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Benjamin Steinbruch

Pululam os protestos

Só a austeridade não tira os europeus da crise; eles precisam criar empregos e aliviar as tensões sociais

Sim, o pêndulo mudou na Europa. E as mudanças são bem-vindas. Despachantes globais de quase todas as ondas da atual crise, autoridades europeias finalmente se convencem de que só austeridade não vai restabelecer o vigor de suas economias.

O desemprego na zona do euro atingia 17,4 milhões de pessoas em março. Em apenas um mês, 169 mil empregos foram destruídos nos 17 países. Nos mais castigados pela crise, como Espanha e Grécia, metade da população de até 25 anos está desocupada. Estão em recessão 12 países da União Europeia.

Nem os mais ortodoxos defensores da política de austeridade pública podem conviver com dados como esse. Menos de dois meses atrás, sob a liderança da chanceler alemã, Angela Merkel, a cúpula de chefes de Estado da UE aprovou o pacto de austeridade fiscal no bloco.

Na semana passada, a mesma Merkel previu que até a próxima reunião da UE, em 28 de junho, será montado um pacote de sugestões de medidas para incentivar o crescimento. O próprio parlamento alemão só aprovará o pacto de austeridade depois desse anúncio de medidas, informalmente chamadas de "pacto do crescimento".

O pêndulo mudou de lado porque houve resistência da sociedade. Os europeus olham para o outro lado do Atlântico e veem que os EUA, embora ainda sem grande dinamismo, criam mais de 100 mil empregos por mês, porque Obama enfrenta a crise de forma menos ortodoxa.

Nos países mais castigados pela recessão, no sul da Europa, pululam os protestos contra os cortes de gastos públicos. Na Holanda, uma coalizão de direita fracassou por conta dos planos de austeridade orçamentária. Na França, o socialista François Hollande foi eleito presidente com um discurso contra a austeridade fiscal impiedosa e propõe uma política mais keynesiana para a Europa.

É difícil prever para onde irá a França com a volta dos socialistas ao poder. A armadilha da moeda única coloca empecilhos para que os países da UE desenvolvam planos nacionais de crescimento. Hollande certamente terá dificuldades para pôr em prática suas promessas eleitorais, como a contratação de 60 mil professores e a criação de 150 mil empregos para jovens. Ele será pressionado para cumprir a meta de redução do deficit público para 3% do PIB em 2013.

De qualquer forma, é fato que existe uma nova conscientização na Europa, centrada na realidade de que as políticas de rigorosa restrição orçamentária estão promovendo recessão sem eliminar os enormes deficit fiscais. Com a recessão, as receitas públicas tendem a cair, e isso exige novos cortes, num ciclo perverso para toda a sociedade.

Pouca gente sabia que existe na Europa um banco de desenvolvimento regional, o BEI (Banco Europeu de Investimentos), semelhante ao BNDES, mas menos importante em matéria de suporte aos investimentos -cuida praticamente só do crédito a pequenas e médias empresas. Pretende-se anunciar, na cúpula de junho, entre outras medidas, um programa de investimentos de € 200 bilhões, tocado pelo BEI.

Controle de gastos é recomendável em qualquer caso, seja na iniciativa privada, seja em governos. Mas o controle não pode cercear o crescimento. Quando se corta investimento, nas empresas e no setor público, corta-se o futuro. Isso cria uma conta que não tarda a chegar, com desemprego e problemas sociais. O Brasil já provou desse veneno não faz muito tempo.

Só a austeridade não vai tirar os europeus da crise. Eles vão precisar de planos de investimentos em setores com vocação para crescimento no continente. É urgente criar empregos e aliviar as tensões sociais. Mudanças políticas, como a eleição de Hollande, indicam que o pêndulo europeu se move para esse lado.

De onde virão os recursos para as medidas de estímulo ao crescimento? Do BCE e dos bolsões de riqueza europeia, sem nenhuma dúvida.

A Alemanha, principalmente, terá de pôr a mão no bolso para pagar parte dessa conta e resgatar seus vizinhos se quiser preservar a UE. Os alemães vão resistir, mas seria recomendável que eles absorvessem a mensagem que saiu das urnas francesas. Elas servem para a França e para toda a Europa.

BENJAMIN STEINBRUCH, 58, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças, a cada 14 dias, nesta coluna.
bvictoria@psi.com.br

AMANHÃ EM MERCADO:
Alexandre Schwartsman

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