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Apertem os cintos, o controlador sumiu

De Renner a Embraer, dezenas de empresas sem acionista majoritário surgiram no país desde 2005, trazendo a pergunta: o dono faz falta?

RICARDO MIOTO DE SÃO PAULO

Eis uma pergunta que ronda agora a Bolsa de Valores: é mesmo o olho do dono, poderoso e onipresente, que engorda o gado? Ele pode ser substituído por vários, digamos, doninhos menos influentes?

Isso porque estão se tornando comuns no país companhias sem controlador majoritário -ou seja, alguém com mais de 50% das ações com direito a voto, que manda e desmanda no negócio.

Em seu lugar, surgem minoritários, que precisam se entender para tomar decisões importantes, como os nomes dos principais executivos ou o foco dos investimentos.

A primeira empresa brasileira a ter, no jargão do mercado, capital pulverizado foi a Renner, em 2005. Querendo passar adiante a sua participação e com a Bovespa em alta, o grupo americano controlador viu que seria uma boa ideia pulverizar a venda na Bolsa. Acabou que ninguém tem, individualmente, mais de 15% da Renner.

A moda pegou e, hoje, mais de 50 empresas na Bovespa não têm um majoritário com mais de 50% das ações com direito a voto (a Bolsa tem 450 empresas). Entre elas, Embraer, Eternit, BR Malls, Hering e Gafisa, com diferentes níveis de pulverização -em alguns casos, há um sócio que, embora sem ser majoritário, é bem maior do que os outros e acaba sendo mais influente, como na Cyrela.

O LADO BOM

Especialistas em investimentos enxergam vantagens e desvantagens no modelo.

Um lado positivo, como aponta Luiz Guilherme Piva, diretor da gestora de fundos Angra Partners, é que a existência de vários "donos" cria uma cultura maior de prestação de contas, de menos decisões misteriosas feitas a portas fechadas. "Todo mundo vigia todo mundo, isso deixa o investidor confiante."

O presidente da Renner, José Galló, vai na mesma linha: "Tenho 7.200 patrões".

Para o pequeno acionista, o capital pulverizado impede que o controlador use a empresa só para os seus interesses. Exemplos: o governo federal usando a Petrobras para segurar o preço da gasolina ou um controlador que é ao mesmo tempo fornecedor da empresa e determina que ela pague caro pelos insumos.

Assim, por meio dos seus representantes nos conselhos de administração, os minoritários em tese acabam tendo um papel mais relevante em empresas sem controlador.

Nesse sentido, companhias com esse modelo, tradicionais em países como os EUA, seriam um sinal do amadurecimento do mercado de capitais no país, até recentemente muito hostil a investidores minoritários.

"A multiplicação de acionistas com poder de voz e voto traduz uma maior democratização do capital", diz Piva.

"Empresa sem controlador não era parte da cultura brasileira, a Bovespa nem aceitava", diz Élio Martins, presidente da Eternit.

E O LADO RUIM

Mas, em certos momentos, o majoritário pode fazer falta.

Um problema é que, sem um poderoso controlador no cangote, os altos executivos podem se sentir estimulados a promover o crescimento no curto prazo, exaurindo a empresa em busca de bons bônus no final do ano, em detrimento do futuro, quando talvez já estejam longe.

Esse conflito de interesses, claro, existe em empresas com controlador também. Um exemplo extremo aconteceu nos EUA em 2008, com executivos do setor financeiro de empresas com todo tipo de arranjo societário oferecendo empréstimos a gente que não poderia pagar. Quando a coisa explodiu, eles já tinham embolsado os seus bônus. O rombo ficou para os acionistas -e para o governo.

O problema é que, com acionistas vários e dispersos, os executivos podem sentir mais tentação. Um estudo de 2012 do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa mostrou que, de fato, em média diretores de empresas "pulverizadas" ganham, incluindo remuneração variável, o dobro dos colegas de empresas familiares. Estariam sendo generosos demais com eles mesmos?

Outro problema é que, como de resto na democracia, a falta de um "majoritário" pode ser muito boa por arejar as decisões. Mas pode também criar lentidão quando a urgência se impõe, como aponta o consultor Domingos Ricca.

"É uma vantagem da centralização, de ter um Samuel Klein [patriarca das Casas Bahia] com carisma, intuição e perseverança. Não é fácil substituir isso."


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