São Paulo, terça-feira, 04 de janeiro de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Classe C ainda enfrenta resistência de empresas

7 em 10 executivos admitem preconceito nos negócios para mercado popular

69% dos entrevistados dizem que marketing não sabe falar com emergente; setor movimenta R$ 900 bi

CLAUDIA ROLLI
DE SÃO PAULO

Sete em cada dez empresas que atuam no mercado popular admitem existir algum tipo de preconceito ou resistência interna em suas organizações para atender o consumidor de baixa renda.
Somente 20% dos profissionais consideram estar de fato preparados para fazer negócios em um mercado que movimenta cerca de R$ 900 bilhões, se considerada somente a massa de renda dos brasileiros das classes C (com renda familiar de 3 a 10 salários mínimos) e D (1 a 3).
Os resultados são apontados em pesquisa realizada, a pedido da Folha, pelo Instituto Data Popular, especializado em baixa renda.
No levantamento foram ouvidos 117 executivos, em cargos de comando, de cem empresas com faturamento anual a partir de R$ 100 milhões e que já oferecem produtos e serviços para a nova classe média.
A falta de conhecimento e a comunicação inadequada são apontadas como as principais dificuldades para atingir o mercado em ascensão.
"O mundo corporativo não fala a mesma língua do consumidor popular. Não adianta apenas baixar o preço, diminuir a embalagem ou piorar a qualidade dos produtos", diz Renato Meirelles, sócio e diretor do instituto.
Falar a língua desse consumidor ainda não é fácil. Para 69% dos entrevistados, os fornecedores de serviços de marketing entendem pouco ou nada sobre a baixa renda, o que dificulta a aproximação com esse público.
"Ou você fala diretamente para esse público ou, ao assistir a uma propaganda, ele vai pensar: esse produto é bom para o meu patrão", diz Eduardo Aron, diretor de marketing da Kimberly Clark, empresa de produtos de higiene, ao relembrar erros e acertos para mostrar aos consumidores, principalmente da classe D, a fralda mágica da Turma da Mônica, lançada no início deste ano.
O produto tem um cinto reutilizável, que reduziu o uso de matéria-prima em 25% e o preço para R$ 0,37 por unidade, quase um quarto a menos dos modelos mais baratos da própria empresa.
"Foi preciso remover bloqueios culturais e conceitos e até aprender a medir as vendas de uma outra forma, já que o atacadista vende no picadinho para pequenos comércios de regiões centrais e do interior", diz o executivo.

DESAFIOS
O desafio para as multinacionais é entender, diz Aron, que as margens de lucro serão menores se comparadas às dos produtos vendidos a outros públicos. "A empresa erra porque "se breca" no lucro, mas esquece que vai ganhar na quantidade. Tem de haver uma mudança de cultura na cabeça dos gestores", afirma o diretor.
A falta de humildade em querer aprender a lidar com a baixa renda também distancia parte das indústrias, como a automotiva, do consumidor.
"Antes, no Brasil, só se vendia carro zero para a classe média mais consolidada. A indústria ainda resiste porque acha que esse consumidor pode contaminar sua imagem", diz Aloísio Pinto, vice-presidente de Planejamento da agência WMcCann.
"Como vou trazer ao mesmo espaço o comprador de um carro como o Uno Mille e os que estão na concessionária atrás de um modelo mais sofisticado?", pergunta.
A agência fez uma campanha para o Classic Chevrolet, da GM, em que mostra que o carro não é só meio de locomoção, mas uma conquista familiar.
"Assim como casamento e ter filho na faculdade, o carro é um marco que mostra que ele mudou de patamar", diz.
A campanha incluiu também o treinamento de funcionários na rede de concessionárias para não "espantar" o novo consumidor, desde o momento em que é abordado até o test-drive e a compra no setor de crédito.
"Os chineses fabricam carros baratos e a classe C quer comprar. Existe uma preocupação com isso. Mas, até as montadoras reagirem, há uma enorme distância", diz.


Texto Anterior: Mercado Aberto
Próximo Texto: Agência pesquisa "radar" de emergentes
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.