São Paulo, domingo, 27 de outubro de 2002

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Palavra-chave

por Armando Freitas Filho

Esta chave não é de puro ferro.
Mas tem inesperada ferocidade
que os dentes escuros escondem.
Seu peso espesso, não é nítido do chumbo
nem do níquel, mas de algum minério obscuro.
Perdida da fenda do metal da sua fechadura
e da mão, cega, que a tenta encontrar
no molho, no meio das outras
tão práticas perfeitas para todas as portas
exatas para sempre.

O encaixe desta chave não
se corta a priori: seu ajuste
se molda a partir da febre
que o instante forja -fugaz.
Não se faz cópia, do que não se funde
nem memoriza o fecho, a nuvem cinzenta
do seu segredo volátil: ela então
se perde completamente, amnésica
isolada, imperfeita, inútil,
no fundo da gaveta, do pensamento
até que a imaginação refaça
em outra liga de duração semelhante
sua imagem de uso e magia.


Armando Freitas Filho (1940) é autor de "Máquina de Escrever - Poesia Reunida e Revista", livro que será publicado pela ed. Nova Fronteira e de que faz parte este poema.



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