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TODO O TEMPO DO MUNDO
O crítico e curador do Masp aponta diferenças e semelhanças nas obras de Monk e Krajcberg
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TEIXEIRA COELHO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Meredith Monk
insiste sempre
numa idéia, que
repetiu durante
o bate-papo:
"Na maioria de minhas obras,
tento expressar uma sensação
de atemporalidade, uma sensação do tempo como um ciclo
recorrente". Nas obras de
Frans Krajcberg, a idéia é outra, oposta: "Há um tempo, o
tempo é este (o tempo desta
floresta pegando fogo) e ele não
vai voltar; o tempo já se esgotou, o resto é o fim".
Bem, não é exatamente a
obra dele que diz isso: é ele
quem o diz, com palavras.
Acessoriamente, o que diz isso são suas fotos. Há uma diferença sensível de categoria, de
qualidade, entre suas fotos,
também expostas na Oca, e
aquilo que ele mesmo chama
de suas esculturas.
As fotos mostram a coisa como ela é: a floresta pegando fogo, a destruição, o fim dos tempos. Suas esculturas mostram
coisa inteiramente distinta; a
rigor, mostram quase o contrário: a vida que retorna naquilo
que havia se consumido.
O homem e o vestígio
Suas esculturas são casos da
construção do belo, põem em
destaque a relação de um homem com um vestígio, um resquício da natureza (não digo de
um artista porque ele, por vezes, nega que aquilo seja arte,
embora outras vezes fale genericamente da arte como se ela
de fato existisse, e na qual acaba
se incluindo).
Suas obras são belas. Por vezes, o belo em pauta é de tipo
trágico (a tragédia é um caso do
belo). Outras vezes, é um caso
do belo simples, do belo direto
e puro. Suas fotos mostram o
mundo, suas esculturas mostram a arte.
Não há propriamente uma
contradição entre as fotos e as
esculturas na exposição.
Ele mesmo diz que as fotos
precisam estar ali para que as
pessoas vejam de onde suas esculturas vieram -ou, em todo
caso, e isso é mais correto, para
que entendam de onde o material de suas esculturas saiu.
Significa que ele sabe (se tem
consciência disso é outra questão) que suas esculturas jogam
numa outra dimensão, que
pouco (ou nada) tem a ver com
a situação que quer denunciar.
É nesse ponto que as obras
dos dois artistas na superfície
tão diferentes e tão distantes
um do outro, Krajcberg e
Monk, se tocam -é para esse
ponto que convergem (talvez o
mesmo ponto para onde convergem as obras de todos os
grandes artistas).
Etéreo
As obras de Krajcberg não
são elusivas, outra palavra que
ressurge sempre na fala de
Monk (ela ilustra, com palavras
e com as mãos, durante a conversa, como suas obras têm essa qualidade, como suas obras,
seu canto, seu corpo, evoluem
na direção de um desmanche,
de uma diluição).
As obras de Krajcberg não
são elusivas em si, mas aquilo a
que se referem (ou aquilo a que
o artista diz que se referem) é
tão etéreo quanto aquilo que
Monk busca.
Vanguarda clássica
A diferença entre ele e ela é
que Monk sabe que sua obra
não vai promover nenhuma
mudança imediata do mundo
(ela sabe que age no sentido de
buscar uma dessensibilização
e, em seguida, uma eventual
ressensibilização do espectador, nada muito além disso),
enquanto Krajcberg diz o tempo todo, com palavras, que as
pessoas precisam despertar,
que o tempo está acabando -o
que pressupõe que é isso o que
ele busca: uma mudança imediata, já que não há mais tempo.
Meredith Monk joga na vanguarda extremada, na vanguarda hoje clássica, opera sobre o
conceito (embora sua obra se
insira num tempo e num espaço bem concretos: essa é a vantagem da música).
Krajcberg, pelo contrário, explicita sempre seu referente,
como nas obras com fundas raízes na figura.
Mas um e outro -no caso de
Krajcberg, se as fotos forem
deixadas de lado- o que fazem
é expor relações do ser humano
com as coisas e, em particular,
com os seres humanos.
Nenhum dos dois, em suas
obras específicas, mostra o
mundo (ou então é que as fotos
são, para ele, mais que simples
informação). Para Monk, isso
não é um problema. Para Krajcberg, parece que é.
Caminhos e consciências à
parte, os dois são grandes artistas. Aí também se tocam.
No fim do bate-papo, foram
embora de braços dados, sorridentes -como se tivessem todo
o tempo do mundo.
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