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David Pillin

É hora de se preocupar com a China

Se a Grécia sair do euro, quase todos vão sofrer; se a China frear, será ruim para apenas alguns países

Tem havido muita discussão sobre o impacto que uma saída grega da zona do euro teria sobre a economia global. Assunto menos debatido é o efeito que o abrandamento da demanda chinesa, especialmente por matérias-primas, poderia ter sobre partes da economia mundial.

Uma desaceleração chinesa provavelmente será menos dramática que uma saída grega. Por isso ninguém cunhou para ela um jargão tão tolo quanto "grexit" (minha proposta é "Chindown", que combina a ideia de uma queda chinesa com proteger o queixo -chin, em inglês- contra um oponente.)

Dados o peso da economia chinesa e sua importância para alguns exportadores de commodities, talvez o assunto devesse merecer muito mais atenção. Afinal, ao contrário de uma saída grega, que ninguém deseja, a China na verdade anunciou sua intenção de promover uma desaceleração na demanda.

O plano quinquenal chinês em vigor até 2015 menciona especificamente a necessidade de acostumar a economia a um crescimento menos dependente de investimentos pesados e menos sequioso de commodities, reduzindo a expansão anual do PIB dos dois dígitos dos últimos anos à casa dos 8%.

Para diversas economias, há muito em jogo. Nos últimos 20 anos, o comércio de muitos países com a China disparou. Em 1992, a China respondia por mísero 0,9% do comércio exterior brasileiro. Em 2010, a proporção disparara a 14%.

Com a estagnação das economias da Europa e dos Estados Unidos, a China se tornou um propulsor alternativo para o crescimento.

Surgiu uma espécie de circuito de retroalimentação sob o qual a China compra commodities de países que utilizavam o dinheiro assim faturado para comprar produtos industrializados chineses.

Como resultado, a China virou o maior parceiro comercial para diversos países, entre os quais Austrália, Coreia do Sul, Japão, Filipinas, Brasil, Chile, Peru, Angola e África do Sul.

Alguns podem sair prejudicados em caso de desaceleração chinesa. Não somente a demanda chinesa cairia como o preço das commodities de que o país precisa -petróleo, cobre e minério- sofreria recuos.

Um país que tem muito a perder é o Brasil. Artigo de Ruchir Sharma, diretor para mercados emergentes do banco Morgan Stanley, para a "Foreign Affairs" argumenta que o sucesso recente do país "depende de uma premissa extremamente instável: o preço das commodities". O que significa que depende, em grau preocupante, da China.

Uma queda na demanda chinesa poderia significar o fim do "momento mágico" do Brasil, afirma Sharma. O mesmo vale para outros países. "A freada no crescimento chinês indica o fim de uma era na qual os emergentes experimentaram expansão incomumente rápida."

Outro emergente que se enquadra nesse padrão é a Mongólia. A China responde por 92% das suas exportações, porcentagem que pode até crescer quando uma imensa mina de cobre começar a operar. O início da exploração deve ocorrer ainda neste ano.

A lista dos dependentes da China não se restringe aos países em desenvolvimento. A Austrália também depende da China -ou, mais precisamente, dos altos preços para as commodities gerados pela demanda chinesa.

Alguns dos grandes investimentos planejados pelas mineradoras do país tendo por base uma China permanentemente faminta por minérios já estão sendo cancelados.

Uma desaceleração na China não precisa ser ruim para todos. Frederic Neuman, economista regional do HSBC, faz uma distinção entre as commodities.

Uma mudança no equilíbrio da economia chinesa beneficiaria commodities agrícolas, em especial produtos como o trigo e a soja, caso o consumo doméstico subisse.

No lado do prejuízo, alguns grandes importadores de petróleo poderiam se beneficiar de uma queda de preços caso surgisse uma desaceleração na China.

Se a Grécia sair do euro, quase todo mundo vai sofrer.

Se a China passar por uma desaceleração, o impacto será mais contraditório, porque isso significará o fim de um momento mágico somente para alguns países.

Tradução de PAULO MIGLIACCI.

DAVID PILLING é editor do "Financial Times" na Ásia.

AMANHÃ EM MERCADO:
Maria Inês Dolci

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