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Marcelo Neri

Ano novo, vida nova

A passagem de hoje para amanhã será quando o aspecto crítico da crise se torna, ou não, crônico

Nesta época do ano, muda o nosso metabolismo, as notícias e os jornais se afinam, como o de hoje. No Natal somos saudosos, olhamos para o passado distante, época do nascimento do nosso calendário ocidental. No Réveillon, a velha ampulheta e o nosso olhar viram, nos viramos para o que vem na frente, nos preparamos para o renascimento dos projetos de vida, pessoais e profissionais. Do parar de fumar ao começar uma nova dieta para se livrar dos quilinhos acumulados nas festas e/ou desde que parou de fumar.

Época de projetar o futuro. Nas famílias há hoje desempregados e workaholics, uns só pensam em um novo trabalho, outros só pensam em parar de trabalhar nas férias. Queremos todos o que não temos.

As empresas se preparam para implementar seus respectivos planejamentos estratégicos, os governos começam a olhar para as próximas grandes realizações, isto é, ganhar as novas eleições.

Após um semestre de surpresas, quando os Estados Unidos se dividiram, quando a zona do euro virou de fato uma zona, quando a primavera se instalou na Arábia onde não se falava de flores, quando Hugo Chávez conseguiu dar ampliado sentido à expressão "Caracas!", repetida a toda hora pelo meu filho.

Tive a oportunidade de perguntar a dois dos mais renomados e experientes "scholars": Helio Jaguaribe e Candido Mendes. Hoje as mudanças são mais rápidas que antes ou é ilusão de ótica de quem está no meio do processo? Eles foram muito claros em dizer que hoje tudo muda mais rápido. O que não significa um processo contínuo uniforme de mudanças, pelo contrário.

Mais concretamente: o que será de mim? o que será de você? o que será de nós?

A passagem do dia de hoje, o primeiro, que neste ano é domingo -quando, reza a lenda, Deus descansou-, mas sempre feriado, para o dia de amanhã, o primeiro dia útil do ano, representa o exato ponto de mutação do ano, quando o crítico se torna, ou não, crônico.

Ao abrirmos a Pesquisa Mensal de Emprego em bases semanais vemos que a passagem da última semana do ano para a primeira do ano seguinte é quando tudo muda. Não apenas nas sazonalidades associadas ao Mito do Eterno Retorno das sociedades primitivas de Mircea Eliade, mas quando as inovações são transmitidas às séries. Quando o transitório se torna, ou não, permanente.

Na primeira das crises externas do final dos anos 90, iniciada com o estouro da crise asiática em meados de setembro de 1997, foi na primeira semana de 1998 que a taxa de desemprego dessazonalizada subiu 2 pontos percentuais, o que era muito na métrica usada na época.

Passou de 6% para 8%, caracterizando o que pode se chamar de crise de desemprego, que vigorou até o fim da crise de 2003.

Na crise passada, cujo ápice de impulso também se deu em meados de setembro, no caso de 2008 teve seu impacto materializado na virada do dia 1 para 2 de janeiro. A pobreza subiu 6% apenas em janeiro de 2009. A nova classe média, que tinha ficado incólume desde o episódio do Lehman Brothers, também sofreu nesse mesmo dia em 2009 a primeira retração desde o fim da recessão de 2003.

A diferença do episódio acontecido 11 anos antes é que em fevereiro de 2009 já havíamos recuperado o ritmo de crescimento de renda observado antes da crise anunciada.

É verdade que demorou 12 meses para recuperar o nível inicial das séries, uma espécie de revolução de 360 graus que, tal como nas sociedades primitivas, nos levou de volta ao ponto de partida.

Em 2 de janeiro de 1998 passamos a enfrentar a chamada crise de desemprego deflagrada 3,5 meses antes. Na mesma data em 2009, não houve nem tsunami, nem marolinha, mas ressaca tão forte quanto passageira, fruto do terremoto financeiro propagado 3,5 meses antes.

Depois das instabilidades de agosto e setembro de 2011, o que será 2012? A concretização dos agouros apocalípticos? A segunda perna do W? A volta por cima? Ou, provavelmente, nenhuma das alternativas acima.

Amanhã saberemos se seremos, ou nunca seremos.

MARCELO NERI, 48, é economista-chefe do Centro de Políticas Sociais e professor da EPGE, na Fundação Getulio Vargas, e autor de "Microcrédito, o Mistério Nordestino e o Grameem Brasileiro" (editora da Fundação Getulio Vargas) e "A Nova Classe Média" (editora Saraiva).

www.fgv.br/cps

mcneri@fgv.br

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