo humano.
Os EUA, hoje, vivem a contradição de sofrerem a crise
econômica e financeira mais
séria em oito décadas e serem
uma potência militarmente hegemônica.
Não há país que se aproxime:
os gastos militares americanos
correspondem a cerca de 45%
do total (dados de 2007), seguidos, de longe, por Reino Unido,
China, França e Japão, com
perto de 5% cada. A disparidade é muito grande: os EUA gastam nove vezes mais do que o
segundo colocado.
O medo de muitos é que a
próxima administração americana tente resolver militarmente a crise econômica e financeira.
Os EUA afundarão mais, levando junto a paz mundial e
muitos povos.
GLÁUCIO SOARES é sociólogo e pesquisador do
Instituto Universitário de Pesquisas do RJ.
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