São Paulo, quinta-feira, 07 de abril de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

MÁRION STRECKER

Crise existencial


A internet cresceu tanto que virou obrigação para os veículos inventar para si uma nova vida


ESCREVO DA Califórnia. Vim aos EUA para o Isoj (International Symposium on Online Journalism), que aconteceu nos dias 1º e 2 de abril na Universidade do Texas em Austin, e também para olhar o Vale do Silício com olhos de quem vai morar aqui a partir de agosto, como correspondente do UOL.
Organizado com maestria há 12 anos pelo professor Rosental Alves, chair em jornalismo da Knight e também chair em comunicação da Unesco, o simpósio tratou dos principais temas que atualmente ocupam (ou deveriam ocupar) a mente dos envolvidos em empresas jornalísticas.
Rosental é carioca e foi diretor de Redação do "Jornal do Brasil". Explico para os mais jovens: o "Jornal do Brasil" foi um dos mais importantes jornais brasileiros, antes de mudar de gestão e declinar em circulação a ponto de extinguirem a versão impressa e transformarem-no meramente em um endereço na internet que, temo, seja traço em audiência na medição do Ibope. Ou seja, o "JB" acabou. Ou está agonizando em praça pública.
Rosental e eu estamos entre os chamados "dinossauros" da internet brasileira, já que vislumbramos primeiro o potencial do novo meio para fins jornalísticos e lançamos os primeiros websites de jornais no país em 1995. Antes do "The New York Times".
Quando, certa vez, em entrevista a um jornalista gringo, comentei que tínhamos criado tais sites antes de o paradigmático "NYT", ele me perguntou se esse detalhe me dava orgulho. Claro que sim! Afinal, a internet nasceu nos EUA... Mas o mundo é pequeno e as informações circulam para quem quiser se informar. Voltando ao simpósio, os veículos jornalísticos em todo o planeta que têm mais anos de vida do que a chamada World Wide Web (vulgo www) estão em profunda crise, senão financeira, digamos existencial.
A internet cresceu tanto que virou praticamente obrigação para os veículos tradicionais inventar para si uma nova vida, lá e em outros locais onde o público está ou estará. Não faz sentido distribuir notícias no deserto, certo?
Bom, isso não acontece somente com jornalismo, senão também com o comércio varejista e inúmeras outras atividades econômicas que existiam antes de a web aparecer.
Nesses tempos politicamente corretos (pero no tanto), falar em crise e falar em problema é proibido no mundo corporativo. Então, quando os executivos precisam discutir os problemas da empresa, eles falam em aproveitar oportunidades. Verdade! Questão semântica, mas não só.
Na minha opinião, se não olharmos com toda a coragem para os nossos problemas, e se não formos capazes nem sequer de usar mais a palavra "problema", não estaremos prontos para inventar soluções.
Em 1996, a Folha de S.Paulo começou a usar seu "paywall", ou seja, porta de entrada paga para quem quer ter acesso on-line a todo o conteúdo do jornal impresso.
O assunto veio à tona porque o "The New York Times" começou uma nova e importante experiência de "paywall" há pouco, e nós, jornalistas, estamos curiosíssimos sobre qual será o resultado dessa experiência.
Se for bem-sucedida e permitir ao "NYT" no médio prazo manter o alto custo da produção de um jornalismo realmente bem-feito, com reportagens originais e muitos "furos" (daqueles capazes de levar os governos e a sociedade para um estágio melhor do que o anterior), reportagens bem escritas, fotografadas, filmadas, infografadas, editadas, apresentadas e por fim distribuídas da maneira que o público gostar, maravilha. Se for malsucedida, bem... sua solução não será copiada mundo afora.
Um ponto interessantíssimo da política de cobrança do "The New York Times" são os buracos na parede de cobrança. Propositais. Eles foram planejados para evitar que a audiência (e com isso a receita publicitária) despenque da noite para o dia. Os buracos estão em sistemas de busca tipo Google e nas redes sociais como Facebook. Ou seja, estão onde o povo está.

MÁRION STRECKER é jornalista e cofundadora do UOL. Escreve mensalmente, às quintas, neste espaço.

marionstrecker@me.com

twitter.com/marionstrecker


AMANHÃ EM MERCADO:
Luiz Carlos Mendonça de Barros



Texto Anterior: Diretoria do banco deve ser reestruturada
Próximo Texto: Indústria do lazer: Dish compra Blockbuster por US$ 320 mi
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.