São Paulo, domingo, 27 de setembro de 1998

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NOVOS AUTORES - FICÇÃO

O vazio da ação

BERNARDO AJZENBERG
Secretário de Redação

O que torna interessante o romance "A Educação pela Espada", estréia do paulistano Antonio Sampaio Dória, é a ação. Ação entendida filosoficamente e, também, como chave narrativa.
O enredo é secular: jovem atormentado por crise existencial, ameaçado pelo desemprego e desajustado com namoradas sai em busca de um oráculo, uma filosofia que o ajude a matar todos os coelhos numa só cajadada; encontra-o na figura de um professor de caratê, com o qual, conforme a tradição do gênero discípulo-mestre, estabelece uma relação de ódio e admiração.
A ação se mostra o elemento essencial da pregação de Tadashi Watai, o dito professor, e o livro permite-nos, assim, entrar em contato crítico com vertentes da chamada filosofia oriental e outras, mais ou menos devotas do misticismo; acompanhar treinos de caratê e ver de perto como funciona o setor de Controladoria de uma empresa de informática.
Dória aplica o princípio da ação -assim como seu personagem- na técnica utilizada para narrar os episódios. Eles então se sucedem com rapidez aos olhos do leitor, sem que este se dê conta de estar avançando as páginas e se envolvendo nos dramas de certa juventude paulistana do início dos anos 90 como quem vê televisão ou se depara com um painel eletrônico numa esquina.
Parágrafos curtos, troca constante de ambientes, alternância de cenários, capítulos de tamanhos quase idênticos, muito diálogo -o autor adota, com efeito, as fórmulas apropriadas para tornar ágil e fácil a leitura.
Aí entra, porém, aquilo que torna o livro de Dória não apenas interessante, mas também frágil. É o vazio. Vazio no sentido de que ao final ficamos na verdade sem entender muito bem a tal filosofia do mestre Watai -a não ser que ela se reduza, o que não parece ser a intenção do autor, a um mero instrumento para uma absolutamente inverossímil e ingênua batalha pelo poder dentro de uma empresa.
Vazio também no que se refere à construção dos personagens, em particular do protagonista (narrador em primeira pessoa, cuja ausência de nome, enquanto todos os outros personagens o têm, expressa o lapso), o qual acabamos por não saber exatamente de que farinha é formado. Sua crise é difusa.
Vazio nos diálogos, principalmente naqueles entre namorado e namorada: inúmeras sequências de indagações bobocas, para lá de ocas e cansativas.
Ou, por fim, em passagens altamente filosóficas (com perdão pela ironia), como esta: "Seguimos andando, subimos degraus amarelos e fiquei contando os degraus. Diante do cinema, surgiu a questão. Que filme veríamos? O filme romântico ou o filme de ação, anunciado agressivamente por toda a cidade? O conflito estava armado" (Oh!).
Sampaio Dória tem habilidade narrativa evidente, escreve de modo leve e agradável para a leitura; economiza digressões; sabe deter a atenção do leitor ávido por um bom entretenimento. Mas falha no recheio. Ao contrário do que acontece com o personagem principal, falta-lhe encontrar um caminho, na própria literatura, que dê mais consistência a essa ação autoral.

A OBRA

A Educação pela Espada - Antonio efinitiva"), Sampaio Dória. Ed. Ysayama (r. Ferreira de Araújo, 307, CEP 05428-000, SP, tel. 011/212-0884). 321 págs. R$ 20,00.



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