São Paulo, domingo, 21 de novembro de 2004

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Papéis foram apreendidos em 1985

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os documentos e objetos que resgatam parte da obscura história de Josef Mengele foram apreendidos pela Polícia Federal em 1985 na residência do casal Bossert, no bairro do Brooklin (SP), e na pequena casa onde viveu até 1979, na Estrada do Alvarenga, perto da represa Billings.
Pistas levantadas pela polícia alemã na época identificaram os Bossert como a referência de Mengele no Brasil, do que surgiu a investida da PF e o inquérito para apurar "a responsabilidade criminal de Liselotte Bossert, Wolfram Bossert, Geza J. Stammer e Gitta Stammer, em razão de haverem dado apoio de homizio [esconderijo] ao criminoso de guerra Josef Mengele".
O auto de instauração do inquérito, presidido pelo delegado da PF Marco Antonio Veronezzi, também atribui a Liselotte a prática dos crimes de falsidade ideológica e uso de documento falso por ter registrado na certidão de óbito de Mengele, em 1979, dados de Wolfgang Gerhard. Austríaco, Gerhard, que saiu do Brasil em 1975, era um dos articuladores da rede mundial de proteção aos nazistas. Ele entregou os próprios documentos (carteira de identidade, de trabalho e motorista) a Mengele, que apenas trocou as fotografias originais pelas suas, o que chamava a atenção, pois ele era 14 anos mais velho que Gerhard.
Em 1979, quando morreu afogado em Bertioga, Mengele foi enterrado no jazigo da família Gerhard, no Embu. Segundo a polícia alemã, o verdadeiro dono dos documentos usados pelo nazista morreu em 16 de dezembro de 1978 e foi enterrado em Graz, na Áustria.
O inquérito, que revelou o destino do criminoso foragido desde 1945, foi arquivado em 92, com a assinatura do juiz João Carlos da Rocha Mattos (hoje preso, acusado de corrupção e formação de quadrilha). "A investigação foi até fácil, [um trabalho] mais de perícia. O que me impressionou foi a repercussão. Alguns pesquisadores estrangeiros chegaram a contestar o fato", diz Veronezzi.
A polêmica em torno da descoberta histórica terminou com a realização de um exame de DNA feito pelo filho de Mengele, Rolf, com o qual foi possível comparar seus genes aos encontrados na ossada exumada em 1985. O teste confirmou existir 99% de coincidência entre a composição genética de Rolf e de Mengele.
Em regra, documentos e objetos relacionados a um inquérito devem ficar, assim como a papelada, sob a custódia da Justiça. Se alguém os reclamar, podem ser devolvidos; se não, viram cinza. No caso Mengele, não aconteceu nem uma coisa nem outra. Os pertences foram encontrados em outubro, guardados em duas caixas de papelão no 10º andar da Superintendência da PF em São Paulo, no Setec (Setor Técnico Científico), em bom estado de conservação.
O achado se deu durante um processo de correição -espécie de auditoria em cerca de 10.000 inquéritos- que está em curso em São Paulo. "Os cuidados que tomamos para garantir as provas e elucidar possíveis dúvidas acabaram garantindo o resgate de uma parte da história da humanidade", afirma o perito criminal Luiz Alves, chefe do Setec. (AM)


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