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Consumidor sem informação


Prometeu, tem de cumprir; o consumidor que flagrar uma empresa mentindo tem de denunciá-la

Está lá, no Código de Defesa do Consumidor, capítulo 3, artigo 6º: "São direitos básicos do consumidor, a proteção da vida, da saúde e da segurança; a educação e divulgação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços".

Mas informação é o item mais em falta na indústria, no comércio e, acima de tudo, em serviços.

Por que, não sei, talvez devido a uma visão equivocada, de que o consumidor seja somente alguém que compre produtos e serviços, um gerador, então, de faturamento e de lucro -não um ser pensante, um cidadão que deva ser tratado com respeito e com consideração.

Fidelização, consequentemente, é exercida quase compulsoriamente, por meio de cláusulas leoninas e abusivas. Não como reação a uma ação de qualidade. Somos fidelizados na marra. Um exemplo é a pressão para a aquisição dos combos, compostos por telefone fixo, TV a cabo e acesso à banda larga.

Alguma dúvida sobre o que seja desrespeito por falta de informação? Pense, então, em aeroportos e em aeronaves. Sim, o tipo de serviço que poderá fazer a diferença -para melhor ou para pior- durante a Copa do Mundo de 2014. Ou nos Jogos Olímpicos de 2016, no Rio.

Temos de chegar uma hora antes para voos nacionais e com duas horas de antecedência para voos internacionais. O horário, contudo, vale somente para o passageiro. É comum seguirmos as indicações no cartão de embarque, e começarem os avisos de que a aeronave já está no solo. No horário em que deveríamos decolar, entretanto. Como se fosse pontualidade elogiável.

Nem uma palavra sobre as razões para o atraso. Passam-se alguns minutos, e a partida é postergada. Sem justificativas, obviamente. Às vezes, há desculpas esfarrapadas, atribuindo o atraso ao tráfego aéreo. Também não é incomum esperarmos muitos minutos dentro da aeronave, após o pouso, sem nenhuma explicação ou desculpa.

Também não lembro de operadoras de acesso à internet entrando em contato com seus usuários para detalhar as causas de lentidão ou de interrupção do serviço. Afinal, os provedores sabem que trocar de fornecedor não adiantará grande coisa. Todos são muito semelhantes, nivelando-se por baixo.

Estou reclamando demais? Mas há muitos outros exemplos, nesses tempos em que somos Primeiro Mundo em preços, mas de quinta categoria em qualidade de produtos e de serviços.

Dentre os e-mails que recebo diariamente, sobram casos de desrespeito ao consumidor.

Um dos missivistas, por exemplo, comprou uma geladeira no Wal-Mart, com previsão de entrega em 11 dias na região Sudeste (ele mora em Belo Horizonte e calculou o tempo necessário para recebê-la antes do casamento). Decorridos 30 dias, a geladeira ainda não chegara.

Mudemos a cena para uma butique de bairro, na zona oeste da capital paulista.

Escolhida a mercadoria -uma camiseta feminina-, a cliente vai preencher o cheque e se depara com a exigência de entrada em dinheiro porque não tem cadastro. O problema é que essa informação não estava afixada em nenhum lugar. Por isso, desistiu da compra.

No final do mês passado, uma médica ficou sabendo de algo de que já desconfiávamos: manobristas de estacionamentos "emprestam" nossos carros para conhecidos (deles).

O automóvel dela foi utilizado por dois amigos do manobrista, que se envolveram em acidente em Caieiras, na Grande São Paulo, provocando duas mortes.

Quem disse à cliente que seu carro poderia ser dirigido por terceiros, sem sua autorização?

O que há em comum entre as situações relatadas é a infração ao direito à informação. As regras desse jogo têm de ser claras, no mínimo.

Se não for possível cumprir um prazo, o correto é dizer isso ao comprador. Passageiros deveriam saber que o horário que consta de seus bilhetes aéreos é uma mera formalidade.

Prometeu, tem de cumprir. Sempre que o consumidor flagrar mentiras das empresas, deve denunciá-las. Não pode aceitar quieto tais abusos.

MARIA INÊS DOLCI, 56, advogada formada pela USP com especialização em business, é especialista em direito do consumidor e coordenadora institucional da ProTeste Associação de Consumidores. Escreve às segundas-feiras, a cada 14 dias, nesta coluna.

mariainesdolci.folha.blog.uol.com.br

AMANHÃ EM MERCADO:

Nizan Guanaes

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