São Paulo, sexta-feira, 04 de junho de 2010

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Brecha legal favorece componente chinês

Para combater dumping, Brasil aplica sobretaxa ao produto importado completo, mas não às peças separadas

No caso das bicicletas, chineses enviam peças como pedais e rodas, pagando alíquota de importação padrão

Eugene Hoshiko - 9.mai.08/Associated Press
Trabalhador em fábrica de bicicletas de Xangai (China); Europa, EUA e Argentina, por exemplo, estendem sobretaxa aos componentes importados para evitar "jeitinho chinês"

EDUARDO RODRIGUES
DE BRASÍLIA

Para fugir das sobretaxas de antidumping aplicadas pelo governo brasileiro, as empresas chinesas estão "esquartejando" produtos exportados ao país, para depois montá-los em solo nacional.
A estratégia aproveita brecha na legislação que abre espaço para que peças e componentes não se sujeitem à mesma punição imposta às mercadorias completas em casos de prática desleal de comércio -quando o preço do bem importado é menor que no país de origem.
Um exemplo emblemático é o caso das bicicletas chinesas. Após serem sobretaxadas, passaram a desembarcar no Brasil em carregamentos de peças separadas, como quadros, pedais e rodas, pagando apenas alíquota de importação padrão.
A artimanha oriental se baseia na falta de regulamentação da lei antielisão -nome burocrático para o artifício-, que está emperrada nos corredores da Receita.
O projeto, do Ministério do Desenvolvimento, estende automaticamente a alíquota de punição a todos os componentes de artigos sobretaxados por dumping.

"JEITINHO CHINÊS"
Segundo o secretário de Comércio Exterior do ministério, Welber Barral, o Brasil está ficando para trás em termos de defesa comercial. Argentina, União Europeia, EUA e Canadá já implementaram o instrumento para impedir o "jeitinho" chinês.
"O termo usado em inglês é "circumvention", ou seja, alguém está dando a volta na norma", diz Barral. "O problema é que, quando identificamos um caso, precisamos abrir uma investigação para cada peça, em vez de usar o antidumping vigente."
A Receita argumenta que a regulamentação da lei ainda não tem prazo para ser concluída, uma vez que o texto ainda está sendo avaliado pelas áreas de fiscalização, aduana e pela Cosit (Coordenação Geral de Tributação).
Enquanto o processo não anda, empresários de vários setores prejudicados resolveram criar a chamada CDIB (Comissão de Defesa da Indústria Brasileira) para reforçar as denúncias e aumentar a pressão sobre as autoridades brasileiras.
"Parecem casos isolados, mas isso é só a ponta do iceberg. Trata-se de um esquema organizado que também traz danos a fabricantes nacionais de óculos, parafusos, escovas de cabelo e calçados, dentre outros", reclama um dos fundadores do grupo, Roberto Barth.
Outra estratégia utilizada pelos chineses para burlar o antidumping é a falsificação de certificados de origem, na chamada triangulação. Os ímãs de ferrite chineses usados na fabricação de alto-falantes, por exemplo, chegam ao Brasil como se fossem fabricados em Taiwan ou na Malásia.
"O próprio governo verificou que esses países não produzem similares desses produtos, mas não consegue conter a entrada. Cerca de 25% do mercado nacional de ímãs já é composto por produtos triangulados", afirma Barth.


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