Entrevista Renato Vilela
Adiar os créditos da Nota Paulista não foi pedalada
NOVO SECRETÁRIO DA FAZENDA DE SP DIZ QUE DESPESA NÃO ERA OBRIGATÓRIA E CRITICA AÇÃO DO CONGRESSO DIANTE DA CRISE
À frente da Secretaria da Fazenda paulista há seis meses, o economista carioca Renato Vilela espera que, apesar da queda de 4,1% na arrecadação de ICMS no primeiro semestre (descontada a inflação), o caixa do Estado ficará equilibrado.
Dentre as medidas tomadas para isso estão o atraso de seis meses no repasse de créditos da Nota Fiscal Paulista, a redução de 30% para 20% do ICMS destinado a ser rateado entre os consumidores e a captação de R$ 740 milhões feita em julho pela Companhia Paulista de Securitização (Cpsec).
Vilela negou que o governo tenha feito uma "pedalada fiscal" ao adiar os desembolsos da Nota Paulista para 2016. "Pedalada é postergar uma despesa obrigatória, e a Nota Paulista não é."
O secretário disse que a economia com o adiamento será de R$ 400 milhões, distribuídos para áreas que têm repasses vinculados à arrecadação do ICMS, como saúde, educação e prefeituras.
Já os R$ 740 milhões captados com emissão de debêntures serão destinados a manter investimentos –que sofreram queda de 22,7% no primeiro quadrimestre do ano ante igual período de 2014.
CRISE X ARRECADAÇÃO
Há muito tempo, a arrecadação vinha batendo recorde em cima de recorde em São Paulo graças a uma postura fiscal, ao contrário do governo federal. O problema é, quando o nível de atividade cai, a nossa principal receita, o ICMS, ligado diretamente ao nível de atividade, cai.
META FISCAL
Outras medidas devem ser tomadas conforme a crise vai se desenrolando. Todas as previsões são muito pessimistas, mas as metas do Estado ainda estão mantidas, de superavit primário de R$ 1,5 bilhão, como está na LDO. O aumento na energia em março também ajudou, em torno de RS 300 milhões, mas é pontual, não há reajuste todo mês.
IMPACTO NAS OBRAS
O governo federal não está liberando operações de crédito acertadas. Com o ajuste fiscal, isso faz sentido, mas tem impacto ruim no Estado. São Paulo está bancando, na medida do possível, esses recursos que não vêm (do governo federal). São operações da ordem de R$ 1 bilhão a R$ 1,5 bilhão. Quando esse recurso é liberado, cada secretaria decide se vai pagar uma obra, ou se vai pagar um serviço.
AJUSTE FISCAL X CONGRESSO
É difícil falar em acertos e erros se você não deixou a pessoa [ministro da Fazenda, Joaquim Levy] fazer o que tinha de fazer. A questão é que, como em qualquer país democrático, você depende do Congresso. E, por algum motivo que me escapa à capacidade de análise, o Congresso não está respondendo com a velocidade e as medidas necessárias. O Congresso está com uma agenda completamente ortogonal, digamos, diferente do que o país precisa.
Em todos os momentos graves pelos quais o país passou, nos últimos 20, 30 anos, em que foram necessárias medidas mais duras, o Congresso respondeu. Essa é a primeira vez que estou presenciando um desalinhamento completo entre Congresso e a necessidade da política econômica.
FISCALIZAÇÃO
A fiscalização está na rua. Mas o que se nota é que, se um setor teve redução de imposto, a fiscalização vai lá achando que é sonegação e descobre que foi a atividade que despencou. Até junho, havia 2 setores no azul de um total de 20: alimentação e energia elétrica. O automobilístico estava no final da fila com frustração de receita de mais de 20% reais.
NOTA PAULISTA
Fala-se que houve pedalada fiscal, mas não é. Pedalada é postergar uma despesa obrigatória. Foi uma decisão de gestão financeira. Não houve impacto no número de adesões, nem achamos que a redução de 30% para 20% vai desestimular o consumidor.
REFORMA NO ICMS
A medida provisória criou dois fundos para evitar perdas, mas a fonte de sustentação, que seria garantida pela repatriação de recursos, ainda é incerta. É difícil estimar o quanto será repatriado, vai depender de tributação, de questões jurídicas e até do ativismo do Ministério Público.
Uma coisa que é importante para que a reforma do ICMS dê certo é haver um período de transição. Está no Senado o projeto que faz a redução das alíquotas em 2017, o que não é ruim. Daria fôlego e tempo para garantir recursos para os fundos de compensação e de desenvolvimento regional. O Senado quase votou antes do recesso. À medida que o tempo passa, o quase consenso que existe hoje pode mudar. Esse era o momento ideal de votar e o Senado quase o fez.
FIM DA GUERRA FISCAL
A guerra fiscal existe no mundo todo, não é uma jabuticaba. O que faz ser mais danosa no Brasil é que, ao contrário do que há em outros países, você não faz bondade só com seu dinheiro, você impõe custos aos Estados vizinhos. Isso você só resolveria se o ICMS fosse cobrado só no destino.