São Paulo, terça-feira, 08 de março de 2011

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ENTREVISTA GUILLERMO D'ANDREA

Negócios nos emergentes vão substituir obrigações do Estado

ECONOMISTA ARGENTINO DIZ QUE HÁ EXEMPLOS BEM-SUCEDIDOS NO MÉXICO E NA ÍNDIA

Divulgação
O economista argentino Guillermo D'Andrea

LUCAS FERRAZ
DE BUENOS AIRES

Professor do IAE Business School, em Buenos Aires, e especialista em consumo das classes C e D, o economista argentino Guillermo D'Andrea diz que o futuro do mercado emergente é ocupar algumas funções do Estado, como a promoção da saúde e o acesso à construção.
Ele cita exemplos bem-sucedidos no México e na Índia de empresas que viram oportunidades onde há omissão de governos.
"Claro que o Estado nunca vai perder sua função primordial que é regular. Mas o negócio não é só vender produto, mas observar o impacto que terá na sociedade. Isso vai além do papel tradicional do empresário", afirma D'Andrea , que também é diretor de pesquisa da Coca-Cola para a América Latina.
Segundo ele, apesar de cada vez mais companhias se aproximarem das classes C e D, "ainda há a imagem preconceituosa de que só há pobreza".
Guillermo D'Andrea alerta para o fervilhante mercado C e D da América Latina, considerado por ele o mais "imediato", com cerca de 300 milhões de consumidores.
"Há muita renda em volume, mas em quantidades distintas. É preciso entender essa dinâmica", comenta ele.
A seguir, trechos de sua entrevista à Folha.

 

Folha - Só o acesso ao crédito explica o boom do mercado emergente?
Guillermo D'Andrea -
É um dos aspectos, mas depende do produto e do orçamento de cada fatia do mercado emergente. [A explicação] é crédito quando são eletrodomésticos, acesso à moradia e compra de material de construção, por exemplo.
Outra coisa é que os empresários buscam se aproximar desse mercado, apesar de haver ainda a imagem preconceituosa de que só há pobreza. Há muita renda em volume, mas em quantidades distintas.
Só na América Latina são cerca de 300 milhões de consumidores emergentes.

Qual a principal característica desse consumidor?
Há grupos e segmentos, como acontece entre os consumidores da classe alta.
A inspiração principal da mais baixa é a inclusão, enquanto no segmento mais alto pode ser status.
Eles [classes C e D] que- rem estar na sociedade, o que também é uma forma de status.
Outro aspecto é a racionalidade. A classe alta compra bem, por um preço justo. A baixa não quer se equivocar na compra. Não há espaço para erro. Não posso comprar algo que não me serve.
A marca tem relevância distinta do símbolo de status. Há um aspecto de inclusão também ao ser digno de crédito. São significados distintos.

Mas o mercado emergente não tem uma característica comum?
A única característica do consumidor emergente é o poder de compra limitado. Compram em menor quantidade, não há dinheiro para fazer uma compra grande.
As compras são diárias, às vezes [são feitas] duas ou três vezes ao dia.
Mas veja só: na classe al- ta, 15% do orçamento vai para consumo, enquanto no mercado emergente chega até a 70%.

Toda pesquisa voltada para o mercado emergente reve- la um preconceito das em- presas com esse público. Por quê?
Por desconhecimento. Nos cargos de decisão ou influência das companhias não existem pessoas que vieram de baixo da sociedade. Não há ninguém para ajudar a entender esse mercado.
Eles se baseiam unicamente em suas próprias experiências, voltadas para a classe média alta. As companhias não abrem seus mercados, mas eles existem.

Os empresários ainda não aprenderam a lidar com o consumir emergente?
Os empresários estão ampliando sua missão, não se limitando somente a ser jogadores econômicos.
O negócio não é só vender produto, mas o impacto que ele terá na sociedade. Isso vai além do papel tradicional do empresário.
Na Índia, por exemplo, há muitos empresários interessados no desenvolvimento da sociedade.
É uma visão muito mais empreendedora, não só lucrar ou criar mercado. Esse é um ponto essencial.
O serviço público está com deficit, as companhias estão procurando mitigar esse deficit oferecendo produtos acessíveis.

O futuro é ocupar algumas funções do Estado?
Há um futuro aí. Há bons exemplos no México, com um rede de farmácias de medicamentos genéricos que oferece serviços ambulatoriais, ou a Cemex [multinacional mexicana de material de construção], que tem boas linhas de financiamento para materiais de construção e projetos de casas.
Em vez de esperar o go- verno, é mais fácil ajudar a construir a casa. Mas claro que o Estado nunca vai perder sua função primordial, que é regular. Isso ninguém pode tirar dele.


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