São Paulo, domingo, 22 de fevereiro de 2004

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O diretor do Museu de Arte Moderna de Nova York fala sobre o avanço da arte como espetáculo e das formas de financiamento de instituições públicas e privadas

"Somos o melhor museu do mundo"

Raquel Garzón
do "El País"

Alto, muito alto, vestido com um terno impecável, Glenn D. Lowry, 49, diretor do Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), concedeu esta entrevista num dos salões do hotel Ritz, em Madri, horas antes de participar de um debate na fundação Arco. Lowry está à frente do MoMA desde 1995. É o sexto diretor desse "monstro sagrado" inaugurado em 1929, que possui a mais completa coleção de arte do século 20: 100 mil obras -entre pinturas, esculturas, desenhos, gravuras, fotografias e objetos de design. Coerente com a sua visão de um MoMA para o século 21 e da "crescente complexidade da arte contemporânea", Lowry conduziu o ambicioso projeto de ampliação e remodelação da sede do museu em Manhattan, fechada para o público há cinco anos [desde 2002, o museu funciona em sede provisória, no Queens].
A reabertura do museu renovado (que custou US$ 858 milhões) está prevista para o final deste ano e início de 2005, coincidindo com o 75º aniversário da instituição. Mas, mesmo com as portas fechadas, "o MoMA continua comprando arte", esclarece Lowry. "Estamos no mercado, como sempre, colecionando arte contemporânea dos últimos 20 anos, de forma muito agressiva." Além de comprar, o MoMA viaja: 200 obras de sua coleção permanente poderão ser vistas a partir desta semana na Neue Nationalgalerie, em Berlim.

A Europa debate como financiará seus museus no futuro. O modelo europeu, público, contrapõe-se ao americano, que favorece a autogestão e o mecenato. Na sua opinião, quais as vantagens e desvantagens desses modelos?
Nenhum sistema é perfeito. Ontem estive no Prado, admirando esses pequenos e belos guias vendidos por 1 euro: sucintos, em vários idiomas, bem escritos. Num museu financiado com capitais privados, é impensável fazer algo parecido. Os custos seriam proibitivos. É um exemplo do que uma instituição estatal pode fazer ao patrocinar a arte, tornando-a acessível a um público de massa. O capital privado é menos complicado de arrecadar, mas impõe muitas restrições, pois nos obriga a lidar com centenas de indivíduos que querem dizer como a instituição deve ser dirigida.
Na Europa, é só com o governo que se deve negociar, o que implica um só problema. Quando essa negociação termina, começa-se a trabalhar. Nós lidamos com problemas financeiros ao longo dos 365 dias do ano. Não acredito em sistemas de uma perna só. A Europa deve buscar maneiras de atrair o dinheiro privado, e eu tenho de tentar fazer com que o governo nos apóie.
Essa estratégia basta para arrecadar dinheiro para as artes visuais num contexto de crise econômica?
A estratégia para financiar uma instituição como o MoMA é, na realidade, muito simples. Não tem nada a ver com o dinheiro, e sim com o projeto do museu. Se você tem o mais importante acervo do mundo, pode oferecer ótimas mostras e então será capaz de atrair capitais, tanto públicos como privados.
Mas há quem afirme que, para sobreviver, os museus devem aproximar-se do espetáculo. O que o sr. acha desse debate?
Eu penso exatamente o contrário. Acho que o esforço consciente e contínuo de assemelhar a arte ao espetáculo acarreta um grande risco: competir não contra outros museus, e sim contra a indústria do espetáculo. Uma luta que os museus não têm como ganhar. O entretenimento tem a ver com distrair o sujeito e fazê-lo pensar em outra coisa. Os museus têm a ver com a educação e a experiência. Sua sobrevivência dependerá de sua capacidade de se diferenciar do espetáculo, de deixar bem claro que as obras de arte são objetos poderosos, que preservam sentimentos e idéias únicos, que não podem ser experimentados em outros âmbitos.
A especialidade do MoMA é a arte moderna e a contemporânea. Haverá uma ruptura entre esses conceitos?
Potencialmente, sim. Vista retrospectivamente, a pós-modernidade aparece como uma discussão dentro da grande família da arte moderna. Artistas que praticaram uma pós-modernidade irônica e crítica, como David Salle ou Jeff Koons, questionaram nossa idéia da arte moderna, mas não passaram disso. Haverá uma ruptura, mas ela ainda não ocorreu.
Que influência a abertura de novos museus, como o de Tóquio, teve sobre o MoMA?
Velho ou novo, o museu que tem uma coleção histórica deve preservá-la e interpretá-la. Gertrude Stein disse certa vez que um museu pode ser moderno ou ser museu, mas não as duas coisas, supondo que o peso da coleção impede o museu de manter contato com a arte de seu tempo. A história do MoMA foi um esforço para provar que ela estava enganada.


Tradução de Sergio Molina.


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