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Entrevista Victor W. Hwang

Medo de agir é a maior limitação da economia brasileira

Para um dos principais consultores globais de inovação, Brasil tem ideias criativas, mas espera autorização para levá-las adiante

MARIANA BARBOSA DE SÃO PAULO

O brasileiro é cheio de ideias, mas, na hora de partir para a ação, fica paralisado esperando algum tipo de autorização de alguma autoridade. A descrição é de um dos maiores consultores em inovação do Vale do Silício, Victor W. Hwang, 42.

Entusiasta do Brasil, Hwang diz que o país precisa vencer uma cultura de medo e canalizar a veia criativa, manifestada nas artes, na música e no design, para o empreendedorismo.

"O iPhone é uma máquina ou uma obra de arte? Conseguir aplicar o espírito artístico nos negócios é matador."

Hwang vem ao Brasil na próxima semana para a 14ª Conferência da Anpei (Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras), nos dias 28 e 29, no ExpoCenter Norte, em São Paulo. Ele falou à Folha por telefone.

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Folha - Como o sr. vê o ambiente de inovação no Brasil?

Victor W. Hwang - Sou um entusiasta do Brasil. O país é incrível no campo da música, das artes e do design. É preciso aplicar essas habilidades nos negócios.

Especialmente nas indústrias criativas?

Criar uma empresa do zero é um processo criativo. É preciso o mesmo tipo de pensamento criativo das artes para ser bem-sucedido como empreendedor. E os brasileiros deveriam se perguntar por que não usar esse espírito criativo para empreender.

Talvez haja um certo preconceito da comunidade artística com o mundo empresarial...

Acho que sim. Alguns acham que o mundo dos negócios é demoníaco. Mas isso está mudando. Veja a Apple. O iPhone é uma máquina ou uma obra de arte? Conseguir aplicar o espírito artístico nos negócios é matador.

Como construir um ambiente propício para a inovação?

Não é algo que vem de uma autoridade falando o que fazer. Tudo se dá no nível do comportamento individual ou da cultura. No Vale do Silício, impera uma cultura baseada em formação de equipes que fomenta o espírito criativo e alavanca negócios. É comum você tomar café com alguém de manhã e, à tarde, fechar contrato. Muitos acham estranho. É que na maior parte do mundo, incluindo o Brasil, as pessoas não acreditam umas nas outras.

E como transformar a criatividade brasileira em inovação nos negócios, com todos os entraves em termos de burocracia, impostos?

Os brasileiros precisam parar de ter medo. Algo que notei no país é que há muitas ideias criativas. Todo mundo tem ideias sobre como fazer coisas melhores, seja na empresa, na comunidade ou em relação ao país. O problema é quando chega a hora de partir para a ação. As pessoas têm a tendência de esperar permissão ou orientação, têm medo de dar um telefonema, marcar uma reunião, arriscar. Acho que o medo é a maior limitação para a economia brasileira.

Esse medo é algo particular do Brasil?

Cada um tem a sua particularidade. No Brasil, o respeito e o medo das autoridades limitam a inovação. Se você pensa no Vale do Silício há 150 anos, não tinha autoridade, governo, estrutura social. Foi preciso criar uma comunidade do nada.

Quando você cria uma comunidade a partir de indivíduos, desenvolve sistemas baseados em leis informais. No Vale, as leis não escritas dizem para confiar em alguém com um aperto de mão, para dar uma chance sem esperar retribuição.

Esse tipo de comportamento tem um efeito muito poderoso. Ao compartilhar, ao ajudar os outros, você acelera o sistema. Você não espera pela permissão de um líder. Você faz.

O que é algo muito americano: faça você mesmo.

Ideias não valem nada. Você pode ter ideias geniais, de grandes invenções e tecnologias, mas isso não vale nada se elas não se transformam em algo real. Vejo esse problema no Brasil e em outros lugares. As pessoas investem em ideias e tecnologias, mas não em fazer as pessoas partir para a ação. No Brasil, é um problema muito maior do que a falta de ideias.

Sem dúvida, é um problema invisível. Fazer uma universidade ou um parque tecnológico é fácil. Mas estamos falando em um medo que está no coração das pessoas e que as impede de agir.

Não se faz inovação sozinho?

Não existe nenhuma empresa relevante de uma pessoa só. Tudo acontece em equipe. A montagem da equipe é a parte mais difícil quando se cria uma empresa.

Muitas empresas perdem o caráter inovador quando crescem demais. O sr. acredita que Google, Amazon e Facebook seguirão inovando?

O ambiente de trabalho é importante. A arquitetura dos escritórios, as regras, as ideias. Também é fundamental se cercar de pessoas que agem, que arriscam.

Muitas empresas estão comprando outras não pelos produtos ou pelo faturamento, mas pela equipe. É o que chamamos de "acqu-hire" (mistura de aquisição e contratação, nos termos em inglês). É uma forma de renovar.

Há 20 anos, o Vale do Silício estava focado em inovação tecnológica. Há dez anos, o foco passou a ser inovação no modelo de negócio. Hoje, isso ficou velho. As pessoas estão focadas em inovação cultural. Se você conseguir mudar a cultura, o modelo de negócio e os produtos vão acontecer automaticamente.

É uma mudança enorme em termos de liderança. A maior parte do mundo está focada em inovação tecnológica e de modelo de negócios. No Vale, eles sabem que a cultura é o mais importante. Se a cultura se desintegra, a companhia se desintegra.

É isso o que vai garantir a longevidade das empresas do Vale?

Sim. Inovação técnica e de modelo de negócios é temporária. Você pode ganhar a liderança por um ano, mas, depois, todos vão te copiar. Se você tem a cultura certa, os concorrentes podem te copiar. Mas, quando fizerem isso, você já estará à frente.


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