São Paulo, domingo, 26 de junho de 2005

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Representação

RENATO LESSA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Dá-se por suposto que o princípio da representação política decorre de problemas de escala. O gigantismo dos eleitorados, a extensão dos territórios e a complexidade da agenda pública tornariam impraticável uma organização política fundada na participação direta dos cidadãos. O curioso é que tal princípio foi inventado e desenvolvido quando os eleitorados eram ainda diminutos, o que faz da suposição algo aparentado a uma superstição.
Para James Madison, um dos clássicos na matéria, o "esquema da representação" é o que distingue a idéia moderna de república da de democracia. Mais do que um desdobramento natural do princípio clássico da soberania popular, a representação é um artifício pelo qual poucos e bons falam pelos muitos e não tão bons assim. Ela, na verdade, é um filtro, cuja principal finalidade é a de reduzir os impactos possíveis da potência da "multidão" sobre a ordem política.
O que resulta da operação de tal filtro é o que, de forma mais apropriada, deveríamos designar como governo representativo. As democracias realmente existentes são regimes nos quais eleitorados coextensivos à população adulta fazem-se representar por meio de mecanismos eleitorais. Se levado a sério, o desenho indica que a relação crucial é a que se estabelece entre representantes e representados, no sentido de torná-la mais densa e genuína.
O pior cenário para o governo representativo é o da redução da representação a um mecanismo no qual os representantes representam-se a si próprios e no qual a relação mais significativa é a que se estabelece entre os mesmos e o governo. Qualquer analogia com os dias que correm não será acidental.


Renato Lessa é professor de teoria política no Iuperj.


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