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Cifras & letras CRÍTICA economia Desigualdade derruba chance de ascensão social nos EUA Com estudos e números, livro mostra que país não é mais terra das oportunidades
DE SÃO PAULO Os Estados Unidos deixaram de ser a terra das oportunidades. A desigualdade entre ricos e pobres aumentou e as chances de ascensão encolheram. Nascer em uma família rica é fundamental para se ter um lugar entre os abastados. Nem sempre foi assim. Em meados do século passado, a mobilidade social era maior, a classe média avançou, os salários cresceram e os lucros minguaram. Os ganhos dos mais ricos tiveram um freio. Para destrinchar esse movimento, Timothy Noah escreve "The Great Divergence", reunindo estudos acadêmicos, muita estatística e opiniões de economistas. Jornalista, o autor é colunista da revista americana "The New Republic" e atuou na publicação eletrônica "Slate". Noah começa sua narrativa no início do século 20, quando a fatia de renda do 1% mais rico da população girava em torno de 15% (em 2007 tinha subido para 24%). Depois do aperto do crash de 1929, os rendimentos começaram a crescer de forma mais igual a partir de 1934. Foram os anos Roosevelt, com estímulo à indústria e implantação de salário mínimo. Com a Segunda Guerra Mundial, a mudança na direção de uma desigualdade menor foi intensificada. O movimento sindical se tornou atuante e trabalhadores conquistaram fatia maior na renda nacional. Esse período de prosperidade é chamado de "era da grande compressão". A parcela da renda nacional do 1% mais rico caiu de 11% em 1965 para 9% em 1975. A partir de 1979, o movimento se inverteu e a concentração foi se ampliando -começou "a grande divergência". De 1980 a 2005, 80% do crescimento da renda americana foi para o 1% mais rico, contabiliza Noah. Em nenhum outro lugar do mundo essa fatia dos mais endinheirados cresceu tanto. Hoje os EUA são mais desiguais que países como Venezuela, Uruguai e Nicarágua. Na busca das causas desse processo, o jornalista mostra como os custos (de habitação, escola, saúde) foram crescendo para a classe média, fazendo-a encolher. Metade das famílias chefiadas por uma só pessoa (geralmente mulheres) estão ou estão próximas da pobreza -uma parcela maior do que, por exemplo, na Alemanha (34%). A desindustrialização, com transferência de manufaturas para a Ásia, explica uma boa parte do movimento. "Os empregos foram para o exterior; o dinheiro, não", lembra o autor. Ele anota que, em 2010, o custo de mão de obra significava apenas 5,3% do preço de venda de um iPhone e 7% de um iPad. Já o lucro da Apple representava 59% do preço de um iPhone e 30% do de um iPad. O autor relata a ascensão do poder financeiro. "Wall Street comeu a economia", afirma. Cita a General Eletric como um exemplo: em 1980 a parte industrial da empresa representava 92% de seus lucros; em 2008 a parte financeira somava 56% dos lucros. SOLUÇÃO As saídas para atacar a desigualdade? Noah sugere alguns pontos: estabelecer um regime progressivo de impostos, aumentar gastos estatais com salários, universalizar a pré-escola, importar mão de obra qualificada, controlar preços de escolas e universidades (os valores deflacionados mais do que dobraram entre 1981 e 2006), regular Wall Street, reavivar o movimento sindical e eleger presidentes democratas (que costumam tomar medidas contra a concentração de renda, diz o autor). Recheado de números, ele poderia ter aprofundado mais a discussão política sobre as mudanças econômicas e ter apontado mais relações entre a desigualdade galopante a crise atual. Mesmo com algumas limitações, Noah traça um estarrecedor quadro dos EUA. Nas eleições de novembro, um novo capítulo dessa história.
THE GREAT DIVERGENCE (A GRANDE DIVERGÊNCIA) |
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