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Julio Vasconcellos

Rio do Silício

No caso do Rio de Janeiro, acredito que a grande fonte de inovação será a indústria do petróleo

Hoje o Rio de Janeiro está bem posicionado para se tornar o Vale do Silício da América Latina, mas ainda faltam algumas peças-chave.

Há uma receita de bolo de como criar um Vale do Silício local? Certamente não, mas os ingredientes principais são conhecidos: alguma fonte contínua de inovação e pesquisa, uma cultura de fomento ao empreendedorismo, um ecossistema de apoio a pequenas empresas. E uma pitada de sorte.

O coração de um polo de inovação e empreendedorismo é a produção de pesquisa e desenvolvimento de excelência -comparável aos melhores polos do mundo tanto em volume como em qualidade.

No Vale do Silício, esses centros de P&D são as universidades Stanford e de Berkeley, que atraem alguns dos melhores pesquisadores e pensadores do mundo. Em outro "Vale do Silício" mundial -Israel-, o polo propulsor da inovação é a indústria da defesa, fomentada pelo Exército israelense, que estimula o desenvolvimento de um grande volume de novas tecnologias e com isso forma grandes cientistas.

Para um "Vale" se sustentar, essa P&D de ponta tem que acontecer de forma contínua, orgânica e prolongada. Por isso, apoiar uma instituição de pesquisa (seja ela estritamente acadêmica ou não) é uma das melhores formas de o governo fomentar o desenvolvimento.

No caso do Rio, acredito que a grande fonte de inovação será a indústria do petróleo. Hoje, centenas de bilhões de reais já estão sendo investidos em P&D nessa área, desenvolvendo novas tecnologias com diversas aplicações e formando, por tabela, grandes pesquisadores de forma análoga à que a Universidade Stanford e o Exército israelense têm feito nas últimas décadas.

É uma situação única nas cidades brasileiras (e mundiais) e que serve como ponto de partida na construção do nosso Vale do Silício.

Se o P&D é o coração de um polo de inovação, a cultura empreendedora é sua alma. Não basta ter grandes pesquisadores e grandes tecnologias -precisamos de pessoas com espírito empreendedor para transformar esse conhecimento e essas descobertas em empresas.

Mas a cultura é o ingrediente mais difícil de encontrar e o mais difícil de aplicar na dose certa. Acredito que a melhor forma de plantar a semente de uma cultura empreendedora é por meio de pessoas que já a trazem dentro de si.

Uma vez plantada a semente de forma certa por um grupo de "fundadores", cuja cultura e valores se multiplicam por meio de seus discípulos, podemos esperar que essa cultura se desenvolva ao longo de muitos anos de forma já adaptada ao seu novo habitat.

O projeto do Start-Up Chile tem sido reconhecido por "importar" uma cultura empreendedora ao disponibilizar incentivos para que empreendedores de fora se estabeleçam no Chile e "semeiem" a cultura.

No Rio, como em grande parte do Brasil, não temos uma cultura empreendedora. Parte da academia enxerga a iniciativa privada como um desvirtuamento da pesquisa e educa os universitários a não considerar o empreendedorismo como opção viável de carreira. Enquanto nossas instituições colocam barreiras a empreendedores, nossas leis e processos dificultam a imigração de empreendedores estrangeiros que poderiam ajudar a plantar as sementes na nossa cultura.

Acredito que um programa de incentivo por parte do governo, parecido com o implementado em Nova York (por um grande empreendedor, o prefeito Bloomberg) para empreendedores largarem seus empregos tradicionais, ou programas de aceleradoras e cursos de como empreender, organizados pelas universidades ou pelo setor privado, como o Y Combinator de Paul Graham, seriam grandes catalizadores para fomentar essa cultura empreendedora que é essencial na receita.

Em ensaio a respeito de como criar um novo Vale do Silício, o próprio Paul Graham aponta a necessidade de uma cidade descontraída, com personalidade e caráter histórico -um Rio de Janeiro-, como um dos elementos essenciais para atrair determinados tipos de empreendedores. Temos a matéria-prima para atrair e semear a cultura, mas ao mesmo tempo uma estrutura que inibe o crescimento.

Sem uma simplificação da regulamentação societária, trabalhista e fiscal, é pouco provável que um Rio do Silício floresça no Brasil.

JULIO VASCONCELLOS, 31, economista, é fundador e presidente-executivo do site de compras coletivas Peixe Urbano. Escreve às quintas-feiras, a cada quatro semanas, nesta coluna.

julio.folha@yahoo.com

AMANHÃ EM MERCADO:
Rodolfo Landim

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