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Vinicius Torres Freire

Poupança e fundos perdidos

'Canetada' deve dar jeito em problemas que o juro tabelado da poupança pode causar com a queda da Selic

SUPONHA-SE QUE a taxa básica de juros, a Selic, vá abaixo dos 9% para onde desceu na semana passada.

Suponha-se que, tomados de súbita e aguda consciência financeira, os investidores de fundos de renda fixa decidam migrar em massa para a caderneta de poupança, que rende pouco, mas paga mais do que alguns fundos com taxas de administração extorsivas.

Suponha-se que tais coisas ocorram antes que o governo enfim apresente um plano organizado de alterar o rendimento das cadernetas. E daí?

O pessoal do governo, do Banco Central à Fazenda, diz nas internas que se dá um jeito: baixa-se uma resolução que autorize os bancos, gestores dos fundos, a aplicar o dinheiro dos depósitos da caderneta de poupança em títulos do governo. Ou seja, se houver crise, não há crise.

A história da mudança no rendimento das cadernetas ressuscitou com a nova baixa da Selic e com a perspectiva de que a taxa básica da economia talvez não fique estacionada nos 9% ou 8,75%, como era o "entendimento" da maior parte do pessoal do mercado até o começo deste mês. Na sexta-feira, nos negócios com juros futuros apostava-se em reduções adicionais da Selic. O pessoal se guiava pelas mais recentes declarações sibilinas do BC.

Qual a relação dos juros básicos com a poupança? Os fundos de investimento mais comuns (quase todos, aliás) emprestam dinheiro ao governo, e dele recebem os juros que pagam a seus investidores. A taxa de juros básica é mais ou menos aquela que o governo paga a seus credores. Logo, se cai a taxa básica, cai o rendimento dos fundos que aplicam em títulos do governo.

A poupança tem juros tabelados, não paga taxa de administração e não paga IR. Portanto, dados um certo nível da Selic e o custo da taxa de administração, o rendimento de um fundo pode perder da poupança. Alguns já perdem.

Se o dinheiro migra em massa para a poupança, no limite falta crédito para o governo (hipótese remota, mas há o risco de distorção no mercado, de qualquer modo). Isto é, o dinheiro que seria emprestado ao governo iria para a caderneta.

Os bancos poderiam ter problemas -isso é o que parece estar pegando mais. Haveria sobra de dinheiro para empréstimos imobiliários (para onde, por lei, tem de ir a maior parte dos depósitos das cadernetas). Faltaria para outras demandas. A rentabilidade de bancos cairia. Poderia haver sustos.

Permitir que os bancos apliquem fundos depositados na poupança em títulos públicos resolveria esses problemas, pontualmente. Mas os juros da caderneta ainda seriam uma espécie de piso para ao menos certas taxas no país, como a do financiamento de imóveis. Não dá.

De qualquer modo, o governo não acredita em migração em massa. Confia na negligência e no desconhecimento financeiros do grosso da população. Além do mais, quer dar outro calor na banca. Antes de mexer no rendimento da poupança, espera ver os bancos reduzindo taxas de administração excessivas cobradas em certos fundos.

Para refrescar a memória: no ano passado, a poupança rendeu menos de 1% em termos reais (além da inflação). Houve ano ainda pior neste século. Em certos fundos, pois, o seu dinheiro pode estar sendo até mesmo corroído pela inflação.

vinit@uol.com.br

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