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O príncipe contra-ataca
Herdeiro do trono brasileiro e membro da TFP,
dom Luiz de Orleans e Bragança critica
historiadores por "denegrirem
a imagem" da nobreza
DA REPORTAGEM LOCAL
Não foram só os antichavistas que
acharam merecido
o "por que não te
calas?" endereçado pelo rei espanhol Juan Carlos ao presidente venezuelano.
Numa grande, porém discreta, casa no bairro do Pacaembu
(São Paulo), onde funciona a
sede da Casa Imperial do Brasil, dom Luiz de Orleans e Bragança, 69, viu no episódio um
bom sinal.
"A repercussão mundial da
fala do rei mostra o carisma
que a monarquia ainda possui.
Chávez é um demagogo mal-educado, mas, quando apareceu o rei da Espanha, com séculos de tradição atrás de si, ele
se sentiu inibido", disse, em entrevista à Folha, na sala decorada com brasões do império.
O príncipe herdeiro da coroa
brasileira é um homem de traços europeus e membro da
TFP (Sociedade Brasileira de
Defesa da Tradição, Família e
Propriedade), instituição ultraconservadora católica.
Dom Luiz é bisneto da princesa Isabel e trineto de dom
Pedro 2º. Nascido na França,
para onde a família real foi
obrigada a se exilar por ter sido
banida pela República, veio ao
Brasil pela primeira vez quando já tinha 7 anos.
"Lembro-me como se fosse
hoje. Foi durante a Segunda
Guerra Mundial, e me recordo
das pessoas no navio comemorando quando o Japão pediu a
paz. Quando cheguei ao Rio,
havia uma névoa, e só se podiam ver nesgas do Pão de Açúcar. E eu, que até então me sentia totalmente em casa na
França, pensei: "Aqui nós temos uma missão"."
Imbróglio sucessório
A questão da sucessão do trono brasileiro é bastante controversa. Aquele que seria o herdeiro direto da coroa depois da
princesa Isabel deveria ter sido
seu primogênito, dom Pedro de
Alcântara.
Porém, ao decidir casar-se
com uma mulher que não pertencia a uma casa reinante da
Europa, ele foi levado a renunciar ao título, que passou automaticamente a seu irmão mais
novo, dom Luiz (avô do atual
príncipe).
Os descendentes de ambos
passaram a formar então dois
ramos, o de Petrópolis e o de
Vassouras, que nunca se entenderam muito bem com relação
ao assunto.
O atual chefe da casa de Petrópolis, dom Pedro Gastão,
alegou que a renúncia não era
válida, por ter sido pedida depois da Proclamação da República. Já o ramo de Vassouras,
atual detentor do título, defende-se com o argumento de que
a decisão de Alcântara não pode ser revertida.
Bem mais conservador que a
linhagem de Petrópolis -à qual
pertence, por exemplo, o festeiro e parlamentarista dom João,
de Paraty-, o ramo de Vassouras dedica-se à divulgação da
causa monarquista e à arregimentação de defensores do regime pelo país.
Em 1987, durante a Assembléia Nacional Constituinte,
dom Luiz escreveu cartas aos
parlamentares brasileiros para
pedir o fim da cláusula pétrea,
que dizia que não podia ser colocada em discussão a forma republicana de governo. "Eu defendia que a cláusula era sumamente contrária aos princípios
democráticos que os próprios
parlamentares diziam professar. Afinal, era uma injustiça
permitir que o Partido Comunista existisse e não permitir a
existência dos monarquistas."
Já em 1993, quando houve o
plebiscito para decidir entre os
três sistemas -presidencialista, parlamentarista e monarquista-, dom Luiz e seus irmãos se engajaram na luta por
este último. Sem considerar o
anacronismo de sua posição, o
príncipe segue convencido de
que a monarquia tinha chances
de vencer naquela ocasião.
"Tivemos 13% dos votos válidos, e isso sem ter acesso aos
meios de comunicação, como
acontece com os partidos. Não
pudemos aparecer no horário
político, e o plebiscito foi apresentado à sociedade muito
mais como uma escolha entre
parlamentarismo e presidencialismo. Se tivéssemos tido espaço, o resultado certamente
teria sido outro."
Para ele, a forma ideal para o
Brasil seria uma monarquia
constitucional parlamentar.
"O ideal seria que o regime tivesse algo de monárquico, algo
de aristocrático e algo de democrático, com um Senado vitalício, uma Câmara de deputados
eleita a cada quatro ou cinco
anos, um Judiciário e um Legislativo independentes e um Executivo exercido por um primeiro-ministro, indicado pelo soberano, de acordo com a maioria parlamentar do momento.
Além do Poder Moderador, que
era algo genial que nossa Constituição do império tinha e que
depois outros países, como a
França, quiseram copiar", diz.
Reescrever a história
Dom Luiz é também um entusiasta defensor das iniciativas de dom João 6º.
"É preciso reforçar que dom
João 6º não saiu fugido do Brasil, nem que era um bobalhão,
como se diz hoje. As pessoas
também falam que era um sujeito indeciso, mas a verdade é
que era um tipo tranqüilo, que
tocava as coisas com muita esperteza. Foram impacientes
com ele. É verdade que não era
um homem bonito, não podia
ser considerado um Adônis,
mas até aí..."
Na comemoração dos 200
anos da vinda da família real,
dom Luiz diz que gostaria de
ser ouvido e que se pensasse em
reescrever os livros escolares
de história. "Houve uma campanha sistemática para denegrir nosso passado imperial e os
grandes vultos desse período.
Depois vieram os marxistas,
que, com sua visão dialética, só
vêem a luta de classes, e nunca
a paz."
(SYLVIA COLOMBO)
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