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Análise

EUA eram rottweiler contra México e Japão, mas com a China são labrador

É um enigma e um milagre que o protecionismo dos anos 1980 e 1990 não se repita desta vez

ARVIND SUBRAMANIAN ESPECIAL PARA O "FINANCIAL TIMES"

Boas notícias sobre economia mundial são raras. Quanto ao comércio, Pascal Lamy, diretor geral da Organização Mundial do Comércio, recentemente apontou mais de cem medidas protecionistas adotadas pelos membros do G20 nos últimos sete meses.

Mas o alerta não deve obscurecer o quadro mais amplo: a ausência de protecionismo sério nos países industrializados nos últimos dez anos, a despeito do impacto de um grande choque estrutural causado pelos emergentes, especialmente a China.

Esqueça as negociações bilaterais ou o lento progresso da rodada Doha. A história atual mais importante quanto à política comercial é outra --e ela representa tanto um enigma quanto um milagre.

As importações de produtos chineses saltaram de 0,5% da demanda interna dos EUA em 1990 para 5,2% em 2010. Mas excetuadas algumas medidas antidumping e a imposição de certas tarifas compensatórias, essa grande expansão não causou resposta protecionista significativa.

Duas comparações encontradas na história dos EUA podem ajudar a compreender a importância desse enigma.

A falta de protestos internos contra a China contrasta com o acalorado e acrimonioso debate travado nos EUA no começo dos anos 1990 quanto ao acordo de livre comércio com o México, o Nafta.

As medidas protecionistas concretas contra a China foram ainda insignificantes se comparadas à severidade contra o Japão nos anos 1980.

Em outras palavras, nos EUA o cão do protecionismo mal rosnou (contra a China), depois de latir furiosamente (no caso do México) e de morder forte (no caso do Japão).

O que complica ainda mais o enigma é o fato de que o choque chinês teve ordem de magnitude diversos graus maior que a ameaça do México ou Japão. Mas em lugar de um rottweiler furioso, temos agora um carinhoso labrador.

Existem diversas explicações. Uma delas é que, quando chegou o momento chinês, os EUA dispunham de poucos setores industriais com mão de obra de baixa qualificação e que pudessem concorrer diretamente com as importações de produtos chineses.

Por exemplo, o número de trabalhadores do setor têxtil caiu de 900 mil em 1990 a 150 mil em 2013. Portanto, os produtos mexicanos baratos daquela época representavam ameaça maior do que os produtos chineses baratos agora.

Outra possibilidade se relaciona à natureza do comércio e ao poder do parceiro. O comércio com o Japão era muito diferente do com a China.

O primeiro oferecia concorrência direta em setores específicos como a siderurgia, automóveis e semicondutores. O comércio com a China, por outro lado, tem chineses exportando produtos fabricados por operários de capacitação relativamente baixa.

Quando seus lucros se viram ameaçados pelas empresas japonesas, as companhias americanas dotadas de enorme influência sobre o processo político contra-atacaram, com sucesso, exigindo medidas protecionistas.

Em contraste, Pequim cooptou ou reduziu a força dos protestos das companhias ao encorajá-las a investir diretamente na China. Como resultado, as ações comerciais contra o país contavam com oposição delas, que tinham interesses no grande, e crescente, mercado chinês.

Por último, desde que o comércio com a China começou a crescer, o governo dos EUA promoveu US$ 15 bilhões em transferências, em seguro desemprego, aposentadorias, pensões e benefícios de saúde. Isso pode ter atenuado a resposta protecionista.

É possível que formas nebulosas de protecionismo estejam emergindo, como alertou Lamy. Mas o quadro mais amplo oferece alguns motivos para tranquilidade.

Se a política interna dos EUA é capaz de sobreviver a um choque comercial tão grande quanto o sofrido com a China --e se é improvável que a experiência chinesa se repita--, talvez tenhamos motivos para otimismo quanto ao futuro do comércio.


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