São Paulo, domingo, 30 de abril de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

+ cinema

Dois novos livros buscam explicar o relacionamento entre grandes estúdios e diretores independentes

Mocinhos e bandidos em Hollywood

TOM DEWE MATHEWS

Terá Hollywood finalmente virado uma página? Estarão os estúdios sendo inspirados por visões pessoais, mais que pela mera colheita de dólares? E a onda recente de filmes políticos significa que Hollywood está vivendo uma era de ouro que lembra os anos 70? Os autores destes dois livros respondem afirmativamente, em alto e bom som. Mas eles chegam a suas conclusões positivas sobre as perspectivas de Hollywood por meios muito diferentes.
Em "The Sundance Kids - How the Mavericks Took Over Hollywood" (Os Garotos de Sundance - Como os Pioneiros Tomaram Hollywood de Volta, Faber and Faber, 512 págs., US$ 17,33, R$ 37), James Mottram segue um caminho estético, argumentando, por meio da descrição de filmes geralmente de baixo orçamento, que os cineastas independentes não apenas tiveram sucesso em Hollywood como também fizeram os grandes estúdios aceitarem sua maneira de pensar.
Ele admite que hoje é quase impossível produzir um filme nos EUA, mesmo de baixo orçamento, sem a concordância dos estúdios, mas enfatiza que, dentro dessa restrição, muitas vitórias foram alcançadas por cineastas inovadores e adaptáveis. Infelizmente, porém, as desvantagens de descrever determinados filmes, mais que oferecer uma análise destrinchada do que é na realidade uma indústria, logo ficam aparentes.


Os filmes em si não valem nada; é em sua distribuição que as produtoras ganham dinheiro


À parte a questão sobre se diretores como Martin Scorsese, Francis Ford Coppola ou Robert Altman realmente chegaram a controlar Hollywood nos anos 70, a proposta bem-intencionada, embora não argumentada, de Mottram também se esvazia facilmente.
Mas também deve haver uma razão pela qual os grandes estúdios compram produtoras independentes, como a Miramax, e criam suas próprias filiais independentes, como a Fine Line, da Warner Brothers, ou a Buena Vista, da Disney.
Ben Dickenson, em contraste, abre mais seu "Hollywood's New Radicalism - War, Globalisation and the Movies from Reagan to George W. Bush" (O Novo Radicalismo de Hollywood - Guerra, Globalização e os Filmes de Reagan a George W. Bush, I.B. Tauris, 232 págs., US$ 26,95, R$ 57) e, como procura os motivos econômicos por trás da realização de bons filmes, é capaz de dar respostas a essas perguntas.

Batman e o videotape
Ele compara a relação custo-benefício de "Sexo, Mentiras e Videotape" com o maior sucesso de público de 1989, "Batman": o primeiro faturou US$ 21 para cada dólar gasto enquanto o super-herói teve um retorno de meros US$ 5. Seguindo a trilha do dinheiro, Dickenson revela uma estrutura de estúdios em que os "indies" são espremidos para fora do mercado. Os filmes em si não valem nada; é em sua distribuição que as produtoras ganham dinheiro.
Como 90% das bilheterias dos cinemas retornam ao estúdio-produtora, não é de surpreender que as distribuidoras prefiram exibir filmes independentes de baixo orçamento. Se a distribuidora for tentada por esses filmes, porém, os estúdios não lhe dão os grandes sucessos mais populares e geradores de receita.
Mas, felizmente, filmes politicamente engajados continuam sendo produzidos em Hollywood, e Dickenson é perspicaz sobre a rede de conglomerados em que os cineastas independentes têm de trabalhar. Os executivos dos estúdios, ele comenta, "nunca questionam a economia de mercado do sistema em que operam, mas em questões sociais eles estão muito à esquerda das corporações para as quais trabalham".
Daí a aparente condenação das ligações industriais-militares nos EUA em filmes da corrente dominante, como "Blade Runner", "Robocop" ou "Alien", enquanto o capitalismo corporativo permanece intocado. Crucialmente, porém, Dickenson mostra a relutância dos cineastas americanos em acreditar na organização coletiva, mais que na resistência individual à injustiça social. Em conseqüência, a eficácia política de Hollywood foi prejudicada.
Bem informado sobre um tema complexo, Dickenson faz um balanço preciso entre a política de Hollywood e os filmes políticos, mas no final do livro persegue sombras de celulóide ao tentar englobar filmes menos importantes em uma agenda polêmica.

Reduzir expectativas
Então já sabemos que a arte é incidental para um negócio voltado para os lucros, como os estúdios de Hollywood, e que não temos alternativa senão reduzir nossas expectativas, mas talvez ainda possamos acreditar no que diz o ator Bill Murray: "Os estúdios são muito sérios no que se refere a ganhar dinheiro, e isso não está errado. Mas não é preciso ganhar dinheiro da mesma maneira o tempo todo".
Onde encomendar
Livros em inglês podem ser encomendados, em SP, na livraria Cultura (tel. 0/xx/11/ 3170-4033) ou no site www.amazon.com

Este texto foi publicado no "Independent".
Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves.


Texto Anterior: + sociedade: Três por quatro do Brasil
Próximo Texto: Acadêmicos no camarim
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.