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12 MESES & 6 DESTINOS
EUA estão em busca de sócios
A tendência
das elites americanas é considerar
a nação mais poderosa do mundo em declínio
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GILBERTO DUPAS
ESPECIAL PARA A FOLHA
A hegemonia norte-americana está em
declínio? Os grandes desafios da regulação financeira,
do clima, do tráfico de drogas e
do terrorismo são de natureza
global e exigem a construção de
amplos consensos e parcerias.
No entanto esses caminhos
estão severamente limitados
pela perda de capacidade regulatória da grande potência
mundial e das instituições internacionais.
A crise atual tem muito a ver
com o mundo vivendo acima
dos seus meios. A era da abundância em recursos naturais já
havia terminado. Mais alguns
passos errados e a degradação
ecológica será irreversível.
Como conseguir uma mudança radical no modelo de
produção, com a redução do
consumismo desenfreado e do
sucateamento, se os grandes
atores econômicos têm total liberdade de definir seus vetores
tecnológicos?
Alguém acredita que o próprio mercado se auto-regulará?
O colapso do sistema financeiro pode gerar uma nova era de
controle do lado perverso do
capitalismo global?
A questão é que ele odeia regulações, maximiza seus lucros
operando nas faixas cinzentas
e adora socializar prejuízos.
De fato, o mundo não pode
prescindir das virtudes hegemônicas de sua maior potência.
A maior delas é favorecer a
governabilidade internacional
mediando crises e confrontos e
possibilitando gestos simbólicos em direção às nações mais
precárias -o oposto do que
George W. Bush fez. Se os EUA
não assumirem um papel sólido e confiável de referência sistêmica da força e da lei, condizente com o seu próprio poder,
teremos grandes probabilidades de um século marcado por
dores e retrocesso.
Tolerância é um atributo essencial ao exercício da soberania. Na doutrina Bush, tolerância era a permissão para "continuar vivendo desde que se obedeçam nossas regras".
Mas o exercício da paz exige
a aceitação da alteridade, incluindo as minorias e os diferentes. As necessárias alterações de estruturas e equilíbrios
de poder irão exigir muito de
Obama, tido como analista frio
e construtor de consensos.
Ascensão e queda
A tendência das elites americanas é considerar a mais poderosa nação do mundo em declínio. General Brent Scowcroft
[assessor de segurança dos presidentes Gerald Ford e George
Herbert Walker Bush, pai do
atual presidente dos EUA]: "O
exercício do nosso poder nos
revelou que ele é efêmero".
Fareed Zakaria [analista de
política internacional]: "Os
anos Bush foram o apogeu do
poder americano". E Richard
Haass [presidente do Conselho
de Relações Exteriores, nos
EUA] : "O momento unipolar
dos EUA se foi."
No entanto, gostemos ou
não, teremos que continuar vivendo com a hegemonia norte-americana. Salvo crise político-social de grandes proporções
na China, a estagnação dos próximos anos trará definitivamente uma mudança de patamar no seu poder. Mas nada para ameaçar a posição dos EUA.
Com a China crescendo a 6%,
Europa e Japão estagnados e
americanos a passo de cágado,
em cinco anos os chineses terão
um PIB de quase US$ 5 trilhões, ultrapassando largamente a França, a Inglaterra e a
Alemanha e igualando-se ao
Japão, transformando-se na
segunda maior economia do
mundo.
Só que os EUA estarão com
US$ 15 trilhões, três vezes mais
do que a China!
Do "voamos mais alto e sabemos o que é melhor para o
mundo", de Madeleine Albright [secretária de Estado na
era Clinton], ao "quem não está
conosco, está contra nós", do
fundamentalista Donald
Rumsfeld [secretário de Estado
nos tempos de George W.
Bush], houve uma escalada
imensa da hegemonia em direção a uma quase tirania.
O que agora o mundo espera
como frase emblemática de Hillary Clinton é "Os EUA precisam de sócios". Precisamos cobrar daquele país o exercício de
uma hegemonia que leve a consensos multipolares, aliviando
tensões mundiais e gerando
condições de governabilidade
sistêmicas.
Assim Obama poderá ter boa
parte do mundo como sócia.
GILBERTO DUPAS é coordenador geral do Grupo de Conjuntura Internacional da USP e autor
de "O Mito do Progresso" (ed. Unesp).
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