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Entrevista Thomas Bauernhansl

Inovação é a saída para encarar China, e não protecionismo

DIRIGENTE DE FUNDAÇÃO ALEMÃ QUE É ELO ENTRE PESQUISA E MERCADO AFIRMA QUE CONCORRÊNCIA MANTÉM A COMPETITIVIDADE

NELSON DE SÁ
ARTICULISTA DA FOLHA

Barack Obama e Dilma Rousseff, no esforço de estimular inovação, abraçaram o mesmo modelo: a fundação alemã Fraunhofer, que faz a ponte entre pesquisa acadêmica e aplicação de mercado -com casos de sucesso como a criação do padrão MP3 para música, usado em smartphones no mundo todo.

Os EUA lançaram a NNMI (National Network for Manufacturing Innovation) em março dando a Fraunhofer como referência.

E, no fim de 2011, o Brasil lançou a Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial) emulando a Fraunhofer, que até ajuda na estruturação da empresa.

Thomas Bauernhansl, que dirige o maior instituto da Fraunhofer, em Stuttgart, relata que a fundação tem hoje por foco o fortalecimento da indústria alemã na concorrência com a China.

Diz que, para enfrentar os menores custos chineses de produção e financiamento, a saída é elevar a aposta na inovação -e não proteger o mercado dos produtos chineses, como tentam Estados Unidos e Brasil.

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Folha - A Fraunhofer vai investir aqui, como nos EUA?

Thomas Bauernhansl - Poderia ser o mesmo modelo, criando a Fraunhofer do Brasil ou uma instituição como a Embrapii, para transferir especialmente a cultura.

Não é possível comparar nossas culturas, mas as ideias centrais talvez seja possível transferir. E é importante que o governo diga: "Ok, financiamos 30%, 35%". É importante também encontrar os professores certos. Na Fraunhofer, a maioria tem história em empresas.

Eu trabalhei oito anos na Freudenberg. Meus colegas também entendem as necessidades da empresa e da universidade.

Se você pensa: "Preciso de uma instituição como a Fraunhofer no Brasil", mas pega um professor padrão e diz: "Você agora é o diretor, por favor, faça transferência de tecnologia", não funciona.

A Fraunhofer já negocia com o governo brasileiro?

Queremos criar o escritório, é sempre o primeiro passo. Está em discussão com o governo, que tem grande interesse. Mais de 30 institutos da Fraunhofer já trabalham no Brasil. Estamos também em discussão para um projeto realmente grande.

Se ocorrer, será importante termos o escritório. Também estamos preenchendo o Ciência Sem Fronteiras, 300 pesquisadores devem ir para a Fraunhofer, que tem alto interesse em ter os brasileiros.

Quando seria instalado esse escritório ou instituto?

O escritório será decidido nas próximas semanas. A tendência é criar. Não sei se será possível ter um instituto ou nossa própria fundação, Fraunhofer do Brasil. Depende da atitude do Brasil.

O sr. já tem ideia de quais universidades brasileiras apresentam bom padrão?

Ainda não tenho uma avaliação. Sei que muitas têm alto nível. Há dez anos, trabalhei num instituto em Aachen, onde fiz meu Ph.D, e já tinha contato com universidades brasileiras. Minha experiência foi sempre boa com os pesquisadores brasileiros.

Na área de produção, minha perspectiva é que muitos países não focam processos de produção, mas novos produtos, e no fim a pergunta é sempre: "Como podemos produzir isso em nosso país, de maneira competitiva?".

Se não tiver resposta, você cria ideias, mas acaba produzindo na China. Isso é importante, e você vê a Alemanha focando em como produzir no ambiente alemão, de salários mais altos, algumas regulações específicas, alto custo energético.

O Brasil também atravessa uma fase difícil com a China. O modelo de produção baseado em inovação poderia ajudar o país nessa concorrência?

Se quer competir internacionalmente, você precisa de uma cadeia de valor adicional sofisticada. Precisa de muita inovação no processo.

Isso não quer dizer que produza tudo. Na Alemanha, compramos componentes, materiais, o que for, fora do país, e isso ajuda a manter a produção na Alemanha.

Você precisa ter visão clara de suas competências. A maioria das grandes empresas alemãs produz na China, no Brasil. Se quer ser líder global, tem de estar em todos os mercados relevantes.

O sr. disse que várias empresas alemãs fecharam.

Também temos exemplos negativos, em que empresas foram líderes no passado e não começaram a produzir na China, por exemplo.

E então, nesses mercados, crescem concorrentes que depois ficam tão competitivos que começam a trazer produtos para a Europa e a pressionar os velhos líderes. Até compram esses líderes.

Tivemos um exemplo com a Putzmeister, meses atrás, vendida a uma empresa chinesa. Eles cometeram um erro estratégico quando decidiram não ir com sua produção para a China.

Não é um tópico fácil, manter-se adicionando valor de produção no país. O Brasil tem talvez as melhores circunstâncias, tem petróleo, gás, pode criar sua própria produção siderúrgica. É uma vantagem competitiva para vocês, comparados a outros, como a Alemanha.

Mas mesmo nós, que só temos recursos em pequena proporção, somos capazes de produzir. Trazemos o material, adicionamos valor e vendemos nos mercados globais.

E vocês mantêm sua economia aberta, sem medo.

No longo prazo, é a melhor coisa que você pode fazer, porque está numa competição global e isso ajuda a manter os processos ajustados.

Do contrário, quando só há um mercado, por exemplo, só o brasileiro, e as empresas brasileiras sabem que não têm concorrência global, depois de 10 ou 15 anos seus processos deixam de ser competitivos. E então, um dia, os caras realmente competitivos vêm e você tem um grande problema (risos).

Leia a íntegra da entrevista
folha.com/no1105683

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