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Minha história - Muhammad Yunus, Nobel da Paz

O senhor microcrédito

Nobel propõe que consumidores paguem US$ 3 a mais por produtos que tenham selo antiexploração do trabalho

TONI SCIARRETTA DE SÃO PAULO

Nasci em uma pequena aldeia do Bangladesh em 1940. Era uma família pobre com 13 filhos. Depois, nos mudamos para a cidade, meu pai abriu uma loja de joias e se tornou um pequeno empresário.

Cresci no meio dessa família, que me incentivou a ir para a escola. Continuei estudando e me formei economista na universidade de Dacca [capital do país]. Depois fiz mestrado e obtive uma bolsa para estudar nos EUA.

Lecionei nos EUA, poderia ter ficado por lá, mas sempre planejei voltar a Bangladesh. Pensava que poderia ser útil de alguma forma para as pessoas do meu país.

Sempre quis ser um professor universitário, mas acabei me envolvendo com o microcrédito. Emprestava dinheiro para mulheres, sem qualquer garantia, investirem nos pequenos negócios da família. A mulher administra a vida da família e é muito responsável com o uso do dinheiro.

Por trás dessa ideia, estava a construção do Banco Grameen [banco das aldeias].

Enfrentamos dificuldades de todos os tipos. Vivemos em um país muçulmano e a religião é uma questão muito sensível. Algumas pessoas interpretavam que emprestar dinheiro e cobrar juros era uma forma de exploração, que ia contra as leis do Corão.

Também achavam que emprestar dinheiro para mulheres era uma coisa destrutiva numa sociedade em que a mulher tem um papel recluso. Os homens não gostavam e perguntavam: por que estamos dando dinheiro para as mulheres deles? Estávamos fazendo uma coisa que muitos políticos diziam que era tarefa do governo.

Para responder aos questionamentos, fomos procurar exatamente o que dizia o Corão sobre empréstimos e mulheres. Procuramos exemplos históricos. Aos políticos explicamos que a ideia não era reduzir o poder nem a responsabilidade do governo, mas complementá-la.

Sempre tivemos oposição e enfrentamos calúnias.

As resistências foram aos poucos diminuindo porque as pessoas começavam a ver os benefícios conquistados.

Fiquei conhecido como o banqueiro dos pobres, mas o maior reconhecimento foi o Nobel da Paz, em 2006.

Foi um voto de que, bem aplicadas, as finanças promovem o entendimento e a paz.

Em 2010, fui convidado a sair do Grameen por estar velho demais [o BC determina aposentadoria aos 60 anos]. Contestei isso na Justiça, alegando que nosso banco não tinha essas regras. Mas a corte não aceitou o caso e eu saí. Há várias interpretações e não quero falar sobre isso.

Se no Brasil o microcrédito não teve tanto sucesso, talvez seja porque não tenha sido feito da forma correta. Não culpo o país nem o povo, mas a forma como foi feito. Deu certo na Guatemala, na Costa Rica, no México e na Colômbia. Talvez seja o juro alto, mas não conheço a operação e prefiro não comentá-la.

O Brasil é um país muito importante, que veio de baixo e tem a responsabilidade de mediar as discussões entre países ricos e pobres.

Hoje, eu me dedico aos negócios sociais que tratam de temas como pobreza, desemprego e danos ambientais.

As pessoas que trabalham com esses negócios devem perseverar vendo os resultados. O fato de querer ajudar as pessoas não faz dos profissionais menos interessados em ser bem pagos ou de ter um plano de carreira sólido.

Bangladesh teve uma tragédia neste ano. O prédio de uma fábrica têxtil caiu e matou mais de 1.100 pessoas. Não podemos deixar que essas fábricas se instalem em prédios que não são seguros.

Como uma pessoa pode usar uma camiseta que foi produzida nessas condições?

Por que não pagar um pouco mais e garantir com que esses trabalhadores tenham uma vida mais segura?

Estamos tentando aprovar um salário mínimo de US$ 0,50 por hora. Hoje, são US$ 0,25. Isso não custará muito mais para os consumidores. Talvez alguns produtos de US$ 60 custem mais US$ 3. Claro que temos de ter certeza de que esse dinheiro será direcionado a esse fim.

É aceitável que a empresa que respeite esses padrões mínimos de segurança no trabalha possa etiquetar seu produto ressaltando que ele foi feito sem usar trabalho escravo e sem explorar ninguém. Não é usar a pobreza como marca. É o símbolo de um comércio justo.


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