São Paulo, quarta-feira, 01 de dezembro de 2010

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Ministério Público investiga atuação do Ongoing no país

Procurador apura suposto artifício para burlar restrição a estrangeiros em veículos de comunicação

Associação de jornais acusa grupo português de controlar diário no Brasil mesmo tendo 29,9% do capital

ELVIRA LOBATO
DO RIO
JULIO WIZIACK
DE SÃO PAULO

O MPF (Ministério Público Federal) de São Paulo abriu investigação sobre a atuação do grupo de mídia português Ongoing no Brasil.
A suspeita é que o grupo tenha usado de artifício para burlar a Constituição, que proíbe o controle por estrangeiros de jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão no país.
O Ongoing entrou nesse mercado no final de 2009, com o lançamento do diário "Brasil Econômico". Em abril deste ano, comprou, por R$ 75 milhões, a empresa que publica os jornais "O Dia", "Meia Hora" e "Marca".
O Ongoing tem dado seguidas indicações, em Portugal, de que comanda as publicações no Brasil e de que pretende ampliar sua presença em mídia no país.
Executivos do grupo já anunciaram em Portugal a intenção de compra no Brasil de uma participação em uma emissora de televisão, o lançamento de um canal pago com conteúdo econômico e de um jornal em Brasília.
A Folha apurou que o grupo já fechou contrato com o "Jornal Alô Brasília" e pagará R$ 15 milhões por uma participação de 49%. O proprietário do jornal, Helio Queiroz não negou. "Tenho compromisso de confidencialidade. Não posso falar", disse.
O procurador Márcio Schusterschitz Araújo iniciou a investigação a partir de representação da ANJ (Associação Nacional de Jornais), que aponta indícios de que o Ongoing estaria violando o limite de 30% de participação estrangeira em meios de comunicação permitido pela Constituição.
A empresa Ejesa (Empresa Jornalística Econômico S.A.), que edita os jornais do grupo no Brasil, tem 70,1% de seu capital em nome da brasileira Maria Alexandra de Almeida Vasconcellos. Ela é mulher de Nuno Vasconcellos, presidente do Ongoing, que tem 29,9% da Ejesa.
O procurador quer saber a origem dos recursos investidos nos jornais. A Ejesa informou ao MPF que Maria Alexandra é casada com separação de bens, situação que indicaria ser dela o capital integralizado na empresa.
Filha de pais portugueses, ela deixou o Brasil para viver em Lisboa, aos 14 anos, quando os pais se divorciaram. O pai, José Carlos Sottomayor Negrão Mascarenhas, continuou no Rio de Janeiro, onde dirige uma empresa de locação e montagem de equipamentos para eventos.
Para a ANJ, há indícios de que o Ongoing controle a linha editorial dos jornais no país. O registro do capital em nome da brasileira seria artifício para ocultar o mando dos estrangeiros.

RESPALDO POLÍTICO
Durante duas semanas, a Folha rastreou a movimentação do Ongoing. As informações fornecidas por empresários, executivos e políticos no Brasil e em Portugal sugerem que o grupo foi estimulado por membros do PT a implantar no país uma rede de comunicação alinhada com o governo que diminuísse o poder dos grandes grupos privados.
O principal interlocutor do grupo com o governo é o ex-ministro e ex-deputado federal (cassado no escândalo do mensalão) José Dirceu, colunista do "Brasil Econômico". A namorada dele, Evanise Santos, é diretora de marketing institucional da Ejesa.
Ainda segundo a Folha apurou, o Ongoing usa serviços do escritório de consultoria de Brasília -JC&S Brasil Consultores- para ajudá-lo a buscar recursos para financiar seus projetos. Entre os alvos estão fundos de pensão estatais. O responsável pelo escritório, Júlio Silva, seria da confiança de José Dirceu.

APETITE EMPRESARIAL
No plano de mídia do grupo, a aquisição ou participação em uma emissora de TV é fundamental. Segundo a Folha apurou, o Ongoing tenta comprar os 29%, de Marcelo Carvalho na RedeTV!. O valor inicial seria US$ 300 milhões. Não houve avanço e o grupo prepara uma oferta de valor mais baixo.
O acionista da RedeTV! diz que "não tem negociação com Ongoing nem com undergoing (sic)" e que por essa cifra ele "nem pisca".
Enquanto negocia com a RedeTV!, o Ongoing também tenta convencer a Bandeirantes a fazer coproduções ou terceirizar parte de sua produção para o grupo.
O apetite por novos negócios levou o Ongoing a contratar Carmelo Furci -ex-executivo da Telecom Italia- e a Angra Partners. Ambos ficaram pouco tempo. Furci deixou a presidência do Ongoing em outubro e se recusou a falar da experiência.
Em julho, o grupo registrou o Ongoing Infraestrutura, que atuará na construção de estradas, ferrovias, aeroportos e que estuda uma participação no trem-bala.
Em outubro, foi criada a OnCasas, que fornecerá casas pré-fabricadas ao Minha Casa, Minha Vida. Antes de abrir a empresa, executivos do Ongoing estiveram com o ministro das Cidades, Márcio Fortes, para vender a ideia.


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