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Cifras & Letras

Crítica / Crise

Autor propõe 'partido da indignação' contra Wall Street

Geógrafo marxista disseca origens da crise em misto de manifesto e aula

HARVEY DEFINE O NEOLIBERALISMO COMO UM PROJETO DA CLASSE CAPITALISTA PARA CONSOLIDAR SEU PODER

Michael Probst - 21.nov.2011/Associated Press
Fogo em frente ao Banco Central Europeu provocado por ativistas do movimento "Occupy Frankfurt", na Alemanha
Fogo em frente ao Banco Central Europeu provocado por ativistas do movimento "Occupy Frankfurt", na Alemanha

ELEONORA DE LUCENA
DE SÃO PAULO

"Há uma luta de classes, tudo bem, mas é a minha classe, a classe rica, que está fazendo a guerra e estamos ganhando." A frase é do megainvestidor americano Warren Buffett, 81.

David Harvey, 76, geógrafo marxista britânico, quer provar que um dos homens mais ricos do mundo pode estar errado.

Para isso, conclama cidadãos a criar um movimento anticapitalista ou um "partido da indignação" para derrotar o "Partido de Wall Street". Para embasar a luta, disseca as origens da crise atual.

O resultado, misto de manifesto e aula de economia, está em "O Enigma do Capital" (Boitempo).

Professor de antropologia da pós-graduação da Universidade de Nova York, Harvey mantém um curso sobre "O Capital", de Karl Marx, na internet. Seus livros "The Limits to Capital" (Limites do capital), de 1982, e "O Novo Imperialismo" (Loyola, 2004) expõem a evolução capitalista e a ascensão das finanças.

Esse seu novo volume condensa muitas de suas ideias. Para ele, a crise atual da dívida soberana "tornou-se uma desculpa para a classe capitalista desmantelar o que sobrou do Estado de bem-estar por meio de uma política de austeridade".

Harvey parte do princípio de que, no capitalismo, as crises são inevitáveis e necessárias. Servem para restaurar equilíbrios e resolver, ao menos temporariamente, as contradições internas da acumulação do capital. A forma como são enfrentadas define o caráter futuro do sistema.

Para averiguar as origens da crise, ele volta aos anos 1970, quando a acumulação capitalista tinha perdido força em razão de conquistas de trabalhadores e de movimentos sociais.

Uma "contrarrevolução neoliberal" ocorreu, reconstituindo o nexo Estado-finanças, e o "capital foi reempoderado em relação ao trabalho", escreve.

Harvey define o neoliberalismo como um projeto da classe capitalista para consolidar o seu poder.

Para ele, autor de "A Brief History of Neoliberalism" (Uma breve história do neoliberalismo), de 2005, a receita foi simples.

"Esmagar o poder da classe trabalhadora, dar início ao arrocho salarial, deixando o mercado fazer seu trabalho e colocando o poder do Estado a serviço do capital."

Nesses fatos ele enxerga a raiz da crise atual.

Especializado em geografia urbana, o autor aproveita para resumir suas análises que ligam a urbanização de Paris, conduzida pelo Barão Haussmann a partir de 1853, à eclosão da Comuna de 1871.

Faz conexões também entre o avanço dos subúrbios americanos e as revoltas no final dos anos 1960.

O geógrafo afirma que o capitalismo tem sido "surpreendentemente criativo" nos últimos 200 anos, mas esbarra agora em desigualdades crescentes. Sim, diz ele, o sistema vai sobreviver. Mas a que custo?, pergunta.

No final, ele resvala para um certo "igualitarismo radical" e acha que "conceber uma sociedade sem acumulação de capital não é diferente em princípio de conceber uma cidade sem carros".

"Por que não podemos todos apenas trabalhar lado a lado sem qualquer distinção de classe?", propõe. Suas palavras soam românticas, utópicas e ingênuas. Podem ter eco em protestos de rua. Mas esfumaçam suas análises que querem buscar objetividade.

O ENIGMA DO CAPITAL
AUTOR David Harvey
EDITORA Boitempo
QUANTO R$ 39 (240 págs.)
AVALIAÇÃO Bom

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