Índice geral Mercado
Mercado
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Gustavo Cerbasi

Crédito inteligente

A decisão de contrair uma dívida é inteligente somente quando ela serve para construir mais riqueza

Existe uma nítida distinção entre o crédito de qualidade e o crédito ruim, mas a falta de debate sobre o assunto dificulta que os brasileiros percebam isso.

Endividar-se ou tomar dinheiro emprestado de maneira planejada nada mais é do que alugar recursos monetários de terceiros -normalmente, uma instituição financeira. Como o pagamento desse aluguel, na forma de juros, pesa no bolso, deveria ser razoável supor que ele vale a pena quando agrega benefícios e que deve ser descartado quando tende a causar problemas.

Mas, infelizmente, nossa inabilidade em planejar o futuro nos impede de vislumbrar os tais problemas. Muitas famílias brasileiras que assumem financiamentos de moradia ou de automóvel o fazem em sã consciência e com boas intenções.

Porém, sem fazer a devida comparação entre as opções de que dispõem e sem contar com um orçamento doméstico consciente, sucumbem em poucos meses a empréstimos caros e não planejados, normalmente através do cheque especial ou do crédito rotativo do cartão de crédito.

Há o caso mais grave da total falta de consciência, quando as pessoas recorrem ao crédito simplesmente para atender a desejos de consumo, como um pacote de férias ou a compra de uma tecnologia da moda. Fazem isso simplesmente porque a maioria das pessoas que conhecem também o fazem, crentes de que pagar juros é a realidade da vida moderna.

Falta, no Brasil, um choque de consciência sobre o papel do crédito. A decisão de contrair uma dívida é inteligente somente quando ela serve para construir mais riqueza. Isso acontece quando um empresário compra máquinas para expandir sua produção, para gerar empregos e para pagar tributos.

Ele paga juros, mas colhe resultados muito maiores do que obteria sem o endividamento. Isso também acontece quando uma família decide financiar a compra de um computador, a faculdade do filho, o curso técnico que permite subir na vida ou a compra do automóvel que conduz o trabalhador a uma oportunidade melhor de emprego.

Porém, quando esse trabalhador compra um automóvel mais confortável do que o orçamento familiar dos próximos meses irá comportar, ele rompe os limites do crédito inteligente e passa a arcar com o ônus do crédito ruim. Paga caros e desnecessários juros para ter um conforto que poderia ser adquirido com disciplina e paciência. Se o automóvel é imprescindível, essa necessidade poderia ser atendida com uma gama muito ampla de preços de veículos usados, e não apenas através de anúncios de carros novos.

Pagar juros desnecessariamente diminui a qualidade de vida. Não é sensato financiar desejos de consumo planejáveis, como as férias, o design do carro, o último modelo de smartphone ou a TV de maior tecnologia. Essas deveriam ser escolhas de consumo de quem já garantiu o conforto da família com um bom planejamento da aposentadoria e bons planos de seguro.

Há uma segunda categoria de crédito inteligente -aquele que é contraído não para gerar riqueza, mas para preservar planos de longo prazo. É o que acontece quando, para evitar resgates no plano de pensão ou de previdência ou para não desfazer os planos para a faculdade dos filhos, uma família mantém o dinheiro poupado e recorre a empréstimos. Paga conscientemente juros com a justificativa de ser o preço da preservação do futuro da família.

Se todos os brasileiros usassem crédito com inteligência e consciência, comparando alternativas para pagar menos, planejando suas finanças para honrar compromissos e pagando juros para enriquecer ou para preservar os cuidados com seu futuro, o crescimento econômico do país seria inevitável. Mas, como a maioria usa o crédito para tornar mais caro aquilo que é planejável (sendo, aliás, fortemente estimulado pelo governo a fazer isso), estamos andando para trás e empobrecendo.

Reverteremos esse quadro somente quando soubermos planejar, fazer escolhas sustentáveis e comparar conscientemente as escolhas de crédito que temos a nossa disposição. É uma pena que ainda estejamos bem longe dessa realidade.

GUSTAVO CERBASI é autor de "Casais Inteligentes Enriquecem Juntos" (ed. Gente) e "Os Segredos dos Casais Inteligentes" (Sextante).
www.maisdinheiro.com.br

@gcerbasi

AMANHÃ EM MERCADO:
Benjamin Steinbruch

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.