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Rodolfo Landim

Horror sem fim

A adoção de medidas de contenção de gastos em um país já em recessão pode criar um círculo vicioso

Nas últimas semanas, a Grécia voltou às manchetes dos jornais não só pelas suas indefinições políticas mas principalmente pelos reflexos que estas estão trazendo ao cenário econômico da Europa e de todo o mundo. Aparentemente, seria um exagero creditar tanta importância a um pequeno país, com uma população em torno de 11 milhões de habitantes e um PIB de apenas US$ 300 bilhões. Mas o que está em jogo, o que aterroriza os mercados e vem causando estrago, vai muito além das fronteiras helênicas.

A União Europeia, união econômica e política que começou em 1957, hoje abrange 27 nações que, em conjunto, têm o maior PIB mundial (US$ 16 trilhões) e mais de 500 milhões de habitantes. O sucesso de sua formulação levou à criação de um mercado único em todo o território de seus países-membros, permitindo não só a união aduaneira como a livre circulação de capital e trabalho entre eles que deve ser tão livre dentro do mercado como no território de cada participante.

Outro aspecto importante é que, como parte da estratégia de unificação de mercados, foi criado o euro com a intenção de torná-lo uma moeda única europeia. A partir do início de 2002, o euro passou a circular e hoje é adotado por 17 países.

Ao abrirem mão de suas moedas, esses países passaram a ter sua política monetária dirigida pelo Banco Central Europeu, cuja função é garantir o poder de compra do euro, sua estabilidade e a do sistema financeiro europeu como um todo.

Portanto, apesar de uma possível moratória grega, cujas dívidas são em euros, trazer impactos negativos para todos, os países que detêm a mesma moeda, sem dúvida, serão mais afetados. E é exatamente com isso que conta boa parte dos gregos.

Afinal, é razoável imaginar que a França e principalmente a Alemanha devam estar dispostas a pagar um bom preço para que sua moeda não fique fragilizada.

É correto dizer que medidas de austeridade precisam ser adotadas de forma a conter os enormes gastos da Grécia, que parece ter vivido muito além de suas reais possibilidades, levando ao contínuo crescimento do seu deficit público. Mas também é verdade que a adoção de medidas de contenção de gastos em um país já em recessão pode criar um círculo vicioso.

O povo grego parece querer o melhor dos mundos. Em sua grande maioria, deseja continuar na zona do euro. No entanto, os dois partidos que vêm dominando a política grega há décadas não conseguiram, nas últimas eleições, ter maioria para formar um governo de apoio às medidas de austeridade que viriam associadas a um pacote de € 130 bilhões para rolagem de dívidas.

Talvez isso tenha ocorrido porque boa parte dos eleitores acreditou no líder do Syriza, partido que ficou em segundo lugar nas eleições, que prega ser um blefe dos líderes europeus a ameaça de cortar qualquer ajuda ao país caso não cedam à pressão e aceitem adotar medidas recessivas, pois o que poderia estar sendo posto a perder seria muito maior.

O raciocínio tem fundamento, pois é impossível determinar o efeito contaminante de uma saída da Grécia da zona do euro. E certamente está na memória de todos o custo de ter deixado o Lehman Brothers falir em 2008.

Novas eleições foram marcadas na Grécia para o dia 17 de junho e, pelas pesquisas recentes, o prognóstico continua bastante indefinido.

Independentemente do resultado dessas eleições, o modelo que prega disciplina rigorosa e cortes profundos nos orçamentos europeus como forma de vencer a crise econômica vem perdendo adeptos e apoio político por estar levando os países a um prolongado sofrimento sem que se consiga enxergar uma luz no fim do túnel. O ressurgimento dos socialistas e a eleição de François Hollande na França é um exemplo disso.

É difícil saber se algum lado nessa queda de braço estará disposto a ceder caso vença a oposição ou mesmo, no caso de os dois estarem, quem irá piscar primeiro. Porém, parece que do jeito que está é que não vai ficar. Isso faz lembrar o dito popular de que é melhor um final horrível do que um horror sem fim. E é exatamente nesse clima que as decisões poderão vir a ser tomadas.

RODOLFO LANDIM, 55, engenheiro civil e de petróleo, é presidente da YXC Oil & Gas e sócio-diretor da Mare Investimentos. Trabalhou na Petrobras, onde, entre outras funções, foi diretor-gerente de exploração e produção e presidente da Petrobras Distribuidora. Escreve, às sextas-feiras, a cada duas semanas, nesta coluna.

AMANHÃ EM MERCADO:
Kátia Abreu

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