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Mario Mesquita

Proteção sistêmica

Esse é um tema delicado e que merece ser objeto de deliberação cautelosa e profunda no Legislativo

A opinião pública invariavelmente mostra ampla rejeição a qualquer uso de recursos públicos para ajudar bancos em dificuldade. Mas, apesar de manifestar aversão instintiva à "banca", o público também não aceita com facilidade as consequências das quebras bancárias, que levam a grande e generalizada perda de riqueza e a apertos indiscriminados no crédito.

Em suma, ninguém quer ajudar banqueiros, mas tampouco se quer deixar depositantes sem nenhum tipo de proteção. Bancos, em seu formato moderno, não são empresas comuns -tanto que as condições para abertura de uma casa bancária em geral são muito mais restritivas do que aquelas vigentes para a abertura de negócios em outros setores da economia.

A especificidade dos bancos deriva em parte da importância da confiança na preservação do sistema, a qual pode, em situações extremas, ser abalada mesmo quando apenas um número pequeno de instituições sofra dificuldades -haja vista as consequências da quebra do banco Northern Rock, no Reino Unido, em 2007, e da Lehman Brothers, instituição de porte meramente mediano, em 2008.

Sendo assim, os países foram, ao longo do tempo, desenvolvendo redes de proteção para o sistema bancário, visando, em última instância, proteger os depositantes. Isso não quer dizer que banqueiros incompetentes ou desonestos devam ser preservados -as boas regras de supervisão e resolução de problemas bancários preveem punições patrimoniais, civis e até criminais para a má gestão e também a saída de instituições inviáveis do sistema.

No caso brasileiro, a rede de proteção inclui o Fundo Garantidor de Créditos (FGC), criado em 1995. Ele conta com recursos do próprio sistema bancário, e teve papel importante na superação da crise de 2008.

De fato, o papel do FGC merece capítulo específico em uma proposta legislativa elaborada pelo Banco Central, que foi posta em audiência pública em 2009, para tratar da questão da resolução de problemas bancários. Uma das maiores inovações dessa proposta é tornar o FGC, ou uma instituição sucessora, passível de receber empréstimos assistenciais do Banco Central em situações de emergência.

Tal medida ampliaria em muito a capacidade de atuação do FGC em momentos de crise. Em troca, evidentemente, a instituição garantidora de empréstimos passaria a ficar dentro do perímetro de supervisão do Banco Central, com atividades reguladas pelo Conselho Monetário Nacional, e seus dirigentes teriam de cumprir regras estritas de governança, em particular a quarentena para atuação em bancos-contribuintes.

Também na supervisão bancária é melhor prevenir do que remediar. O reforço da rede de segurança do sistema bancário poderia gerar certa complacência e maior predisposição ao risco por parte dos investidores e também dos gestores bancários.

Para evitar que o chamado "risco moral" derivado do reforço dos mecanismos de proteção leve ao aumento, e não à mitigação, da fragilidade do sistema, será preciso estender e intensificar o esforço de supervisão do Banco Central.

Outro componente interessante da proposição legislativa do Banco Central é a possibilidade de realização de empréstimos, pela autoridade monetária, para as câmaras e para os prestadores de serviços de compensação e de liquidação que atuem como contraparte central

-instituições críticas em momentos de estresse financeiro, pois estão no centro de um grande número de transações envolvendo bancos e corretoras.

Assim como no caso do fundo garantidor de depósitos, tais instituições passariam a ser fiscalizadas de perto pelo BC, sob o princípio de que maior proteção venha acompanhada por maior regulação.

Esse é um tema delicado e que merece ser objeto de deliberação cautelosa e profunda no Legislativo. Melhor, portanto, abordá-lo em períodos normais do que nos de emergência.

Nesse contexto, talvez fosse de bom alvitre incluir a proposição legislativa do Banco Central, que reflete a opinião e a experiência de seus especialistas, na agenda de prioridades para 2012.

MARIO MESQUITA, 46, doutor em economia pela Universidade de Oxford, escreve às quartas-feiras, a cada 14 dias, neste espaço.

AMANHÃ EM MERCADO:
Alexandre Hohagen

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