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cifras & letras
CRÍTICA ESTADOS UNIDOS
Jornalistas identificam os demônios da crise financeira
Investigação mostra como investidores aproveitaram a bolha do crédito
PAULA LEITE
EDITORA-ASSISTENTE DE MERCADO
Ao começar a ler um livro
com o título "All the Devils
Are Here" ("Todos os Demônios Estão Aqui"), que se propõe a contar a história definitiva da crise financeira mundial, já se imagina que os autores não pretendem pegar
leve com ninguém.
A obra cumpre a promessa
do título, que é uma referência a um verso de Shakespeare ("O inferno está vazio, e todos os demônios estão aqui",
da peça "A Tempestade").
No entanto, o livro surpreende, pois os demônios
são muitos mais do que se
poderia imaginar.
Os repórteres Bethany
McLean e Joe Nocera não
apontam só a ganância de
executivos e empresas como
culpados pela devastação
que levou muita gente nos
EUA a perder suas casas,
quebrou bancos e colocou o
país em uma recessão da
qual ainda não se recuperou
totalmente.
Começando sua história
há 30 anos, os autores mostram que duas decisões das
autoridades dos EUA, em especial, ajudaram a causar
distorções.
Uma delas foi a defesa
apaixonada do livre mercado
por reguladores como Alan
Greenspan, presidente do
Fed de 1987 a 2006, que sempre relutou em regular transações entre os bancos, preferindo deixar a iniciativa
privada resolver seus problemas sozinha.
A outra foi a obsessão de
sucessivas administrações
federais dos EUA em fazer
com que cada vez mais americanos realizassem o sonho
da casa própria, o que acabou levando reguladores a
permitirem e o mercado a tolerar financiamentos imobiliários com cada vez menos
documentação e mais riscos.
PODRES
Mas quem espera ler sobre
os podres dos bancos americanos também não vai se desapontar.
Boa parte do livro é dedicada a contar, com riqueza
de detalhes, como empresas
como a AIG, o Goldman
Sachs e a Merrill Lynch se enterraram cada vez mais profundamente na areia movediça das hipotecas "subprime" e dos derivativos ligados
a elas.
Nesses trechos, em especial, se vê a qualidade do trabalho jornalístico de McLean
e Nocera.
A primeira foi jornalista da
"Fortune" e está atualmente
na "Vanity Fair", além de ser
coautora do excelente "The
Smartest Guys in the Room",
sobre a queda da Enron. O segundo é colunista de negócios do "New York Times".
Da metade do livro para a
frente, o detalhamento de
certas operações, como
aquelas com CDOs (obrigações de dívida colateralizadas, um instrumento financeiro que referencia carteiras
de crédito, mas não tem nada
a ver com elas no "mundo
real", servindo só para fazer
apostas), pode frustrar o leitor não especializado.
Mas ao final fica claro, como o leitor já imaginava desde o começo, que, por mais
que as causas da crise tenham sido múltiplas, houve
muita gente dentro dos bancões de Wall Street que sabia
bem antes de a crise estourar
que as coisas iam mal -que
nada fez e ganhou muito dinheiro nesse meio-tempo.
ALL THE DEVILS ARE HERE
AUTORES Bethany McLean e Joe
Nocera
EDITORA Portfolio Penguin
QUANTO US$ 32,95 (R$ 56,
400 págs.)
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