São Paulo, sábado, 02 de julho de 2011

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ROBERTO RODRIGUES

FAO e G20


Graziano tem condições de promover as reformas para que a FAO atue conforme seus objetivos


DOMINGO PASSADO aconteceu em Roma a eleição para a diretoria-geral da FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação). Pela primeira vez na história de 66 anos da gigantesca instituição, um brasileiro, José Graziano da Silva, foi eleito.
Engenheiro-agrônomo, professor de economia rural, ex-ministro do governo Lula, Graziano tem as condições de promover as reformas necessárias para que a paquidérmica FAO possa atuar de acordo com seus objetivos, uma vez que, há anos, perdeu a capacidade de liderar a formatação das políticas globais para eliminar a fome mundial.
Não foi uma eleição fácil. Dos 180 países votantes, 92 optaram por Graziano e 88 pelo candidato espanhol, Miguel Moratinos.
Ficou a sensação de uma disputa Norte/Sul indesejável neste momento em que o mundo se debruça sobre o tema da alta dos preços dos alimentos, gerada em parte pela explosão da demanda dos países emergentes, em parte pela inexistência de fomento nos países produtores, em parte pelo protecionismo dos ricos, inibidor do crescimento do mercado para os países tropicais.
A perda de protagonismo da FAO na questão agrícola mundial também se faz sentir em outras instituições multilaterais e na própria ação da ONU, órgão responsável pela promoção da paz e da democracia em todos os continentes: os países em geral, premidos por questões econômicas e sociais internas, tomam decisões que contrariam a orientação da ONU, sem nenhuma consequência, o que vem esvaziando a organização.
A criação do G20 foi um esforço dos 20 países mais importantes do mundo para suprir esse vazio. O problema é que nem assim o consenso em torno de políticas globais é alcançado. Na semana passada, pela primeira vez no G20, reuniram-se em Paris os ministros de Agricultura do grupo por causa dos preços dos alimentos.
Até hoje, em suas reuniões anuais, somente iam os chefes de governo, os presidentes de bancos centrais e ministros das Finanças dos países-membros, responsáveis por cerca de 80% da produção agrícola mundial.
Os resultados da reunião de Paris foram modestos. O tópico mais importante das decisões finais foi a criação de um sistema de monitoramento dos estoques, da produção e do comércio dos produtos agropecuários. Um pequeno avanço.
Contudo, a iniciativa francesa serviu para evidenciar o peso decisivo da agricultura brasileira na economia mundial, o que também explica a eleição de Graziano. Habitualmente, fala-se da complementaridade econômica dos três países que poderiam, num futuro próximo, influir muito no comércio internacional: a China, com suas fábricas; a Índia, com seu setor de serviços; e o Brasil, com seu setor agropecuário e mineral.
Mas o que chama a atenção hoje em âmbito internacional é a pujança da agricultura brasileira. Com o título "Brasil, a nova fazenda do mundo", o jornal francês "Le Monde" descreveu, em texto longo e ilustrado com mapas e gráficos, a potência do país destinado a tornar-se grande produtor agrícola mundial, graças, principalmente à nossa moderna tecnologia sustentável.
Transferir essa tecnologia para os países tropicais (africanos, asiáticos, latino-americanos), lutar pela eliminação dos subsídios dos ricos, criar programas globais no estilo Bolsa Família, aumentar a produção agrícola e a renda dos consumidores, garantir energia renovável e limpa -eis o novo papel da FAO.
Graziano sabe como fazer tudo isso, até porque já liderou a FAO para a América Latina, a partir do escritório regional do Chile. Os países ricos, no entanto, já falaram em "congelar" sua contribuição anual para a FAO: o que acontecerá, com orçamento congelado?
Só o futuro dirá. Por enquanto, devemos comemorar essa dura vitória, que se deve ao apoio do governo brasileiro e ao trabalho vigoroso da excelente equipe do Itamaraty, liderada pelo próprio ministro Antonio Patriota. Ele e os ministros Wagner Rossi e Afonso Florence não descansaram até a histórica conquista ser alcançada.

ROBERTO RODRIGUES, 68, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Depto. de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura (governo Lula). Escreve aos sábados, a cada 14 dias, nesta coluna.

rr.ceres@uol.com.br

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