O ensaísta
Nos bancos de mármore
Diante da Grécia, a Alemanha parece surgir como uma espécie de irmã mais velha, de tia rica, de madre superiora que vai perdendo a paciência com tanta rebeldia juvenil.
Mas nem sempre foi assim. Durante a maior parte do século 19, a Alemanha não passava de uma soma desconjuntada de pequenos principados independentes, com baixo desenvolvimento industrial.
Seus poetas românticos, como por exemplo Friedrich Hölderlin (1770-1843), encaravam a Grécia como uma espécie de símbolo, de modelo para uma unidade perdida. Não se tratava apenas de imaginar a unificação do território alemão num país forte e único mas também de aliar esse projeto nacional a uma ideia tipicamente grega --a da democracia, da emancipação popular.
"Os jovens sonhavam com a glória", diz Holderlin em seu poema "Grécia", acrescentando que "Sócrates conquistava os corações" e "a vibração de um fraterno júbilo ressoava na Ágora agitada", enquanto "meu Platão forjava paraísos".
Para Hölderlin, como para Heine (1797-1856) e Novalis (1772-1801), predominava a sensação romântica de que alguma coisa muito preciosa estava perdida para sempre.
Os deuses estavam mortos. Por certo, a constatação nasceu dos ataques que a fé sofrera no século 18. Mas os românticos traduziram o declínio do cristianismo numa imagem mais abstrata e poética, a do declínio dos deuses gregos.
Havia, contudo, outra decepção. Se a fé tinha sido destruída pela razão, a própria razão encontrava seus limites, sua crise e sua loucura nos descaminhos da Revolução Francesa.
Com isso, as aspirações românticas se tornaram duplas: ordem e liberdade, mármore e bosques, razão e encantamento. Os poetas alemães pediam, de um lado, que se recuperasse a luz clara do sol de Apolo, da matemática e da razão. De outro, queriam o que pudesse haver de mágico, encantado, noturno nos ritos do passado. Natureza e trabalho, razão e fé, subjetividade e nação teriam de unificar-se.
"Onde, agora, está Atenas?", pergunta Hölderlin em "O Arquipélago". "A cidade mais amada pereceu, tornada em cinzas,/ ou será que um traço remanesce, bastante para que o marinheiro/ ao passar por perto venha a mencionar seu nome?"
"Não se levantaram altas as colunas?", pergunta ainda o poeta; "não deitavam olhos sobre o povo as luzentes imagens dos deuses, no alto das cidadelas?/ E a voz do povo, não rugia da Ágora como uma floresta açoitada pelo vento?"
De que lado, podemos perguntar hoje em dia, está a razão? Num ajuste econômico que sufoca a própria capacidade de um país pagar as dívidas? Ou numa defesa nacional contra os credores, na qual também se mistura o elogio da ineficiência e de interesses setoriais? Frios deuses, sentados em seus bancos de mármore, terão a resposta.