Cifras e Letras
crítica estratégias globais
Falta de direção e ousadia pode fazer países perderem o bonde
Livro de professor da UFRJ indica fatores que levam ao desenvolvimento
A crise mundial e o aumento da belicosidade e da competitividade internacional projetam condições favoráveis para uma nova era de convergência entre as políticas de autoproteção social e nacional dentro dos países de escalões inferiores do sistema capitalista.
Mas as nações podem perder o bonde da história, caindo no "desenvolvimentismo preguiçoso", "sem direção estatal claras por absoluta falta de ousadia internacional e de uma estratégia econômica e social coerente, expansiva e de longo prazo".
O alerta é de José Luís Fiori, professor de economia e política internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, feito no livro "História, Estratégia e Desenvolvimento, para uma Geopolítica do Capitalismo".
Nesse seu novo livro, o cientista social elabora questões de fundo sobre o desenvolvimento de países, tratando de história, política e economia. Fiori avalia que a liderança do capitalismo tem uma lei de ferro: sempre esteve nas mãos dos capitais privados e das economias nacionais que conseguiram operar com sucesso na contramão das leis de mercado.
"As grandes potências desrespeitaram sistematicamente os preceitos da ortodoxia econômica em nome de sua luta pela conquista de mais poder e, mesmo assim, conseguem manter sua credibilidade fiscal e financeira, acumulando ainda mais poder."
O livro reúne 71 artigos publicados pelo autor nos últimos cinco anos. EUA, Inglaterra, China, Portugal, Alemanha, Japão, Argentina, Brasil: textos condensados e didáticos mergulham fundo na trajetória dos países.
No prefácio e no posfácio Fiori amarra as ideias, formulando teses originais. Mostra que todos os países que se transformaram em grandes potências enfrentaram, no momento de sua disparada, rebeliões ou guerras civis.
QUEBRANDO REGRAS
Em todos os casos de sucesso econômico, ele identifica a existência de um núcleo estratégico unido e coeso dentro do próprio Estado, que foi o responsável pela definição e sustentação dos objetivos que se mantêm durante muito tempo, apesar de eventuais mudanças de governo.
Tratando da América do Sul, ele analisa a competição entre Brasil e Argentina, expondo o enorme desenvolvimento dos países nos séculos 19 e 20 --resultado de projetos nacionais que galvanizaram a sociedade. Na sua visão, a recente aliança entre os países "é uma revolução na história do Cone Sul".
No entanto, adverte que essa estratégia enfrentará ferrenha oposição externa e interna dos EUA e dos partidários locais do "cosmopolitismo de mercado".
"Todo sucesso dessa aliança será sempre considerado como uma linha vermelha para os interesses dos EUA e de sua rede de apoios dentro do continente, defensora da submissão estratégica e econômica da América do Sul à política internacional dos EUA."
Para avançar, o Brasil necessita de "dose extra de coragem, persistência e inventividade", sustentando uma vontade estratégica, afirma.
Advoga que o país precisará "questionar de forma cada vez mais incisiva a ordem institucional estabelecida".
"Em qualquer momento da história é possível acovardar-se e submeter-se, mas, atenção, porque o preço dessa humilhação será cada vez maior e insuportável para a sociedade brasileira", escreve.
Confrontando autores de esquerda, considera que não é provável que "o capitalismo ou mesmo os Estados Unidos estejam vivendo uma crise terminal". "Os EUA estão experimentando e construindo uma nova estratégia internacional mais arbitral e menos intervencionista", diz.
Fiori critica o que classifica como restos de desenvolvimentismo de esquerda. Segundo ele, a escola de Campinas se reduziu a local de formação de quadros de governo e de discussão de políticas setoriais, sem maior capacidade de formulação.
O livro não se detém no debate da questão ambiental e não tenta desenhar programas de governo. É uma lente grande-angular. Serve como preciosa bússola para entender o mundo global.