|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Representação
RENATO LESSA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Dá-se por suposto que o
princípio da representação
política decorre de problemas de escala. O gigantismo dos eleitorados, a extensão dos
territórios e a complexidade da
agenda pública tornariam impraticável uma organização política fundada na participação direta dos cidadãos. O curioso é que tal princípio
foi inventado e desenvolvido quando os eleitorados eram ainda diminutos, o que faz da suposição algo
aparentado a uma superstição.
Para James Madison, um dos clássicos na matéria, o "esquema da representação" é o que distingue a
idéia moderna de república da de
democracia. Mais do que um desdobramento natural do princípio clássico da soberania popular, a representação é um artifício pelo qual
poucos e bons falam pelos muitos e
não tão bons assim. Ela, na verdade,
é um filtro, cuja principal finalidade
é a de reduzir os impactos possíveis
da potência da "multidão" sobre a
ordem política.
O que resulta da operação de tal filtro é o que, de forma mais apropriada, deveríamos designar como governo representativo. As democracias realmente existentes são regimes nos quais eleitorados coextensivos à população adulta fazem-se representar por meio de mecanismos
eleitorais. Se levado a sério, o desenho indica que a relação crucial é a
que se estabelece entre representantes e representados, no sentido de
torná-la mais densa e genuína.
O pior cenário para o governo representativo é o da redução da representação a um mecanismo no
qual os representantes representam-se a si próprios e no qual a relação
mais significativa é a que se estabelece entre os mesmos e o governo.
Qualquer analogia com os dias que
correm não será acidental.
Renato Lessa é professor de teoria política
no Iuperj.
Texto Anterior: Fernando Abrúcio: Reforma política Próximo Texto: Leonardo Avritzer: Tucanato Índice
|